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Jornalistas experimentam viver só de Twitter e Facebook

As redes sociais estão revolucionando o jornalismo. RDB

Uma jornalista suíça passou cinco dias em uma casa de campo na França, tendo acesso apenas às plataformas sociais Twitter e Facebook.

Anne-Paule Martin, repórter da rádio pública de língua francesa RSR, se isolou durante todo esse tempo com quatro colegas de profissão, no início de janeiro deste ano, para tentar produzir histórias utilizando apenas informações retiradas dos dois sites.

O veredito do seu sucesso e o que esses novos serviços significam para a coleta de notícias ainda não foi dado.

Twitter tem sido bastante estudado pelo seu papel de divulgar informações durante catástrofes naturais ou eventos políticos. No mês passado, milhares de mensagens relacionadas ao terremoto no Haiti foram transmitidas através dos seus canais. Muitos dão os créditos (ou o acusam) ao serviço de ter fomentado a agitação política na Moldávia em abril do ano passado.

“Para mim o que mais impressionou foi a velocidade dessas redes sociais”, conta Martin à swissinfo.ch, antes de embarcar em um trem rumo à Paris, onde falaria sobre o projeto na rede televisiva francesa Canal+.

Então havia muita informação onde ela estava olhando? “Não realmente.”

“Havia muitas notícias dos EUA e da França, sobretudo relacionadas à política francesa. Mas já sobre a Suíça era muito difícil encontrar notícias pertinentes em alemão ou francês”, afirma.

O corpo das mensagens no Twitter, mesmo sendo voluminoso, também era repetitivo. Martin revela que nenhuma grande história lhe escapou – ela cita a compra pela Alemanha de um CD com dados de contas na Suíça e a vitória do tenista Roger Federer no Aberto da Austrália.

Outro jornalista, Nour-Eddine Zidane, foi mais direto. “Faltavam as fontes”, revelou à agência de notícias AFP, sem esconder um sentimento de “frustração”.

Uma pesquisa de duas mil mensagens no Twitter (conhecidas em inglês como “tweets”), realizada em agosto de 2009 pela empresa de análise de tráfego online Pear Analytics, chegou à conclusão que 40% delas eram apenas “murmúrios sem sentido” e outras 40%, apenas conversação. Menos de 5% foram consideradas notícias e menos do que 10% transmitiam algum valor informativo.

A maior parte das informações relativas a Federer, lembra-se Martin, eram repetitivas: que ele tinha ganho 15 Grand Slams, ou pouco mais do que isso.

Qualidade não está garantida

No mês passado, o canal televisivo CNN integrou o Twitter na sua análise do discurso do presidente Barack Obama sobre o Estado da União. Utilizando um gigantesco telão sensível ao toque, um dos apresentadores da TV ofereceu uma avaliação geográfica detalhada do que os usuários do Twitter estavam falando sobre o discurso.

Muitos dos comentários incluíam declarações como “Apoio Obama” e “Obama é muito liberal”. A CNN era capaz de contar aos seus telespectadores, por exemplo, que 50% dos usuários do Twitter na Califórnia haviam aprovado o que havia sido dito por Obama. A TV considerou a experiência um sucesso.

“Se quiséssemos utilizar o serviço de alguma forma para agregar opinião pública e descobrir o que preocupa as pessoas, a questão não seria técnica, mas sim de saber quem está escrevendo mensagens no Twitter”, avalia Thomas Friemel, professor-assistente do Instituto de Comunicação de Massa e Pesquisa de Mídia da Universidade de Zurique.

Também há a uma questão de valor. Afinal, a CNN juntou um painel de especialistas de peso para analisar o discurso de Obama. Então, ao colocar no ar declarações anônimas, como “Apoio Obama”, o canal de TV estaria respondendo a uma questão que ninguém havia levantado?

Friemel argumenta que as pessoas procuram jornalistas para ter a análise e o Twitter para saber o que seus amigos estão pensando sobre algum tema: “Mesmo se o Twitter não me fornecer informações acuradas ou relevantes, ele me informa pelo menos o que é relevante para os meus amigos.”

