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A longa viagem de Josíada

O Cabaret Voltaire, em Zurique, fundado em 1916 e ainda em atividade Divulgação

O escritor Eduardo Simantob, que às vezes escreve para swissinfo.ch, deixou o bucolismo helvético por uns dias para lançar em São Paulo o livro Josíada, por Tobias o Justo, pela editora Alameda.

Antes mesmo de iniciar a noite de autógrafos o autor foi cumprimentado por vários amigos em uma movimentada esquina do centro de São Paulo, durante a entrevista.

Hoje radicado em Zurique, Simantob fala da carreira e de como continua sendo arrastado pela curiosidade constante, desde as primeiras viagens que fez pelo mundo.

O livro conta uma epopeia línguística intraduzível, tal a irreverência com que trata as regras e a mescla de registros. A aventura descreve com humor as incursões do varão e heroi, Josíada, por  mitos presentes em diversas culturas, como o da vagina dentada – que atenta para o perigo do sexo com mulheres desconhecidas.

Divulgação

Arroubo

Simantob lembra que o texto transformado em livro saiu de um arroubo verborrágico, aos vinte poucos anos, ao voltar  para São Paulo, de uma das primeiras viagens que fez para o exterior. “Passei um tempo no kibutz, em Israel, frequentava saraus, lia Homero, Nietzsche e Joyce”, conta. Para ele, a leitura da obra do autor de Ulisses foi um grande divisor de águas. Outra influência importante foram os irmãos Haroldo e Augusto de Campos, que traduziram diversas obras durante a ditadura militar no Brasil.  “Haroldo de Campos dizia sentir falta de uma revolução joyceana”, completa.

Anos depois, quando já havia trocado o Brasil pela Suíça veio o convite editora Alameda para lançar o livro. “Foi um trabalho intenso de quatro semanas para reescrever o texto”, diz o autor de Josíada,  que estampa  E.T. Simantob, uma referência a extra terrestre, na singeleza cor de rosa da capa do livro. “Esse trabalho foi uma delícia”, conta. “De alguma forma revisitei a juventude e recuperei esse deslumbre”, completa. As ilustrações foram feitas pelos companheiros de viagem, Paulo Augusto Arena e Cláudio Wakahara.

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Geração Beat

Nesse meio tempo, enquanto o texto amadurecia na gaveta, o autor tratou de respirar outros ares. Cobriu o trecho de entre Nova York e São Francisco em uma Komby. Fez a a trilha dos índios Navajos, no Novo México, nos  Estados Unidos, e viajou pela Índia. Percorreu sem pressa a América do Sul e terminou em Trancoso, na Bahia. Rico período.

Simantob conheceu o xamanismo e tirou proveito máximo do que chama de exploração psíquica. “Fui guia de pessoas que experimentaram alucinógenos”, diz sobre as vezes em que acompanhou vivências lisérgicas de terceiros. Não por acaso bebeu na fonte de Timothy Leary, William Bourroughs e Allen Ginsberg, escritores  da geração  Beat, cujos autores rejeitavam os padrões vigentes da época pós II Guerra, eram contra o militarismo, o materialismo econômico e a repressão sexual. Defendiam as experiências com drogas e a criatividade espontânea.

Assim, entre longas viagens, de todos os tipos, o estudante de administração de empresas da Fundação Getúlio Vargas se tornou jornalista da Folha de S. Paulo. “Em 89, quando estive em São Francisco, já havia visitado a City Lights”, editora dos autores Beat. Mais tarde como jornalista, Simantob enfrentou uma sequência interminável de cartas até conseguir uma entrevista com Ginsberg. “De início ele disse que me daria 10 minutos. Felizmente, consegui um pouco mais”, conta.

Tudo isso se transformou em mais combustível para os próximos projetos do autor de Josíada. Ele segue na atividade de produtor de cinema. No momento negocia direitos para a produção de um filme sobre Milton Nascimento, uma co-produção com a França, e prepara mais uma incursão literária. “É a história de um camelo nos trópicos”, adianta. “Estou escrevendo em inglês e o texto é baseado nas experiências que tive em Zurique.”

Cabaret Voltaire

A intimidade com os clássicos e com as vanguardas, levaram Simantob a percorrer os entremeios da cultura suíça com olhar privilegiado. “Zurique tem uma história cultural que não é óbvia”, lembra.  “O dadaísmo nasceu na cidade, com Tristan Tzara, mas pouca gente faz essa associação”, conta ele, sem deixar de mencionar o  Cabaret Voltaire em pleno funcionamento até hoje.

Fundado em 1916, o local era ponto de encontro dos dadaístas. O movimento que reuniu artistas e escritores durante a I Guerra no território neutro, em Zurique.  O movimento ganhou influência internacional em Bucareste, Zagreb, Berlin e Nova York, nos anos 20. Personalidades como Tzara, Marcel Duchamp, Max Ernst e Hannah Höch desafiaram o nacionalismo vigente, promovendo o intercâmbio de ideias sobre arte e literatura.

Épico psicodélico em três cantos de rima abestagliatta, psicografado por E.T. Simantob, Editora Alameda, São Paulo, 2013

São Paulo

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