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Marcha global pela liberdade e contra o terror – e agora?

Milhares de pessoas saíram às ruas em Paris no domingo (11.01) para protestar contra o terrorismo. AFP

Cerca de 1,5 milhões de pessoas, dentre as quais 50 chefes de Estado e governo, realizaram em Paris na tarde deste domingo (11) uma manifestação histórica pela liberdade e pela democracia após os atentados terroristas. A imprensa suíça também registrou e analisou esse momento.

“Marcha pela liberdade”, “Uma nação se levanta”, “O mundo se une”, “Paris, capital do mundo” ou “Eles eram todos Charlie” eram algumas das manchetes nos principais jornais helvéticos.

“O protesto em Paris foi um momento de grande impacto: a primeira manifestação contra a praga do século 21, o terror islâmico em nome, ou melhor dizendo, à custa de mais de 1,5 bilhões de muçulmanos”, escreveu o jornal Berner Zeitung.

“Histórico. Paris se transformou ontem na capital de um mundo em resistência contra o terrorismo”, afirma o Tribune de Genève. “Os rabinos, imames e padres confraternizaram à sombra da estátua da República. Nunca depois de um atentado, em nenhum país, houve algo parecido.”

O jornal francófono também saúda a presença em Paris de “um grande número de chefes de Estado e do governo, incluindo do Oriente Médio e da África, muitas fezes confrontados a ataques semelhantes. O primeiro ministro israelense e o presidente palestino estavam na mesma fileira, poucos metros separando um do outro. Todos os primeiros ministros europeus estavam presentes, dos quais a presidente da Confederação Helvética, Simonetta Sommaruga”

“É primeiramente um modelo cultural imaterial, dos quais as caricaturas na imprensa são, por excelência, um símbolo de rebeldia, que os franceses, os europeus e muito mais do que isso, queriam defender frente ao mundo”, escreve o La Liberté, de Friburgo. “A liberdade irredutível de espírito, comum na França e que já data de muitos séculos, é patrimônio da humanidade e continuará a sê-lo.”

“Paris, capital do mundo”

Para o Le Temps, é “o mais belo ato que a França poderia ter feito depois de uma semana negra. O reflexo republicano levou os cidadãos a se unir na rua, se tocar, se falar e manifestar o amor aos seus congêneres e sua nação. Foi um impulso magnifico e um aporte de esperança. Como disse o presidente francês, Paris se transformou nesse domingo de janeiro na capital do mundo. E mesmo a capital do mundo livre, poderíamos acrescentar.”

O jornal ressalta igualmente “essas histórias bastante fortes, que marcaram os últimos dias de desespero. Como a de um policial muçulmano abatido pelos islamistas no momento em que ele se aproximou da redação do Charlie Hebdo ou a do vendedor muçulmano que protegeu os judeus da loucura de outro jihadistas”.

Sim, mas…

Em editoria comum, o Berner Zeitung, o Neue Luzerner Zeitung e outros seis jornais em alemão colocam a questão de saber se “todos os participantes na França usavam o mesmo chapéu. Isso não somente pela presença do primeiro ministro húngaro, Viktor Orban, que justamente não é amigo da liberdade de expressão.”

“Na manifestação parisiense, uns exprimiam tristeza pelos chargistas, os judeus, os policiais assassinados; outros demonstravam apoio de princípio a um jornal satírico que a grande maioria nunca lê. O governo francês conclamava, por sua vez, à união nacional, enquanto a comunidade internacional queria demonstrar rigor”, escrevem os jornais suíços em alemão.

Para a França, essa manifestação “serve principalmente a reafirmar os valores de uma sociedade marcada por fortes tensões e por profundas divisões, que tenta agora encontrar uma nova unidade sob a pressão de uma ameaça manifesta”, comenta por sua vez o Neue Zürcher Zeitung, de Zurique. Mas o mundo político não se mostrou unido, uma vez que François Hollande excluiu Marine Le Pen e seu partido de direita xenófoba.

