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O repórter musical de uma época

vo-music.com

A Suíça tem um grande número de festivais de música, sobretudo na primavera e no verão. O primeiro deles é o Cully Jazz, organizado em um povoado cuja atividade principal é a produção de vinhos.

O festival vai até 4 de abril e foi aberto por Lenine, como parte de um grande giro que faz com sua banda pela Europa.

swissinfo: Você não se cansa de explicar seu nome, as origens e influências de sua música?

Lenine: Não, é natural que exista uma curiosidade sobre o processo de como é feito, o trabalho de composição, os arranjos, esse tipo híbrido que congrega vários tipos de expressão e de cultura. É natural que as pessoas queiram entender como é que se dá esse processo. Só que eu mesmo não sei como isso se dá porque tudo é extremamente intuitivo e orgânico. Eu não sei em que dosagens as influências entram na minha música.

Seu último disco, “Labiata”, tinha cópias de vinil. Como você lida com a tecnologia dos suportes, da internet etc.?

Independentemente do que seja passado, futuro e presente, eu sou a favor de qualquer tipo de pulverização cultural, em qualquer veículo, digital ou analógico. Evidentemente que eu sou da geração do vinil e sou um “audiófilo” também, gosto de ouvir e adoro a reprodução. Eu acho que o digital ainda não chegou ao que o analógico já conseguiu. O fato de fazer não apenas um cd, mas um vinil e um Pen Drive reafirma isso. Nesses três veículos, talvez o cd seja o passado, o Pen Drive o presente e o vinil volte a ser o futuro.

Você ainda ganha algum dinheiro com disco?

Eu sobrevivo de música já há muitos anos, mas não do disco. Não vivemos mais na época dos milhões, mas na época dos mil, quiçá milhares. Eu sempre fui um artesão no meio da indústria, por isso tenho uma certa desenvoltura em trabalhar no micro. Eu sempre me apropriei de todos os veículos, mas como artesão.

A pirataria mata a indústria e o artista?

A pirataria sempre existiu, não surgiu agora. Agora, com a internet, a indústria engoliu mosca. Não percebeu há dez ou 15 anos que tudo estava mudando e agora está correndo atrás. O que eu acho mais importante é que essa tecnologia digital nos permite revalorizar as funções de cada um e de descobrir novas formas de negócio para a música.

Você é formado em Engenharia Química e poderia estar trabalhando numa multinacional. A música é socialmente mais importante?

Eu sou distribuído por uma multinacional e não tenho nenhum tipo de preconceito. Agora a música é química. O ser humano é produto de reações químicas e a música é uma projeção dessa química toda. Uma das coisas que aprendi na Engenharia Química é que, para você ser homogênio, tem de saber ser heterogêneo. Isso eu levo na minha música até hoje.

Para que serve a música?

A música basicamente é entretenimento, mas eu prefiro acreditar que a minha música seja uma reportagem musical do tempo que eu vivo.

Tem alguma diferença em se apresentar na Suíça, na Itália ou na Suécia?

Dentro do Brasil, reconhece-se no meu trabalho o que tenho de nordestino e isso se perde no exterior. Quando eu toco na Ucrânia, na Rússia, na Polônia, as pessoas reconhecem no meu trabalho justamente o que ele tem de não brasileiro.

A colônia é sempre bem-vinda e é uma maneira da gente apaziguar a saudade, mas eu não toco só para a colônia e isso é que é o mais interessante. O meu diálogo é com o planeta. Eu faço música contemporânea e ponto. E essa música contemporânea tem reflexos em toda parte do planeta. Eu venho não só exercitando isso na música que eu faço, mas também através de parcerias não só com a cultura latina, mas anglo-saxônica e nórdica. Então eu acredito na música como aproximação dos povos.

Você é autodidata porque tinha muita facilidade ou porque não teve tempo de estudar música?

