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A energia na grande virada: entre dúvidas e esperanças

Para os ambientalistas, a energia solar tem um grande potencial na Suíça. Keystone

O fim da era nuclear vai provocar uma profunda transformação no sistema energético suíço. A Estratégia energética 2050, proposta pelo governo, apresenta muitas questões: muito lenta para quem apoia as novas fontes renováveis e irreal para os defensores da energia nuclear.

Ela vai ser o canteiro de obras deste século para a política suíça. A economia e a sociedade também vão ser atingidas por esta mudança. A nova estratégia energética nasceu a partir da catástrofe nuclear de Fukushima. Ela será realizada ao longo das próximas décadas, por etapas. E vai estar condicionada às decisões e aos compromissos de duas ou três gerações de políticos.

A conta será alta e estima-se na ordem de centenas de bilhões de francos. Os recursos irão ser necessários para poupar energia, desenvolver as fontes renováveis, modernizar a infraestrutura e fechar as usinas nucleares. A transformação do sistema energético nacional vai abrir a estrada para as novas empresas “cleantech” (tecnologia “verde”) e novos empregos.  Por outro lado, os três colossos da eletricidade, que controlam as usinas nucleares, estão prevendo pesados cortes.

No longo caminho estão previstos o financiamento de investimentos privados no campo das fontes renováveis, a cobrança de novas taxas energéticas, a reforma dos edifícios, a promoção do tráfico elétrico-motorizado, a adoção de um padrão de eficiência energética para os aparelhos e lâmpadas: a virada energética vai mexer com os hábitos e os bolsos de todos os cidadãos, de uma forma ou de outra. Milhares de novas instalações de painéis solares, de parques eólicos, assim como a exploração da energia geotérmica irão surgir em todo o território. Elas vão alterar a percepção social, econômica e paisagística do país.

Consumo pela metade 

Estes são os cenários baseados na Estratégia energética 2015, sob consulta do governo desde o mês de setembro. O projeto definitivo ainda está sendo elaborado. As linhas gerais são vagas diretrizes, mas o governo está certo de uma coisa: a Suíça vai ser autossuficiente em energia elétrica sem as centrais nucleares. Para isso serão colocadas à prova a necessidade de uma profunda” mudança de mentalidade” e a capacidade de realização de “grandes esforços”.

Na realidade, a estratégia do governo serve para cortar o consumo de energia, quase pela metade, até 2050. Ele espera alcançar este objetivo através de uma longa série de medidas de melhoria da eficiência energética dos prédios, das indústrias, dos transportes, dos aparelhos eletrodomésticos e das centrais elétricas. A economia vai atingir a importação dos combustíveis de origem fóssil, enquanto a produção interna de eletricidade irá diminuir muito pouco. A energia atômica vai ser compensada, quase totalmente, com as novas fontes renováveis (solar, eólica e etc…)

A virada energética recebeu o apoio dos partidos de centro e de esquerda, assim como das organizações ambientalistas. “Estamos indo na direção justa, principalmente, no que diz respeito ao abandono do nuclear, a redução da dependência do petróleo e as economias energéticas” declara Eric Nussbaumer, deputado socialista.

Tempos muito longos 

O parlamentar antepõe, entretanto, algumas reservas sobre o longo horizonte previsto pelo governo. “Algumas medidas importantes da nova estratégia energética foram adiadas para depois de 2020. Entre estas, está a introdução de uma taxa ecológica sobre os combustíveis que serviria para desenvolver as energias renováveis mais rapidamente. Simplesmente, o governo considera que esta taxa ainda seja um tabu na Suíça”.

Para a Fundação suíça de energia, a nova estratégia vai numa boa direção, mas muito lentamente. “As medidas não vão ser suficientes para realizar nem a metade dos objetivos previstos pela nova estratégia. O governo está freando, principalmente, a energia voltaica que oferece os maiores potenciais de desenvolvimento para a Suíça”, afirma Felix Nipkow, especialista da fundação ambientalista.

