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Apostas ilegais, nova praga do esporte

Jacques Rogge declarou guerra às apostas ilegais. Keystone

Segundo o presidente do Comitê Olímpico Internacional (COI), Jacques Rogge, o fenômeno movimenta mundialmente 140 bilhões de dólares por ano. Um “câncer” que ameaça a integridade do esporte.

Para o suíço Denis Oswald, membro do grupo de trabalho do COI sobre apostas ilegais, o problema é pior do que o doping.

A organização sediada em Lausanne (oeste) realizou, pela primeira vez, uma reunião de trabalho que integrou a participação de autoridades públicas, atores do movimento esportivo e operadores de apostas online. O suíço Denis Oswald, membro do conselho executivo do COI, foi nomeado ao grupo encarregado de encontrar soluções para o problema até fim de 2011. Entrevista. 

swissinfo.ch: Jacques Rogge criou uma força-tarefa para combater as apostas ilegais no esporte. Qual será a missão dela?

Denis Oswald: Será responsável por um estudo mais aprofundado de um fenômeno ainda difícil de entender e fazer recomendações. As apostas ilegais levam à manipulação e à corrupção entre os envolvidos no esporte. Elas influenciam os resultados das competições e comprometem a integridade do esporte.

swissinfo.ch: Jacques Rogge se mostra alarmista, falando de perigo para o esporte. O Senhor compartilha a opinião dele?

DO: Sim, as informações que dispomos mostram que o problema é extremamente grave e profundo. As somas de dinheiro envolvidas são muito significativas, como pôde ser confirmado pelas investigações da Interpol. A questão é ainda mais delicada, pois envolve o crime organizado. No momento, essa ameaça é maior do que o doping para a credibilidade do esporte

 

swissinfo.ch: Por que os criminosos apreciam tanto o esporte?

DO: Manipulando as competições, os criminosos conseguem embolsar ganhos enormes. Tem também o fenômeno de lavagem de dinheiro. As apostas são muitas vezes utilizadas para reciclar o dinheiro do crime organizado.

swissinfo.ch: O Senhor pode avaliar a dimensão do problema?

DO: Conseguimos alguns números, mas são estimativas imprecisas, dada a natureza dos casos. Trata-se de dezenas de bilhões de francos. As apostas esportivas não datam de hoje, mas o surgimento da Internet mudou completamente a situação. Pode-se jogar de forma anônima em qualquer lugar do mundo, a qualquer hora e em qualquer circunstância de jogo.

No futebol, dá agora para apostar em saber qual o goleiro que vai ser o primeiro a tocar na bola ou qual equipe chutará primeiro para o escanteio.

swissinfo.ch: Em qual esporte há mais risco de corrupção?

 

DO: O futebol tem sido bem afetado. É o esporte universal por excelência e as oportunidades de ganho são enormes. Mas o problema também afeta as corridas de cavalos, críquete, tênis. E para não chamar a atenção em cima das “marmeladas”, os criminosos estão apostando cada vez mais em competições de menor importância.

swissinfo.ch: Não seria melhor deixar que os políticos resolvessem o problema?

DO: Claro. O grupo de trabalho também reuniu representantes do governo e do esporte. O ex-ministro dos Esportes francês, Jean-François Lamour, por exemplo, propôs uma lei modelo adotada em seu país. O esporte serve de apoio à atividades criminosas que o Estado tem que combater. Com a ajuda dos governos e da Interpol, talvez possamos frear um pouco essa praga, já que é difícil exterminá-la completamente.

swissinfo.ch: Devemos criar uma agência anticorrupção internacional inspirada na Agência Mundial Anti-Doping?

DO: A maioria dos participantes da conferência de Lausanne achou que não seria aconselhável criar tal agência. O fenômeno é complexo e as leis são muito diferentes de um país para outro. A Interpol diz que tem os instrumentos necessários. A questão é saber como usá-los da melhor maneira possível, estabelecendo um elo de comunicação direta entre o movimento esportivo e a polícia. As pessoas envolvidas com o esporte devem comunicar os casos suspeitos à Interpol, que tomará então as medidas adequadas. Isso certamente vai exigir a criação de um órgão de coordenação.

swissinfo.ch: Todas as federações e agentes esportivos estão de acordo?

DO: Uns mais, outros menos, conforme o grau de envolvimento. Os mais ativos são os mais afetados pelo problema. A FIFA e a UEFA já definiram alguns sistemas de proteção e assinaram acordos com operadoras de apostas registradas para que essas denunciem as situações suspeitas. Mas as federações são bem solidárias, cada uma querendo evitar que seu esporte seja afetado.

swissinfo.ch: Para lutar contra a corrupção no esporte, não seria melhor introduzir mais transparência e democracia nas principais organizações esportivas internacionais para dar um exemplo?

DO: Melhorias certamente podem ser feitas nesta área. Mas as coisas não são opacas, isso é mais uma lenda. É claro, alguns casos foram manchetes. Na FIFA, os casos vieram à tona, demonstrando que a instituição não é tão opaca.

E do ponto de vista ético, a provocação dos jornalistas do Sunday Times não foi muito gloriosa. Longe de mim defender os funcionários implicados da FIFA, mas há leis muito rígidas sobre como podemos provocar a culpa do culpado. Essas regras não foram respeitadas. Prefiro ser prudente diante dessas acusações.

Luta. O Comitê Olímpico Internacional (COI) começou a lutar contra as apostas irregulares e ilegais no esporte há cinco anos. Em 2006, o Código de Ética do COI foi alterado, proibindo que todos atletas olímpicos apostassem em eventos olímpicos. Outras medidas foram tomadas posteriormente, como a criação, em 1° de março, em Lausanne, de um grupo de trabalho para estudar a questão e encontrar soluções.

Representantes. O grupo de trabalho é composto por trinta membros, representando o mundo esportivo, governos, organizações esportivas internacionais e operadoras de apostas online. Entre eles, quatro suíços: Ueli Maurer, ministro da Defesa e Esportes, Patrick Baumann, presidente da Federação Internacional de Basquetebol, Frederic Donze, diretor europeu da Agência Mundial Anti-Doping (WADA) e Denis Oswald, membro do Conselho Executivo do COI.

Colossal. De acordo com Jacques Rogge, presidente do COI, o montante anual das apostas esportivas ilegais mundial poderia chegar a 140 bilhões de dólares. O problema se concentra principalmente no continente asiático, onde o volume de negócios das casas de apostas on-line chegaria a cerca de 500 bilhões de francos por ano.

Nasceu em Neuchâtel, em 1947, Denis Oswald fez parte da equipe suíça de Remo de 1968 a 1976. Foi treze vezes campeão suíço.

Participou nos Jogos Olímpicos do México (1968), Munique (1972) e Montreal (1976). Ganhou uma medalha de bronze.

Faz parte do COI desde 1991. Em 2001 foi nomeado coordenador para as Olimpíadas de Atenas. Em agosto de 2005 foi nomeado para o mesmo cargo para o Jogos Olímpicos de Londres de 2012.

É titular da cadeira de Direito Esportivo da Universidade de Neuchâtel, também é diretor do Centro Internacional de Estudos do Esporte (CIES), em Neuchâtel.

Adaptação: Fernando Hirschy

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