Eu fui autodidata porque o meu veículo que me aproximou da música foi o rock, e o rock não vem de um processo acadêmico. Tem mais a ver com a rua, então nesse sentido eu faço uma cultura de rua. Evidentemente que ao longo dos anos eu fui aprofundando a música e lógico que esbarrei na linguagem. Tive que aprender isso para fazer arranjos e produzir alguma coisa, mas o meu processo foi todo intuitivo.

Você é totalmente independente ou também depende dos esquemas de promoção, publicidade, marketing etc.?

Dependo como todo mundo, mas dependo muito mais das relações humanas. Eu sofro de uma doença muito bacana que é a alta fidelidade. O grupo que está comigo tem pessoas há quase 20 anos tocando juntos. Isso gera um tipo de relação que extrapola o vínculo empregatício. Não é uma diva com alguns músicos acompanhando. Somos uma banda e funcionamos como uma equipe e uma família e isso é o que faz a coisa soar diferente.

Você viaja há bastante tempo e já encontrou muita gente. O músico brasileiro é diferente?

Não só o músico, mas a música brasileira vem de mãos dadas com outras artes (cinema, teatro, televisão, poesia). Isso dá uma profundidade à nossa música que é difícil de ver em outro lugar. Eu rodo esse mundo, mas nunca conheci outro país com tanta exuberância e tanta diversidade.

Nem os músicos cubanos?

O que temos em comum é o elemento africano. Mas no Brasil temos o índio, o italiano, o japonês, o alemão. A gente tem mais sabores e mais cores a acrescentar a essa mescla.

swissinfo, Claudinê Gonçalves, Cully

Lenine nasceu em 2 de fevereiro, em Recife.

1981
Lenine se muda de Recife para o Rio de Janeiro.

1983
Lançamento do álbum “Baque Solto”, em parceria com Lula Queiroga
(Polygran)

1992
Lançamento do álbum “Olho de peixe”, em parceria com o percussionista Marcos Suzano (Independente)

1997
Lançamento do álbum “O Dia em que Faremos Contato”, primeiro disco solo
(BMG)
O álbum ganhou dois prêmios Sharp, nas categorias “Revelação” e “Melhor Canção”, com “A Ponte” de Lenine e Lula Queiroga.

1999
Lançamento do álbum “Na Pressão” (BMG)
Prêmio APCA de “Melhor Álbum de Música Popular”

2000
Direção Musical da mini série e do filme “Caramuru – A Invenção do Brasil”, com direção de Guel Arraes e Jorge Furtado

2001
Direção musical de “Cambaio”, espetáculo musical com canções de Edu Lobo e Chico Buarque, com direção de João Falcão.

2002
Lançamento do álbum “Falange Canibal” (BMG).
O álbum recebeu o Grammy Latino na categoria “Melhor Álbum Pop Contemporâneo”.

2004
Participação do evento “Carte Blanche”, em Paris

Lançamento de “Lenine InCité” – CD e DVD, gravado ao vivo em Paris, na Cité de La Musique.
O álbum ganhou dois Grammys Latinos – como “Melhor CD de Música Contemporânea” e “Melhor Canção” com “Ninguém Faz Idéia”, de Lenine e Ivan Santos &
4 Prêmios TIM (Melhor CD, Melhor Música, Melhor Cantor e Melhor Cantor Voto Popular)

2005
Produção de “Segundo”, de Maria Rita
Produção de “De Uns Tempos Pra Cá”, de Chico César

2006
Lançamento do álbum “Lenine Acústico MTV” (Sony BMG)

O álbum ganhou o prêmio Grammy Latino na categoria “Melhor CD Pop Contemporâneo”

Lançamento, nos Estados Unidos, da coletânea “Lenine” (Six Degrees Records)

2007
Produção do CD “Lonji” do cantor cabo verdiano Tcheka

Trilha Sonora do espetáculo “Breu”, do Grupo Corpo.

2008
Produção do novo CD de Pedro Luiz e a Parede

Lançamento do álbum Labiata (Universal)

Fonte: site oficial de Lenine

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