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Hidrelétricas na Amazônia não produzirão energia limpa

Com o desmatamento começa o impacto ambiental de uma região muito vulnerável Keystone

O governo brasileiro acaba de dar luz verde à construção da terceira maior central hidrelétrica do mundo, no meio da Amazônia. Porém, o controvertido projeto Aproveitamento Hidroelétrica (AHE) Belo Monte não produzirá "energia barata e limpa" como se diz oficialmente.

Foi o que afirmou na Suíça a ambientalista brasileira Telma Monteiro.

“Ao contrario, causará impactos sociais e ambientais que jamais poderão ser mitigados ou compensados”, adverte Telma Monteiro, ambientalista  brasileira que participou da discussão A fome de crescimento do Brasil coloca em risco a sobrevivência da Amazônia e dos povos indígenas? As discussões ocorreram em Basileia, Zurique e Berna.  

Com Belo Monte pretende-se produzir 11.233 MW de energia elétrica com as águas do rio Xingu, afluente do Amazonas. Ás águas serão represadas em dois lagos artificiais com superfície de 668 Km2, equivalente ao lago suíço de Constança.  Será a maior hidrelétrica em território nacional, já que Itaipu é binacional.

Segundo o governo brasileiro, 20 mil pessoas serão reinstaladas em Altamira. “Se calculamos os danos, ignorados nos processos,  de expropriação e privatização, não será possível pagar a fatura de eletricidade”, afirma Telma Monteira, convidada a vir à Suíça pela Associação para os Povos Ameaçados (APA).

A ativista explica que 50% da bacia hidrográfica do Xingu fica no estado do Pará e 50% em Mato Grosso.  “Cerca de 80% das águas serão desviadas por um canal artificial estreito para uma represa, o que significará que o curso d’água será limitado em uma distância de 100 km em Volta Grande, onde se encontra o grande arco do rio Xingu”.

Ser humano e ecossistema afetados

Trata-se de um projeto insano, insiste Monteiro. “Porque o Xingu é um rio estacional e alguns meses tem pouca água.  Enquanto o trecho de 100 km estiver seco quatro meses, outra parte estará sempre inundada”.

Especialistas concordam que Belo Monte afetará a dinâmica do ecossistema da região, sem contar que a estacionalidade do rio impedirá a produção da energia calculada.

O projeto também provoca conflitos porque algumas comunidades estão a favor e outras contra. “Esses grupos são pressionados, manipulados e instrumentalizados pelas construtoras em uma situação complexa”, lamenta a ambientalista.

 

“Organizações brasileiras já apresentaram o problema da violação dos direitos humanos das populações indígenas à OEA, à Comissão Interamericana dos Direitos Humanos e à ONU”, explica Telma Monteiro.

Mais usinas na Amazônia

De acordo com Monteiro, os projetos hidreléctricos são parte do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC). “O Ministério das Minas e Energia acaba de apresentar o Plano Decenal de Energia: somente entre 2016 e 2020 serão construídas dez usinas na Amazônia, principalmente em terras indígenas e em rios importantes como Tapajós e Jamanxim, no Pará”.

A FUNAI, Fundação Nacional do Índio, declarou que Belo Monte era uma ameaça por está em uma região vulnerável, cercada por territórios indígenas: a principal represa está a menos de 70 km, assinala Monteiro.

Ela afirma que o licenciamento de Belo Monte foi repleto de irregularidades. Em 2000, quando se decidiu pela viabilidade de Belo Monte, o Ministério Público começou a atuar contra essas irregularidades.

Inicialmente, Belo Monte custaria 19 bilhões de reais; depois falou-se em 25 bilhões, 30 e agora 35 bilhões, dos quais 80% será financiado pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Social (BNDS).

Brasil tem problema com os índios

Na discussão em Berna, Christoph Wiedmer, diretor da seção suíça da Associação para os Povos Ameaçados ( APA) disse que a autorização de construir do governo brasileiro “é contrária à exigência expressa na Declaração de Direitos dos Povos Indígenas de consentimento livre, informado e prévio no processo decisório”.