“Como agora tem maior urgência em redefinir a coabitação em uma sociedade mista, e particularmente a coabitação com os muçulmanos, é imperativo associar dois grupos à negociação: os franceses oriundos da imigração e os franceses que têm problemas com seus compatriotas oriundos da imigração”, adverte o jornal zuriquense.

E agora, o que fazer?

No mesmo tom, La Liberté evoca esses responsáveis políticos que “se encontram hoje na inconfortável posição de dar respostas rápidas a problemas de longo prazo, ultra complexos, notadamente a inclusão social através da educação”. A esse respeito, o fato de alunos terem recusado observar um minuto de silêncio, quinta-feira, “lembra a profunda ruptura entre a República e alguns dos seus filhos.”

Le Temps também sublinha a urgência “de refletir à maneira de educar, de viver junto mas também de melhor controlar e agir frente os perigos iminentes. Será amanhã. E os políticos, em primeiro lugar o presidente Hollande, ele que se transformou em chefe do mundo livre por um dia, sabem doravante que essa tarefa não pode ser adiada”.

A morrer de rir

O Berner Zeitung e os demais destacam outra questão a curto prazo: os sobreviventes de Charlie vão publicar quarta-feira, na próxima edição, novas caricaturas do profeta Maomé? “Um verdadeiro dilema: por princípio, a resposta deveria ser sim, mas na periferia de Paris, de onde vinham os terroristas, isso só faria criar mais cólera ainda. Nada fácil…talvez se deva admitir que, por uma vez, ficar acima da cintura.  Porque os dois lados podem – e devem – fazer um esforço, como mostrou a presença de numerosos muçulmanos na marcha de domingo.”

Apesar disso, destaca o Tribune de Genève, “todos os partidos e todas as religiões representadas domingo foram caricaturadas com irreverência nas páginas de Charlie. E, no entanto, é esse jornal que os reuniu apesar dele.”

O diário Le Matin também defende “reprimir o extremismo legalmente” e “frear o obscurantismo pela educação”, mas principalmente “não se esquecer de rir”. “Não se combate a barbárie restabelecendo a pena de morte. O medo é a arma dos terroristas. A de Cabu, Wolinski ou Charb, era a gargalhada. É ela que fere os integristas, pouco conhecidos pelo senso de humor. Eles compreendem a força, não a farsa. Ontem, tudo era digno, bonito, mas solene. Amanhã, façam como Charlie: o humor e não a guerra.”

Manifestações na Suíça

Os cartazes “Je suis Charlie” (Sou Charlie) foram vistos em várias partes da Suíça no final de semana. No domingo (11.01), aproximadamente duas mil pessoas manifestaram em Lausanne. Também em Genebra, duzentas pessoas se reuniram após um convite distribuído através da rede social Facebook.

Um dia antes, duas mil pessoas haviam participado de uma marcha na cidade.

Muitos colocaram flores na frente do consulado da França. Na cidade de Bellinzona, quinhentas delas se reuniram na frente na Praça do Governo.

“Não devemos ficar parados, mas reagir”. E “não podemos esquecer que a maioria dos muçulmanos é bem integrada à sociedade suíça”, declarou Simonetta Sommaruga na imprensa dominical. A presidente da Confederação Helvética e ministra suíça do Interior, participou também da manifestação em Paris no domingo. “A Suíça, assim como muitos outros países, manifestou sua solidariedade à França”, disse. “A coisa mais importante no momento é mostrar que compartilhamos uma série de valores comuns.”

Já o ministro da Defesa, Ueli Maurer, e o comando do Exército suíço não veem razão de repensar o dispositivo de segurança após os ataques terroristas na França. “Para nós nada mudou”, indicou Maurer à rádio SRF no sábado.

(Fonte: ATS)

Adaptação: Alexander Thoele e Claudinê Gonçalves

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