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Brasil e Suíça se encontram em uma “Têra Novala”

A autora "Titi", Anne-Marie Yerli, autografa seu livro "poliglota". swissinfo.ch

Um livro “poliglota” editado por um ex-funcionário do Banco Central do Brasil procura manter viva a história e a linguagem de uma época.

“Têra Novala”, Terra Nova em dialeto da região de Gruyère, conta a aventura de emigrantes suíços ao Brasil em 1819, em várias línguas e dialetos. O livro é uma aula de história e de francês, alemão, português e dialetos da Suíça.

A obra é fruto de uma amizade sem fronteiras e o tema um assunto cada vez mais da atualidade, essa é a impressão que se tem ao folhear a obra da suíça Anne-Marie Yerly, traduzida por Alberto Wermelinger e Daniel Folly, que põe em cena o destino de 3 famílias suíças que partem ao Brasil, em 1819.

Apresentado em grande estilo com cantos do coral “Lè Tserdziniolè” e muitos discursos em vários idiomas e dialetos, o livro também faz uma homenagem ao folclore e às tradições de uma região: a Gruyère, terra do famoso queijo e de muitos ancestrais de brasileiros.

Vestido em trajes típicos da região, o brasileiro Alberto L. A. Wermelinger Monnerat, editor da obra, apresenta o resultado de sua paixão pela história da emigração suíça ao Brasil e da solidariedade de dois povos.

Na ocasião também foi apresentado o projeto “Rural Legal”, que pretende, com o benefício da venda do livro, dinamizar a economia de uma das regiões de Nova Friburgo mais afetadas pela tempestade do começo do ano, com propostas de capacitação do pessoal atingido na cadeia econômica do turismo.

Drama em patoá

O livro, segundo Alberto Wermelinger, “é o resultado de uma conjugação de esforços de suíços e descendentes de suíços do Brasil apaixonados pela história e as tradições” que conseguiram unir dois países tão antagônicos.

Têra Novala é uma peça de teatro escrita em 1976 pela suíça Anne-Marie Yerly-Quartenoud que tem como pano de fundo um tema de extrema atualidade na Suíça, que é a questão da emigração. Na verdade, o país está em plena campanha eleitoral para renovar o legislativo em eleições que acontecerão em outubro e a situação dos imigrantes é um dos pontos explorados pelos partidos, principalmente o Partido do Povo Suíço (SVP, na sigla em alemão), o maior partido do país.

Na peça, a autora expõe o drama de três famílias de um pequeno vilarejo da região de Gruyère, no cantão de Friburgo, que são obrigadas a emigrar por causa das dificuldades econômicas que a Suíça passa no início do século XIX.

Nesse período, 261 famílias suíças, 161 a mais do que havia sido combinado, chegam ao Brasil entre 1819 e 1820 e fundam a cidade de Nova Friburgo, batizada assim pelos suíços em homenagem ao cantão de onde partiu a maioria das famílias.

Como todo enredo dramático é melhor sentido em sua versão original, a peça é escrita em patoá de Gruyère, o dialeto da região, a linguagem nativa falada pelos personagens da época que a autora se esforça para que não se desagregue.

“O teatro em patoá faz rir, faz chorar. Ele conta uma bela história que, na maioria das vezes, termina bem”, diz.

Linguagem familiar

Anne-Marie Yerly – conhecida calorosamente por “Titi” no vilarejo de Treyvaux, de onde saem os personagens da peça – é uma militante da preservação do patoá de Gruyère. A autora da peça também colabora semanalmente com o jornal “La Gruyère”, onde escreve artigos em patoá publicados desde 1996.

Contrariamente aos dialetos da Suíça alemã, que se impõem quase como uma língua, os dialetos franco-provençais, dos quais faz parte o patoá de Gruyère, se limitam cada vez mais ao uso familiar em remotos vilarejos alpinos.

“As lições de patoá eu as recebi de minha mãe. A cada dia eu pedia à minha mãe que me ensinasse mais palavras novas, e em minha família nós falávamos patoá, que começava já a desaparecer no cantão de Friburgo”, lembra Anne-Marie Yerly, que também ajudou na preparação de um dicionário de patoá do cantão de Friburgo.

A alegre senhora de 76 anos diz ser muito ocupada com traduções, animações e cursos de patoá, talvez esteja aí a prova de que, apesar do cosmopolitismo e da heterogeneidade crescente da Suíça, o dialeto possa ter uma segunda chance.

Mesma paixão

Também preocupado em manter as velhas raízes e apaixonado pelas tradições do país de seus antepassados, Alberto L. A. Wermelinger Monnerat, editor do livro e autor de outras obras sobre a colonização suíça de Nova Friburgo, conta ter tomado conhecimento da peça de teatro da senhora Yerly quando pesquisava para escrever um livro sobre “o herói da Gruyère”, Pierre-Nicolas Chenaux, e os fatos que o ligaram à história de uma família tradicional da cidade serrana fluminense.

Em 2009, o brasileiro acaba conhecendo pessoalmente a autora da peça durante uma visita de 330 suíços de Friburgo à Nova Friburgo. “Cultivando a mesma paixão pela temática da emigração suíça, da preservação do patoá e das tradições de Friburgo, não tivemos qualquer dificuldade para nos entender e descobrir os nossos interesses comuns”, diz Wermelinger.

Preocupado em perenizar o trabalho da suíça, o brasileiro lhe propõe editar um livro que, além da peça, abordaria outros aspectos importantes da emigração suíça ao Brasil. Uma história que, segundo Wermelinger, não se limita ao cantão de Friburgo, já que outros cantões suíços também enviaram contingentes de colonos ao Brasil.

“Considerando que a epopeia não se restringiu ao cantão de Friburgo, senti-me na obrigação de incluir também, em respeito aos meus ancestrais vindos de outros cantões, uma tradução para a língua alemã e outra para o Senslertütsch, o dialeto falado na parte suíça-alemã do cantão de Friburgo, oferecendo aos primos distantes e aos inúmeros amigos a oportunidade de conhecer um pouco melhor, ou mesmo até tomar conhecimento, de que existe em Nova Friburgo, no Brasil, uma quantidade enorme de descendentes dos intrépidos desbravadores da aventura transatlântica de 1819”, diz o editor, e também tradutor para a versão portuguesa, na apresentação do livro.

O franco-provençal (arpitan) é uma língua galo-românica sem uma norma ortográfica unificada e marcada por uma razoável quantidade de dialetos.

Os dialetos franco-provençais que se falaram na França na região de Lyon, Grenoble e Jura desapareceram, mas na Suíça e na Itália sobreviveram.

Atualmente são falados nas regiões de Saboia e no oeste da Suíça (Vaud, Neuchatel, Valais), assim como no Vale de Aosta.

Os limites do franco-provençal são bastante incertos, sobretudo no norte; na parte ocidental do Franco Condado, de Poligny a Vesoul, os dialetos são predominantemente borgonheses (franceses, portanto); mais ao sul, a região de Saint-Claude fala dialetos franco-provençais.

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