A APA suíça, juntamente com associações similares da Alemanha, Áustria, Itália e a Associação para os Povos Ameados na ONU lançam um apelo ao governo brasileiro para a suspensão de Belo Monte.

Em carta à presidente Dilma Rousseff, as associações lembram que a Declaração de Direitos dos Povos Indígenas da ONU exige que, antes do início de qualquer projeto que possa ter impacto, deve ser obtido o consentimento dos povos direta ou indiretamente afetados.

“Até este momento, porém, tem feito audiências somente com alguns dos povos indígenas afetados”.

Segundo a APA, embora o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis tenha encontrado apenas cinco dos 40 requisitos de compatibilidade ambiental e social necessários, o governo brasileiro aprova a construção.

Além disso, “pressiona os críticos do projeto: a FUNAI negou ao representante indígena Azelene Kaingan uma permissão para assistir ao Fórum Permanente para Assuntos Indígenas, em Nova York. O consórcio Norte Energia, responsável pela construção, tentou retirar do Ministério Público Federal a queixa feita pelo procurador Felício Pontes”.

 Para a APA, Belo Monte “é uma oportunidade para o Brasil provar sua capacidade de desenvolvimento com respeito ao meio ambiente e aos direitos humanos”.

Projetos em outros países

Segundo Telma Monteiro, 80% da energia no Brasil provém das hidrelétricas. “Temos três reatores nucleares e o governo pretende construir mais quatro no nordeste. No entanto, está previsto apenas um aumento de 1,5% de energia eólica até 2015 e 3% até 2030”.

A construção de usinas elétricas na Amazônia não se limita ao território brasileiro. Empresas brasileiras têm outros projetos no Peru (Inambari) que já está em processo de licitação, e na Guiana.

Todos são financiados pelo BNDS e são parte do Planejamento Energético Brasileiro, “que não corresponde à demanda do mercado, apenas cria oferta. Parte da ideia de um grande crescimento, mas não melhora a tecnologia nem a economia de energia. Só na transmissão perde-se 20% da energia, quantidade que corresponderia à produção de uma usina da dimensão de Belo Monte”, afirma Monteiro.

A ativista falo una Suíça que está convencida das vantagens de outras formas de produzir energia. “Segundo o Instituto Nacional da Propriedade Intelectual, o vento da costa brasileira pode produzir 60% da energia que o Brasil necessita. Não nos opomos ao crescimento e ao desenvolvimento, desde que seja sustentável”, conclui. 

Fundada em 20 de maio de 1989 porGöpf Berweger e Bernhard Pulver como

Associação sem fins lucrativos, com sede em Berna, capital suíça.

Tem mais de 12 mil membros e 2 mil simpatizantes.

Intervém em favor de minorias perseguidas e povos indígenas, documenta violações dos direitos humanos e sensibiliza a opinião pública; defende os interesses dos afetados junto às autoridades.

Apoia esforços locais para fortalecer os direitos humanos das minorias e pessoas e organizações que têm objetivos similares.

Suas primeiras ações se focalizaram no Tibete, Penan (Malasia), Yanomami (Brasil), Papua (Indonésia) e os Yeniche (Suíça).

Como organização com status consultivo no Conselho  Econômico e Social (ECOSOC) da ONU em Genebra, está ao lado das vítimas do genocídio e de pessoas privadas de seus direitos: exige a responsabilidade  da Suíça na defesa dos direitos humanos.

Apoia a sobrevivência das culturas e tradição dos povos ameaçados de extinção.

É pedagoga de formação.

Coordena o Departamento Estados Unidos-Brasil da Associação Internacional dos Povos Ameaçados.

Estudou a geração e transmissão de energia hidrelétrica, a concessão de licenças ambientais, a legislação ambiental brasileira e os conflitos sociais em populações indígenas e tradicionais.

Entre 2008 e 2010 foi consultora da Associação de Defesa Etnoambiental Kanindé-Rondônia.

É membro de varios conselhos e grupos de trabalho e autora de “Os Cedros – Cidadania e Luta pelo Meio Ambiente”, coautora de “Amazonas e Cenários Indígenas”, “Lavouras da Destruição: a (im)posição do consenso”, entre outras.

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