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“A situação ainda vai piorar na Síria”

Manifestantes em Kfar Nabel se solidarizam com opositores de Hama, onde as tropas sírias mataram 45 pessoas (imagem tirada de um vídeo de um manifestante). Reuters

As forças de segurança sírias reprimiram novamente domingo o movimento de protesto, matando 54 pessoas, apesar das críticas internacionais.

Essa situação vai continuar segundo o diretor de cinema turco-sírio Mano Khalil, que vive exilado na Suíça.

Depois do Papa Bento XVI, que lançou um apelo urgente às autoridades sírias para “atender as aspirações legítimas” da população, a prestigiosa instituição sunita de Al-Azhar, no Cairo, pediu segunda-feira que a Síria cesse a “efusão de sangue”, estimando que “a situação passou dos limites”.

Por sua vez, Washington, Paris e Berlim estudariam novas medias contra Damasco, enquanto as monarquias do Golfo Pérsico pediram o fim do derramamento de sangue”. A Arábia Saudita, peso pesado do mundo árabe, chamou de volta seu embaixador em Damasco para mostra sua exasperação depois do fracasso dos contatos com o regime de Bachar al-Assad.

Quarta-feira passada, o Conselho de Segurança da Onu adotou uma “declaração branda”, depois de longas discussões. Finalmente, os 15 membros do conselho publicaram uma declaração condenando “a violação em larga escala dos direitos humanos e violência com civis”.

Não obrigatório

A decisão foi adotada à unanimidade, mas essa declaração, contrariamente a uma resolução, não é obrigatória. Segundo comentaristas pessimistas, a unidade da comunidade internacional será pura e simplesmente ignorada em Damasco. É também o que pensa Mano Khalil, um diretor de cinema que mora em Berna, capital suíça, há 15 anos.

Os recentes acontecimentos em seu país de origem parecem lhe dar razão.

  

Mano Khalil não é o único a pensar que a situação vai piorar. “A reação do Conselho de Segurança da Onu é absolutamente insuficiente”, critica Daniel Graf, da Anistia Internacional suíça. A organização pede que a Onu aja rapidamente, baseando-se em uma posição juridicamente obrigatória e claramente definida.

A Anistia Internacional exige ainda um embargo de armas e bloqueio das contas do presidente al-Assad e de outros membros do regime, suspeitos de crimes contra a humanidade, no exterior.

Renome internacional

Mano Khalil, 47 anos, não pode voltar à Síria há 18 anos. Ela havia feito um filme crítico sobre a situação dos curdos na Síria. Mas ele está em contato permanente com a família, amigos e conhecidos que ficaram no país, por telefone e internet.

Com um certo renome internacional, Mano Khalil também tornou-se importante para os opositores.

“Tenho muitos amigos no Facebook e muita gente me envia imagens feitas com celulares durante as manifestações na Síria, para que eu possa divulga-las”, explica o diretor, por telefone, de uma região montanhosa da Turquia, onde começa a trabalhar em um novo documentário (ver na coluna à direita). 

Investigar

Mano Khalil estima que o número de pessoas mortas pelas forças de segurança sírias é bem mais que 2000. As organizações de defesa dos direitos humanos dizem que é um pouco menos. A Anistia Internacional tem informações de mais de 1500 sírios mortos desde o início das manifestações em meados de março.

Investigar o número de vítimas é muito difícil. De um lado porque Bassar el-Assad controla a mídia e praticamente todos os jornalistas estrangeiros foram expulsos do país. O regime também não deixa entrar qualquer representante de organizações de defesa dos direitos humanos.

 Para obter informações, a Anistia Internacional se baseia principalmente nas pessoas que fugiram para a Turquia e o Líbano. A organização pede que al-Assad autorize uma comissão de investigação independente a trabalhar na Síria.

O descontentamento dos jovens

Mano Khalil está convencido que o sangue vai continuar a jorrar, de maneira ainda pior. “Os jovens vão se revoltar porque eles veem o mundo através do Facebook. Eles sabem que existem países onde é possível viver de maneira digna e exigem esses direitos para eles também”.

O diretor está ultrajado pelos mortos, mas também pela fraqueza da reação da comunidade internacional.

“Para nós, sírios, curdos, muçulmanos ou outros, é quase inimaginável que os Estados Unidos e os outros países ocidentais, como os outros países árabes, olhem a brutalidade do regime sírio sem fazer nada. O trágico é que o povo sírio não encontre amigos no mundo”, afirma.

Islamistas armados? Uma “quimera”

O presidente Barack Obama apoia al-Assad por medo de ver os islamistas tomarem o poder, o que colocaria toda a região em perigo. “Mas na Síria não há islamistas armados e, aliás, nenhum outro grupo. Há apenas gente que reclama de poder viver livremente”, critica Mano Khalil.

 Quanto às reformas políticas anunciadas pelo presidente al-Assad quinta-feira passada, como uma nova lei dos partidos e eleições, o diretor afirma que são apenas “operações de cosmética democrática”.

Ele acha que a comunidade internacional deve intervir militarmente, como fez durante a guerra na antiga Iugoslávia ou, atualmente, no Líbano. 

Queixa em Haia

“Por que a Onu adota uma resolução para bombardear os palácios de Gadhafi e armar a oposição, enquanto na Síria ela espera que al-Assad democratize o país?”,questiona Mano Khalil. O diretor pede ainda, como a Anistia Internacional, que o presidente sírio seja levado à Corte Penal Internacional de Haia. “Um vídeo mostra Maher el-Assad (comandante das forças armadas) filmando um massacre perpetrado por soldados sob suas ordens”, explica Mano Khalil.

Mesmo se a Rússia também aumentou o tom contra Damasco, as esperanças de Mano Khalil podem não se concretizar antes de um certo tempo.

Mano Khalil recebeu em 2010 o prêmio de cinema de Berna, capital suíça, por seu filme “Unser Garten Eden” (“Nosso jardim paraíso”), dotado de 20.000 francos. Ele aborda a vida de diferentes culturas em uma horta familiar perto de Berna, onde ele próprio cultiva um pedaço de terra.

Curdo. Exilado na Suíça desde 1966, ele roda atualmente na Turquia para um documentário sobre um apicultor curdo.

Alpes. Ele perdeu tudo em seu país e, na Suíça, começou por instalar suas colmeias em um caminhão, que ele leva para os Alpes, no verão.

As relações políticas entre a Suíça e a Síria não são intensas.

As trocas comerciais também são modestas, embora tenham aumentado nos últimos anos.

A Suíça exporta principalmente máquinas e produtos farmacêuticos e químicos.

A agência suíça de cooperação (DDC) tem um escritório regional em Damasco desde 2005. A Síria esta integrada no projeto “Mashreq” da DDC.

Esse projeto visa melhorar os processos de governança regional, estimulando a criação de postos de trabalho e também inclui questões ambientais.

A ajuda humanitária da Suíça na Síria é destinada aos campos de refugiados palestinos.

Em 2009, 196 suíços moravam na Síria, entre eles 149 com dupla nacionalidade. No mesmo ano, 1023 cidadãos sírios moravam na Suíça.

Adaptação: Claudinê Gonçalves

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