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Café salva Nova Friburgo

Cantagalo em 1860, de J.J. de Tschudi, em primeiro plano o Hotel Friaux. Fribourg, Biblioteca cantonal e universitária

A maioria dos suíços não quis permanecer nas terras ingratas de Nova Friburgo. E logo a cidade sofre uma hemorragia humana.

Segundo estatística de 1830, apenas 662 suíços ficaram na cidade ou no campo. Mas para onde foram?

Alguns se alistam como soldados nos regimentos do Imperador ou se tornam negociantes ou artesãos no Rio de Janeiro. Outros trabalham como feitores nas fazendas ou como criados na capital. E ainda uns poucos, como Hecht, regressam à pátria. Mas a maioria dos colonos cultiva café em terras quentes. Recusa os subsídios do Imperador e da Sociedade Filantrópica, diz adeus ao passado e à mentalidade helvética. Assume o risco de acreditar no Brasil. E se converte, rápida e maciçamente, às realidades econômicas e sociais do país.

Já em 1821, esses emigrantes começam novo êxodo. Com dinamismo e vontade de vencer. Realizam com esforço e alegria, e sem escrúpulos, o objetivo da emigração: enriquecerem-se no Brasil.

Para conquistar as terras de Macahé, caçam os escravos e destroem, sem piedade, seus quilombos. Em ritmo acelerado, desmatam, queimam e plantam café nas suaves colinas da região de Cantagallo. Praticam a escravidão como seus contemporâneos brasileiros. E criam novas vilas. Escrevem cartas fabulosas à Suíça contando o sucesso da epopéia e as doçuras da terra prometida. Suas filhas brincam nos terreiros com os filhos dos escravos. Seus filhos combatem as tanajuras com fumaça. E os cafezais em flor inundam a paisagem com odores de jasmim.

Os relatos dos fazendeiros de Macahé e de Cantagallo reativam a febre pelo Brasil. Várias famílias vão se reunir com os primeiros colonos. Os arquivos do Estado de Friburgo contêm os nomes de 169 emigrantes de 1821 a 1840. Curas se misturam aos candidatos ao Eldorado. Padre Vivian, de Genebra, depois de ser vigário em St-Martin (Friburgo), vai ajudar o Pe. Joye. Padre François-Xavier Frotté, de Miécourt (Jura), associa-se aos compatriotas do Jura e funda a cidadezinha de Santa Maria Magdalena. Adrien Grivet abre um colégio em Vassouras e redige uma gramática de português. Outros decidem substituir os negros por brancos com o sistema de “parceria”.

Em 1856, colonos friburguenses partem para as fazendas do padre Stõcklín para substituir os escravos. São as famílias Claraz, Piller, Philot, Ayer, Demierre, Spitz, Brunisholz, Maillard e outras. Mas há um clima de revolta nas terras de Macahé. Os suíços não suportam o novo sistema de colonização. Como diz Georges Claraz, que viaja pela América do Sul e até tem intenção de se instalar em Cantagallo, o suíço, que se tornou cidadão livre, não suporta mais ser simplesmente um elemento na história. Mas isto, também, já é uma outra história.

Nova Friburgo torna-se passagem obrigatória da rota do café. Pela sua situação geográfica, Nova Friburgo reencontra sua vocação: tornar-se um pólo comercial. Rompe a auto-suficiência, para poder progredir. E em 1831,0 Imperador abole o regime colonial.

Dois americanos relatam o encontro dos suíços com o café

” A paisagem entre Nova Friburgo e Cantagallo é singularmente alpestre e as lavouras lembram ao viajante as doçuras dos vales suíços. Na região de Cantagallo, encontrei grande número de gentlemen alemães, suíços e franceses, cuja renda principal provinha do café. Imaginem minha surpresa quando um alemão me propôs, com cortesia, tomar com ele ein grog. Ele ficou menos estupefato com minha resposta negativa do que eu com sua proposta.

