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Alpes como parque de diversões

O que acontece quando você dá descarga no toalete da estação de trem mais alta da Europa?

Tourists taking a selfie at Jungfraujoch
Mais de 70% dos mais de um milhão de visitantes no Jungfraujoch em 2017 vinham de algum país asiático. swissinfo.ch

A swissinfo.ch foi detrás dos bastidores de uma das atrações turísticas de maior altitude da Suíça: a estação alpina de Jungfraujoch. Lá descobrimos o que é preciso para manter mais de um milhão de visitantes hidratados, alimentados e respirando.

O relógio indica poucos minutos depois das sete horas da manhã de uma manhã sombria de janeiro. A estação de trem de Grindewald já está cheia de animados turistas coreanos esperando para pegar o primeiro trem até a estação alpina do Jungfraujoch. A 3.454 metros de altitude, uma visita ao Jungfraujoch é considerada a experiência do “Topo da Europa”.

Os visitantes pagam uma pequena fortuna (cerca de US$ 200,00) para viajar os quase 10 quilômetros montanha acima no trem que os leva até o vilarejo, e depois os traz de volta. Este é o preço que se paga para tirar fotos das vistas alpinas inigualáveis, participar de uma guerra de bolas de neve ou almoçar um prato de curry no restaurante indiano mais elevado da Suíça. 

O técnico Toni Eilert faz esse trajeto quase todos os dias, e gratuitamente. Acompanhamos este senhor de 57 anos para ver no que consiste o seu trabalho. A jornada começa com o primeiro trem saindo de Grindewald com turistas.

Com o maço de chaves que ele carrega por toda a parte, não seria difícil imaginar Eilert como um guarda de presídio. Mas não são detentos que requerem sua atenção, e sim máquinas.

Este homem alto, corpulento e barbado está sempre em movimento. Seguir os passos desse experiente montanhês requer caminhar por túneis e examinar atrás de portas inacessíveis ao público visitante.

Uma das primeiras “salas secretas” que Eilert nos mostra aloja os transformadores. Os dois monstros emitem um zumbido que chega a ser quase agradável.

“O complexo do Jungfraujoch tem sua própria usina hidroelétrica lá em baixo, no vale. A usina manda eletricidade aqui para cima com 60.000 volts, e os transformadores convertem a tensão em 230, 240 e 400 volts”, diz Eilert.

Degelo eletrizante

No inverno, quando neva intensamente, o complexo do Jungfraujoch tem que recorrer a outros provedores para seu abastecimento elétrico. No verão, o degelo permite que o excedente de energia seja vendido de volta para rede elétrica pública. Essa é uma instalação de alta tecnologia, mas o sistema de emergência para geração de energia é decididamente do século passado. Toni afaga carinhosamente o motor diesel-elétrico que mais parece pertencer a uma locomotiva.

“A câmara de combustão está sempre aquecida, o que significa que estamos na “pole position” quando precisarmos. Ele pode abastecer a estação de 10 dias a duas semanas”, diz ele.

A próxima parada é a sala de bombeamento, que é um labirinto de tubos e válvulas nas mais variadas cores. Essa é a rede que garante o fornecimento requerido de 15 litros de água por visitante por dia. A água é bombeada do degelo da geleira abaixo. As toaletes consomem mais do que a metade do abastecimento de água, sendo que de 30.000 a 40.000 litros de água usada são canalizados para uma usina de tratamento de esgoto no vale.

A sala de bombeamento também aloja o sistema de combate ao fogo. Todo o complexo do Jungfraujoch foi destruído em um incêndio em 1972, e os novos sprinklers são concebidos para evitar que isso ocorra de novo.

“Esse sistema é especial, pois usa ar no lugar de água, que congelaria a essa altitude. O ar é liberado quando um alarme ativa um sensor que permite que água seja bombeada na tubulação para extinguir o fogo”, diz Eilert.

O observatório Sphinx

Um ponto alto do tour de Eilert, e talvez a principal razão de ser da estação Jungfraujoch, é a visita à plataforma do observatório científico Sphinx (esfinge). É daqui que se pode ver os picos em volta, incluindo o Jungfrau e o Mönch, e, abaixo, a mais longa geleira dos Alpes, a geleira Aletsch.

Dois elevadores de alta-velocidade levam visitantes até a plataforma Sphinx em apenas 32 segundos. Mas Eilert segue outro caminho. Depois de consultar seu maço de chaves, ele abre a porta que dá para um velho elevador com revestimento de madeira, já não mais usado pelos visitantes. Chegar ao topo demora o quádruplo do tempo, mas é um serviço exclusivo já que não precisamos dividir o trajeto com os turistas. E se ficarmos presos no elevador, Eilert certamente tem uma chave para fazer com que o elevador volte a funcionar. A média anual de panes de elevador fica entre duas e três ocorrências.

“Os turistas asiáticos têm pouco tempo, pressionam os botões do elevador com força, e maltratam as portas”.

Para nos acalmar, ele acrescenta que sua equipe geralmente pode liberar visitantes presos no elevador em menos de 25 minutos, o que para quem está preso num elevador pode parecer uma eternidade.

