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O apelo de artistas suíços à direita conservadora

Um grupo folclórico suíço no teto do Centro Cultura e Congresso em Lucerna. Keystone

Artistas suíços denunciam a tomada de posição da União Democrática do Centro (UDC) em relação à cultura.

Eles agora querem fazer parte de uma lista de “artistas estatais bajulados” que foi estabelecida pelo mais forte partido da Suíça. Ela cita Pipilotti Rist, Christoph Büchel e Mike Eschmann.
























Era 4 de dezembro de 2010 e todas as câmaras de TV do país estavam voltadas para a um descampado próximo a um vilarejo do cantão de Vaud (oeste). Depois ter sido negado o acesso a um local de reuniões em Lausanne, a União Democrática do Centro (UDC, direita conservadora e partido majoritário na Suíça) realizava sua assembleia de delegados ao ar livre.

Os participantes discutiram diversos pontos particulares do novo programa partidário como a rescisão dos acordos de Schengen (n.r.: das fronteiras livres dentro do espaço comunitário da União Europeia). Porém muitos capítulos desse novo texto não chamaram atenção.

É o caso de três páginas dedicadas à cultura, algo inédito para a UDC. “Do mesmo modo que a escola e a política de mídias, finalmente nos dedicamos a uma área que foi negligenciada por muito tempo, a cultura”, declarou o deputado federal de Zurique, Christoph Mörgeli, que redigiu o capítulo mencionado.

Fusão de Pro Helvetia e da Presença Suíça

“Temos de lutar, também nesse ponto contra o desperdício do dinheiro público”, acrescenta. A UDC reivindica, dentre outras, a fusão da agência cultural helvética Pro Helvetia com a Presença Suíça, organismo de promoção da imagem da Suíça. O partido já havia pouco tempo atrás pedido sua dissolução.

A fusão dos dois organismos deve ser “acompanhada por uma redução substancial do orçamento” e “concentrar sua missão sobre um número restrito de áreas”. Mas a UDC denuncia também os artistas, os cita por nome e afirma que são “artistas estatais bajulados”.

As pessoas mencionadas são Pipilotti Rist (que teria “direito à uma aposentadoria vitalícia da agência Pro Helvetia”), Christoph Büchel (autor de uma “peça pornográfica”) e o diretor Mike Eschmann (autor de uma “obra misógina e apologética à violência”). Por que eles e não outros? “Pegamos os exemplos mais extremos”, respondeu Christoph Mörgeli, que admite não saber o montante de subsídios recebidos pela artista Pipilotti Rist.

“Sou um artista estatal bajulado”

Para a plataforma Arte+Política, a lista de citados está “muito incompleta”. Eles lançam o apelo seguinte ao presidente da União Democrática do Centro, Toni Brunner, e a Christoph Mörgeli. “Também sou um artista estatal bajulado e mimado. Posso pedir-lhe a gentileza de me incluir no programa do seu partido?”

“Inspiramos-nos no escritor alemão Oskar Maria Graf, que não havia sido selecionado pelos nazistas para a inclusão na lista de artistas vetados, o que significava afinal que eles estavam recomendando sua leitura”, explica o escritor bernense Guy Krneta, um dos artistas engajados na Arte+Política.

“Queime-me”

“Em solidariedade a esses escritores, cujos livros foram queimados dois dias antes durante uma ação em maio de 1933, Graf publicou um texto em um jornal de Viena (Áustria) para dizer ‘Queime-me!’. Então queremos fazer uma homenagem a ele e essa referência não é uma coincidência. Queremos mostrar nossa solidariedade, independentemente da obra, com os artistas denominados como ‘aproveitadores’.”

Mas o apelo e a ação dos artistas vão ainda mais longe do que a simples solidariedade. Arte+Política, que se considera uma rede e uma plataforma para difundir posições comuns, denuncia também “os raciocínios totalmente falsos” e as “declarações grosseiras”.

“Para mim, achar que ‘a cultura é uma questão somente da cultura’ significa simplesmente o fim da política”, ressalta Guy Krneta. Os artistas se opõem também à distinção estrita operada pela UDC entre a “cultura popular” e a cultura “oficial”.

Segundo a UDC, a cultura é uma questão do mercado e não do governo. O partido reivindica “mais cultura popular”, com indivíduos “apaixonados e voluntários”. E se a cultura popular recebesse também subvenções? “Isso também é incorreto”, responde Mörgeli.

Agradar o público!

A cultura, escreve ainda o partido, “tem apenas um objetivo: criar qualquer coisa que agrade o público e aos que a praticam”. Ele estima que “uma produção que fracassa em atingir seu público-alvo não tem sentido.”

“Opor a cultura popular à ‘cultura do Estado’ não tem base”, reforça Guy Krneta. “Inúmeros responsáveis – diretores, chefes de corais, cenógrafos de teatros amadores, artistas e atores, etc., – também são apoiados pelo governo.”

Mas a UDC não recusa todas as formas de intervenção pública em favor da cultura. Ela vê com bons olhos incentivos fiscais – “como isenções” – para as “fundações culturais de direito privado e doações”.

Para Christoph Blocher, portanto, que financia uma fundação musical na ilha de Rheinau? “Sim, o governo economiza milhões graças a ele”, responde Christoph Mörgeli.

A direita conservadora poderá, em todo caso, ampliar sua lista de artistas “aproveitadores”. Na primeira semana do ano, o apelo “Acariciados e mimados” da Arte+Política foi assinado por mais de cem artistas.

Os delegados da UDC nacional aprovaram o programa político 2011 e 2015 do partido em quatro de dezembro de 2010. São 25 capítulos, dos quais pela primeira vez um é dedicado à cultura e outro sobre a política de mídias.

“Esse texto passará por uma revisão redacional antes de ser traduzido igualmente em inglês (conforme a uma proposição adotada no congresso do partido), além das versões em alemão, francês e italiano. A versão impressa definitiva será disponível a partir de meados de janeiro de 2011”, escreveu a UDC no seu site.

Adaptaçao: Alexander Thoele

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