Sr. D., suíço, de Zurique, vivia cercado de numerosas lembranças de sua pátria. Enquanto eu percorria com o olhar a plantação que se estendia diante de minha casa, pensava encontrar-me no vale do Oberland no qual ele possuía grandes reproduções ornando as paredes do salão. A ilusão era ainda mais completa à noite, quando a escuridão escondia todos as palmeiras e os cactos em ‘flor: Eu ouvia somente os ecos, em francês e em inglês, ou quando soavam no piano as notas simples de Ranz des Vaches, suaves noturnos ou árias majestosas de Mendelssohn e Beethoven. E não conseguia me convencer que eu me encontrava a centenas de milhas, no interior do Brasil. Tomei consciência, porém, de que não me achava no país de Guilherme Tell, quando regressei a Cantagallo, precedido por um negro de libré, que transportava (a cavalo) uma flâmula, cujas línguas de luz iluminavam mimosas begônias luxuriantes e longos bambus que se inclinavam…” (Kidder, Daniel Parisch; Fletcher, James Cooley: Brazil and the Brazilians, 1857).

A prosperidade

Na metade do século XIX, o município de Nova Friburgo conta com 4. 810 habitantes. Os suíços representam 20% da população. Viajantes confirmam que a miséria não reina às margens do rio Bengalas.

Georges Claraz relata que os suíços se enriqueceram com o cultivo de batatas, milho, com a manteiga e o toucinho. Agrônomos esclarecidos tentam cultivar chá e o bicho-da-seda.

A cidade conta com apenas 684 habitantes (incluindo 195 escravos) e continua a se desenvolver. Compra terreno dos Salusse (o nome de solteira da esposa é Marianne Joset) para construir a igreja paroquial. As casas coloniais foram renovadas e vitrais ornamentam as janelas. Além disso, 20 novas casas foram construídas. A cidade dispõe de 3 médicos e não tem cadeia.

Nova Friburgo criou novo destino. O ar puro de suas montanhas atrai os cariocas que fogem do sufocante calor da capital e dos estragos da febre amarela. Essa Suíça brasileira oferece aos turistas hotéis famosos como o Hotel Leuenroth e o Hotel Salusse; este da família Clerc.

Pedagogos estrangeiros aproveitam-se da calma da cidadezinha para ensinar letras e ciências a filhos de ministros, comerciantes e fazendeiros da capital e da província. Dois colégios prestigiam a cidade: o do inglês Freeze e o colégio São Vicente de Paula, dirigido pelo barão alemão, Tautphaeus. Um dos filhos do Presidente do Paraguai teria estudado no primeiro colégio.

No centro da cidade, ergue-se a mansão de Antônio Clemente Pinto, futuro barão de Nova Friburgo. Personalidades surpreendentes animam a cidadezinha. O jurista João Vieira Conceição de Sinimbu, futuro senador poliglota, redige belo estudo sobre a história da colonização suíça e alemã. Há, também, o alemão C. Heinrich Bescke, que inunda os museus da Europa, com pássaros empalhados e plantas secas.

Ao pé de uma romântica cascata, o francês Charles Pinel cuida de orquídeas e envia relatórios à Academia de Ciências de Paris. O visitante alemão, Hermann Burgmeister, diverte-se com os beija-flores. A alta sociedade organiza bailes e partidas de bilhar. Conta-se a bela história de Marie-Françoise. Essa filha de Antoine Cretton casou-se com Laurent Sardenberg. Ela foi ama de leite do herdeiro do trono. Seu filho, que se divertia com o pequeno imperador, chama-se também Alcântara. Eduardo Salusse fala de prêmio de pintura conseguido em Antuérpia.

Em 1860, Jean-jacques Tschudi, embaixador suíço confessa: “O projeto de Dom João VI deu frutos”. Ele prefere a limpa Nova Friburgo a Petrópolis. E para completar a felicidade da cidadezinha, insiste em que ela seja servida, rapidamente, por uma ferrovia.

Julho de 1866, morte do Pe. Joye.

8 de dezembro de 1869 : inauguração da igreja paroquial.

09 de junho de 1873 : o trem chega a Nova Friburgo.

1890: o município conta 18.287 e a cidade 9.857 habitantes .

1911 : instala-se a eletricidade em Nova Friburgo.

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