Alguns parafusos soltos

No momento em que chegamos, a plataforma Sphinx já está repleta de turistas tirando fotos com seus celulares, muitos usando “selfie-sticks” para autorretratos. A reação normal seria ficar embasbacado com a maravilha que são os picos cobertos de neve, mas Eilert está ocupado inspecionando o piso feito de grade de metal. Dois dias atrás, uma parte ficou frouxa e teve que ser parafusada novamente. Um pensamento aterrorizante, quando se considera o que seria uma queda no abismo de gelo e pedras abaixo.

Por sorte, nenhum visitante jamais caiu por sobre a balaustrada requerendo os primeiros socorros de Eilert. A ocorrência médica mais comum é a falta de oxigênio devida à altitude.

“A maioria dos visitantes asiáticos vivem ao nível do mar. Eles se movimentam muito, ficam exaustos e têm que ser reavivados com oxigênio”, diz Eilert.

Ou reavivados com comida

Toda essa movimentação abre o apetite. Os suprimentos para os quatro restaurantes do complexo têm que ser transportados montanha acima por trem. No ano passado foram ao todo 286 toneladas.

Eilert bebe um chá em sua pausa e recorda como ele acabou num emprego no “topo da Europa”.

“Em 2001 eu vi um anúncio procurando alguém com formação técnica, e então eu me candidatei. Eu trabalhava na construção civil e também fui motorista de caminhão e de escavadeiras”, diz.

Para novos funcionários, são necessários entre dois e três anos para aprender tudo o que se precisa para esse cargo. A empresa recebe muitas candidaturas sempre se abre uma nova vaga, mas encontrar o candidato certo é difícil. Felizmente para a administração do Jungfraujoch, Eilert ainda tem mais oito anos antes de passar adiante suas queridas chaves.

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Curiosidades de Eilert

1. Os objetos que necessitam reparos mais frequentemente são as portas e portões.

“Muita gente passa sem olhar para os sinais e avisos. Eles puxam a porta ou portão e os destroem”.

2. O pedido mais inesperado que ele recebeu veio de um turista que queria recuperar sua dentadura. Ela tinha caído enquanto ele se inclinava na grade da plataforma de observação.

“Eu vesti o arnês e desci com uma corda. Eu devolvi sua dentadura e disse a ele que ele não seria mais obrigado a comer apenas sopa pelo resto de suas férias!”

3. É fácil se perder num complexo enorme como o do Jungfraujoch.

“Leva mais ou menos um ano para que um novo funcionário aprenda a se orientar perfeitamente aqui”.

4. Faz frio sempre que se está a uma altura de 3.500 metros, mas no verão é necessário usar o ar condicionado.

“Essas vidraças formam uma estufa e esquentam o complexo no verão. Com ventos entre 90 e 100 km/h, não se pode abrir as janelas”.

5. Não existem motores a diesel no Jungfraujoch por uma razão específica.

“O observatório na estação Sphinx mede as emissões de carbono e qualquer poluição afetaria as medições científicas.”

6. Um dos elevadores tem uma porta de escape secreta. Trata-se do mais antigo elevador, e é raramente usado.

“Você tem que ser bem atlético para descer pelo duto do elevador”.

7. Evite a hora do rush no horário entre 10:00 e 11:00 horas da manhã.

“Três trens chegam à estação Jungfraujoch durante esse horário e descarregam muitos turistas em um curto intervalo”.

8. Os visitantes não têm acesso à “privada panorâmica”.

“O observatório científico tem a toalete com a melhor vista panorâmica de todo o mundo”.

9. É difícil encontrar os candidatos certos para esse emprego.

“Nós estamos procuramos um eletricista já há mais de um ano. Muitos veem o anuncio, nos telefonam, mas não são realmente qualificados”.

10. Eles trabalham duro em condições difíceis, mas os empregados têm também uma vantagem.

“No inverno nós podemos trazer nossos esquis no trem. Nós esquiamos montanha abaixo o último trecho da volta depois do trabalho”.

Turismo em alta

Um total de 1.042.000 turistas visitaram o Passo Jungfraujoch em 2017. Cerca de 70% dos visitantes vieram da Ásia; em sua maioria da China, Coréia do Sul, Índia e Japão. O verão é a alta estação, quando o complexo recebe 5.000 turistas por dia. Durante o inverno o movimento cai para entre 1.000 e 1300 visitantes por dia.

O Passo Jungfraujoch não é o único centro turístico em grande altitude. Outros pontos turísticos com vistas panorâmicas incluem o monte Titlis (3,020 metros, bilhete de ida e volta por CHF 92,00), Rigi Kulm (1,798m, tíquete diário por CHF 50,00), Säntis (2,502m, bilhete de ida e volta por CHF 45,00) e Rochers-de-Naye (2,042m, bilhete de ida e volta por CHF 70,00).

Visite o website da agência suíça de turismo para outras atrações com acesso via trens e bondes.

Adptação: Danilo v.Sperling

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