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A espionagem em mutação

Poucos sabem que existem dois serviços secretos na Suíça. Keystone

Os serviços secretos da Suíça estão em plena mutação. A fusão dos diferentes órgãos poderá melhorar sua eficácia, mas o processo corre o risco de ser longo e difícil.

Como em outros países, o trabalho de coleta e análise de informações estratégicas não é feito em um só bloco.

De fato, vários serviços fornecem dados ao Estado, sendo que os principais deles são o Serviço de Análise e Prevenção (SAP, na sigla em francês) e o Serviço de Informação Estratégica (SRS)

Ainda recentemente, o SAP – orientado para a segurança interior do país – e o SRS – orientado para a coleta de informações no exterior – não dependiam do mesmo ministério. Enquanto o primeiro estava subordinado ao da Justiça e Polícia, o segundo era subordinado ao da Defesa.

Desde maio do ano passado, o governo federal helvético decidiu reunir os dois serviços sob a direção do Ministério da Defesa. A decisão foi concretizada em 1º de janeiro de 2009.

As lições tiradas do 11 de setembro

A procura por mais eficácia é a base desse reagrupamento. A experiência mostra que uma grande fragmentação dos serviços secretos poderia ser prejudicial para a segurança do Estado. Essa fraqueza foi demonstrada claramente após os atentados de 11 de setembro nos Estados Unidos.

“Percebemos que se houvéssemos confrontado um certo número de informações coletadas lá e cá, teria sido possível prever que um grande atentado estava sendo organizado em 2001. A fragmentação das informações impediu uma visão global”, declarou o deputado federal Yvan Perrin, membro da Comissão de segurança da Câmara dos Deputados.

“Os serviços estavam dispersos entre os ministérios da Justiça e Polícia e o de Defesa”, acrescenta o deputado federal Ricardo Lumengo, também membro da comissão. “Com o reagrupamento, haverá uma melhor coordenação, eficácia e controle. Por isso escolhemos essa via.”

Fusão possível

Durante uma coletiva de imprensa organizada um mês antes desse reagrupamento, os responsáveis dos dois serviços fizeram um balanço positivo. Eles indicaram que os dois serviços “estão aprendendo a trabalhar juntos”. Rapidamente a idéia de uma fusão pura e simples surgiu.

Ela reagruparia sob um mesmo teto – em um centro próximo da cidade de Berna – não apenas o SAP e SRS, mas também os serviços secretos militares. Para Markus Seiler, essa solução, que constitui uma opção “muito provável”, teria a vantagem de possibilitar economias em nível administrativo e técnico, economias que poderão ser reinvestidas na análise das informações coletadas.

O secretário geral do Ministério da Defesa não escondeu, porém, que tal fusão poderia oferecer alguns inconvenientes. “As bases legais são diferentes para os dois serviços. Para evitar mais um escândalo das fichas (ver box ao lado) é preciso pensar também nos riscos de uma entidade fusionada”, declarou aos jornalistas.

A sombra do escândalo

As “fichas”, essa é a palavra que mais incomoda quando se fala de serviços secretos no país dos Alpes. “Houve de fato excessos”, lembra-se Yvan Perrin. “E como ocorre muitas vezes, a partir do momento que avançamos em demasia em um sentido, o retorno da balança vai longe demais no outro. Passamos de uma estrutura de serviço secreto sem controle e auto-gerido a uma estrutura desmantelada”.

Já fazem 20 anos que o escândalo das fichas foi revelado na Suíça. Porém, até hoje, o caso pesa sobre o debate em torno dos serviços secretos. “Foi um problema grave e todas as intervenções parlamentares realizadas posteriormente foram inspiradas nele”, julga Lumengo. “De fato existe sempre a sombra do caso, mas as fichas também são a causa e a justificação para uma reforma”.

A eventual fusão dos diversos serviços de informação requer adptar a legislação. Ora, as más lembranças deixadas pelo escândalo das fichas suscitam fortes reações e retardam o processo parlamentar. Os debates sobre as escutas telefônicas, por outro lado, mostraram recentemente até que ponto esse dossiê é sensível.

“As bases legais deverão estar afinadas e isso nos promete um debate apaixonado de forte conotação esquerda-direita”, julga Yvan Perrin. “E uma vez que as bases legais foram estabelecidas, será ainda necessário determinar de que forma permitiremos que a nova entidade cumpra sua missão”.

Sem resultados rápidos

Porém os obstáculos poderão vir do parlamento também de fora do Parlamento. De fato, os serviços secretos geridos exclusivamente pelo Ministério da Defesa poderão criar problemas com os parceiros estrangeiros.

“É necessário avaliar as conseqüências que isso pode ter sobre a colaboração com os serviços amigos”, explica Perrin. “Estes poderão ter reticências de trabalhar com o SAP a partir do momento em que ele está subordinado a estruturas militares. Ora, sabemos que em alguns dos nossos vizinhos, sobretudo a França, existe uma desconfiança quase visceral entre os serviços dependentes do ministério da Defesa e os do Interior.”

Por conseqüência, é possível esperar que a reorganização dos serviços secretos helvéticos leve bastante tempo. “Agora estamos sendo confrontados com um problema econômico que é mais urgente. Por isso iremos recuar um pouco na questão do reforço dos serviços. Além disso, temos um novo ministro da Defesa, que deve trabalhar ainda um grande número de dossiês. Assim os resultados não virão rapidamente, sobretudo porque esta reforma irá resultar em uma grande batalha política”, conclui Yvan Perrin.

swissinfo, Olivier Pauchard

O Serviço de Análise e Prevenção (SAP, na sigla em francês) é principalmente ativo no interior da Suíça. Sua principal tarefa é o combate preventivo do terrorismo, espionagem, extremismo e o tráfico de materiais sensíveis (nuclear, por exemplo).
Dentre outras funções, o SAP contribui para a segurança de grandes manifestações que ocorrem na Suíça (como o Fórum Econômico Mundial) e publica a cada ano um relatório sobre a segurança interna no país.
O Serviço de Informação Estratégica (SRS, na sigla em francês) é principalmente ativo no exterior. Ele fornece às autoridades políticas e militares informações de natureza política, econômica, militar e científica, essenciais para a segurança da Suíça.

Comunistas. Durante a Guerra Fria, os serviços secretos do Estado e dos cantões vigiaram inúmeras pessoas e organizações. O objetivo era impedir atividades “subversivas”, particularmente comunistas.

Legal. Em grande parte dos casos, até as atividades legais acabavam sendo fichadas: atividades sindicais, simples viagem a um país do Leste europeu, oposição às centrais nucleares, etc.

Fichamento. No final dos anos 1980, entre 700 mil e 900 mil pessoas e organizações estavam fichadas (fontes oficiais).

O escândalo das fichas, descoberta por uma investigação parlamentar, desencadeou um importante movimento de indignação e protestos.

Arquivos. As fichas foram transferidas para os arquivos da Confederação Helvética.

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