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O divã de François Gysin

François Guysin en seu consultório em Lisboa swissinfo/Marta Gregório

Começou por estudar Filosofia e História da Arte mas apaixonou-se pela psiquiatria quando viu o seu próprio terapeuta a trabalhar. Enveredou pela medicina, apaixonou-se por uma portuguesa e mudou-se para Portugal.

Mesmo com a actual conjuntura económica não abdica do país que escolheu: se o tivesse deitado no divã do seu consultório, estimulava-o a ter mais iniciativa e criatividade. “Tudo sem necessidade de transfusões que vêm de fora”.

O consultório de François fica em pleno coração de Lisboa, um pouco abaixo na rua onde ainda existe o único hospital psiquiátrico da cidade. O ambiente sereno da sala de consultas deve-se em parte às grandes telas pintadas pelo próprio médico. “Eu via o meu avô a pintar e a desenhar, o que me incentivou muito”. Através do papel e da aguarela os pincéis de François inclinam-se mais para a “pintura abstracta, o mundo interior ou paisagens”.

Mas a verdade é que o mundo da arte nem sempre foi apenas um passatempo para François. “Comecei por estudar Germânica, Filosofia e História da arte durante dois anos até que decidi mudar. Havia uma grande tradição médica na família, o meu avô era psiquiatra”. Juntando a curiosidade pelos livros de psiquiatria que via em casa, o rumo dos estudos de François mudou quando também ele precisou de recorrer à terapia. “Vi o meu terapeuta a trabalhar e disse para comigo “Quero ser psiquiatra”.

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A alternância entre culturas

François nasceu em 1956 em Nyon, oeste da Suíça, e é fruto do casamento da parte alemã com a parte francesa do país. É o mais velho de três irmãos e da infância guarda boas memórias das amizades nascidas num bairro perto de Zurique. A alternância entre culturas, essa, estava longe de se ficar apenas pelas origens dos seus avós.

Quando visitou Portugal pela primeira vez, corria o ano de 1986, veio com a futura mulher, Fátima, “para conhecer a família dela e para conhecer o país. Ainda não tinha a intenção de me mudar para cá”, conta. E mesmo quando chegou o momento de escolher onde se estabelecer para a próxima etapa profissional, François e Fátima decidiram fazer uma viagem durante um ano com a filha pequena e quando regressaram à Suíça tudo parecia “muito cinzento e de difícil adaptação depois de tanta liberdade. Viajámos por países tropicais com muita luminosidade e outra maneira de ser”.

 Surgiu então a vontade de emigrar, que antes nunca tinha assaltado a mente de François. Como não tínhamos compromisso profissional prolongado e a nossa filha ainda não tinha começado a escolaridade, decidimos que era um bom momento”.

Portugal pareceu a escolha óbvia e em 1993 a família Gysin mudou-se de armas e bagagens para terras lusas. Primeiro foi a dificuldade com a língua, depois o esforço para a sua profissão ser devidamente reconhecida. “A nível profissional levou algum tempo para nos adaptarmos, vindos de um certo conforto da Suíça, onde tudo estava mais estruturado, mais organizado, para um estado mais caótico, mais selva”.

François recorre ao método da telepsiquiatria para acompanhar os seus doentes à distância. É o entusiasmo actual como médico psiquiatra e tem surtido resultados surpreendentes com doentes que viajam pelo mundo fora.

Terapia nas tintas

Depois de quase um ano mergulhado em burocracias para reconhecimento de diplomas, François começou por dar consultas nos Açores, na ilha do Faial. “Reconstruímos lá uma pequena casa, tradicional, e apanhei a oportunidade de ir trabalhar para ilha”, lembra.

Ao regressar a Portugal continental, trabalhou em diversas clínicas até estabelecer o seu próprio consultório privado, onde acompanha diariamente os desafios que lhe são trazidos pelos doentes. “Cada doente tem uma história única. A posteriori nunca sabemos bem o que ajudou o doente, às vezes ajudamos só porque o recebemos no dia em que ele precisava mesmo. Faz-se um trabalho regular de anos. É mais como uma viagem do que um tratamento pontual”.

A terapia do próprio François, essa, está nas tintas e nas telas de pintura. “É uma outra parte da minha vida, que me permite desligar e ter um outro núcleo de identidade”, revela no seu tom sereno. Regressar à Suíça não consta dos seus planos futuros. “Gostava, sim, de pintar mais, de desenvolver mais os projectos de pintura”. Tal como o seu avô psiquiatra.

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