“Enquanto as centrais eólicas e as hidrelétricas enfrentam uma resistência do ponto de vista da preservação da paisagem, as instalações fotovoltaicas podem ser montadas em quase todas as casas”, explica Nipkow. “Bastaria cobrir a metade dos tetos predispostos, ou seja, aqueles projetados para o sul e com pendência, para garantir um quarto da necessidade de eletricidade”.

Lobby nuclear cético 

A nova política energética causa, com surpresa, reações de ceticismo por parte das duas correntes de centro-direita e de direita. “O governo está supervalorizando o potencial das energias renováveis e está subestimando a demanda de eletricidade, que está em constante aumento desde as últimas décadas”, declara o ex-senador Rolf Büttiker, especialista na política energética do Partido liberal radical.

Segundo o presidente da empresa elétrica Onyx, este crescimento continuará ainda no futuro. “Por um lado devido ao aumento da população e por outro porque muitas medidas da nova estratégia estão destinadas ao incremento dos consumos: pensemos apenas aos automóveis elétricos ou ao emprego das bombas térmicas no lugar dos aquecedores à base nafta”.

O ceticismo também está presente no Fórum nuclear suíço. Ele luta para manter a energia atômica como fonte de energia. “Para compensar a produção de 40% da eletricidade gerada pelas usinas nucleares será necessária uma importação maior de energia, além da criação de centrais a gás. Estamos convencidos de que a energia nuclear suíça é a melhor solução, seja sob o ponto de vista econômico como aquele da segurança de estocagem e das emissões de CO2”, conclui Roland Bilang, diretor da associação.

Legitimação popular 

Se o horizonte energético provoca interrogações, não é nem claro quando as centrais nucleares irão ser fechadas. “O governo quer adiar a decisão ainda por alguns anos. Nós achamos que esta não é uma boa opção porque sem uma data definitiva é mais difícil pressionar para acelerar o desenvolvimento das energias renováveis”, afirma Eric Nussbaumer.

Enquanto os socialistas e os ambientalistas insistem por um rápido abandono da energia nuclear, os defensores da energia atômica resistem sem a perder a esperança. “Eu creio que seria um erro fechar drasticamente todas as portas que dão para a energia nuclear, até porque nos próximos anos novas tecnologias podem garantir a maior segurança das usinas”, sustenta Rolf Büttiker. “Uma virada tão importante rumo a um futuro energético ainda incerto deveria, pelo menos, ser legitimada por uma votação popular”.

Depois da catástrofe de Fukushima, o governo e uma maioria de centro e de esquerda do parlamento decidiram pelo abandono e pela renúncia às construções de novas centrais nucleares.

O prazo para o fechamento das cinco usinas atuais ainda não foi decidido.

Inicialmente elas deveriam durar 40 anos. Mas  o governo pretende, agora, aumentar a vida útil para 50 anos. Se for assim, a última central nuclear deverá ser fechada em 2034.

Segundo a Estratégia energética 2050, submetida à consulta até o fim do mês de janeiro, os consumos energéticos irão ser reduzidos em mais de um terço até 2035 e de quase a metade até 2050.

As medidas de economia energética vão atingir, sobretudo, os combustíveis fósseis (petróleo, gás e carvão). Atualmente, eles respondem por 70% das necessidades energéticas do país.

A quota deles deveria diminuir para menos de 50% até 2050, enquanto o consumo de energia restante seria garantido, quase exclusivamente, pelas fontes energéticas renováveis.
 
O consumo de eletricidade deveria diminuir um pouco. O abandono da energia atômica ( 40% da eletricidade) vai ser compensado, quase totalmente, pelas novas energias renováveis (solar, eólica, etc…)

Para conter as oposições contra a construção de novas instalações energétcas, a prioridade às energias renováveis foi reconhecida como sendo de “interesse nacional”, num grau mais elevado em comparação àqueles da tutela da natureza e da paisagem.

O governo prevê um custo de 30 bilhões de francos para as instalações de fontes de energias renováveis. O preço da energia deverá aumentar de 20 a 30% até o ano de 2050.

Adaptação: Guilherme Aquino

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