Como Martin descobriu, Friemel não se surpreendeu ao ver que as pessoas se ligam a temas “quentes”, mas não necessariamente àqueles que são relevantes.

Em 11 de fevereiro de 2010, as eleições no Irã eram um dos temas mais falados no Twitter. Na metade do dia, mensagens sobre prisões, demonstrações e declarações desafiadoras chegavam a um ritmo de uma por segundo. Mas no alto da lista estava uma mensagem como “Assistindo um filme com minha mãe e meu pai e uma cena de sexo aparece na tela”.

Questão de relevância

“Penso que temos de ter uma nova perspectiva do que é relevante”, coloca Friemel. Ele concorda com Martin que as redes sociais possam rapidamente alertar jornalistas para os eventos do momento e tendências emergentes. Mas também existe um limite para isso.

Em um editorial publicado em fevereiro na influente revista de tecnologia “Wired”, o autor Clive Thompson argumenta que o debate pertinente ocorre usualmente nas beiradas da web do que em primeiro plano.

“Afinal, as ideias mais corajosas e importantes são muitas vezes forjadas longe dos holofotes, em grupos pequenos e obscuros de pessoas que estão apaixonadamente interessadas em um tema e gostam de discutir sobre isso”, escreve.

As tendências mais populares podem ser conversação benigna. Mas algumas vezes estão repletas de desinformação: depois do terremoto no Haiti, rumores espalharam-se como fogo de chão através do Twitter e do Facebook.

A companhia de transporte de cargas UPS teria supostamente declarado que iria enviar pacotes gratuitamente para o país caribenho. Já a American Airlines estaria alegadamente transportando médicos e enfermeiras para o local. As duas companhias foram forçadas a publicar desmentidos.

Na web ainda não existe nenhum sistema para “peneirar” as informações encontradas nas redes sociais e declarar o que é relevante, o que é verdadeiro ou não.

Friemel compara a velocidade com a qual as pessoas transmitem informações falsas com o pânico ocorrido nos Estados Unidos em 1938, durante a transmissão em rádio da obra “Guerra dos Mundos” do escritor George Orwell. Acreditando estar sob ataque de alienígenas, a população acabou entrando em pânico.

Para Friemel, é tudo uma questão de maturidade: “Isso é basicamente uma questão de aprendizado da mídia e como as pessoas estão habituadas a esse tipo de informação.”

Justin Häne, swissinfo.ch
(Adaptação: Alexander Thoele)

Os jornalistas receberam computadores com discos rígidos vazios e acesso aos sites da Facebook e Twitter. As regras eram restritas: eles não recebiam jornais ou tinha acesso à televisão, rádio ou smartphones.

Twitter (pronuncia-se “tuíter”) é uma rede social e servidor para microblogging que permite aos usuários que enviem e leiam atualizações pessoais de outros contatos (em textos de até 140 caracteres, conhecidos como “tweets”), através da própria Web, por SMS e por softwares específicos instalados em dispositivos portáteis como o Twitterberry desenvolvido para o Blackberry.

As atualizações são exibidas no perfil do usuário em tempo real e também enviadas a outros usuários que tenham assinado para recebê-las. Usuários podem receber atualizações de um perfil através do site oficial, RSS, SMS ou programa especializado. O serviço é grátis na internet, mas usando SMS pode ocorrer cobrança da operadora telefônica.

Desde sua criação em 2006 por Jack Dorsey, o Twitter ganhou extensa notabilidade e popularidade por todo mundo. Algumas vezes é descrito como o “SMS da Internet”.

A estimativa do número de usuários varia, pois a empresa não informa o número de contas ativas. Em novembro de 2008, Jeremiah Owyang estimou que o Twitter tenha de 4 a 5 milhões de usuários. Em maio de 2009, um estudo analisou mais de 11 milhões e meio de contas de usuários.

Benjamin Muller – France Info

Nour-Eddine Zidane – Radio France

Janic Tremblay – Canadian Broadcasting Corporation

Anne-Paule Martin – Radio Suisse Romande

Nicolas Willems – Radio Television Belgium

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