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ONG suíça quer frear deportações para a Itália

Diante do grande afluxo de migrantes do norte da África, a Itália apresenta grandes lacunas na assistência aos refugiados. Keystone

A Organização Suíça de Ajuda aos Refugiados (OSAR) denuncia as falhas do sistema italiano de refugiados e pede ao governo suíço que pare de mandar de volta os exilados vindos da Itália.

Enquanto isso, autoridades italianas dizem respeitar seus compromissos, mas querem mais flexibilidade na aplicação das regras de Dublin.

O acordo de Dublin, do qual a Suíça também faz parte, prevê que, se um requerente de asilo faz um pedido em outro Estado signatário, ele pode ser deportado. O primeiro país onde é feito o requerimento é responsável pelo tratamento do pedido de asilo e se ele é rejeitado, a repatriação de seu autor ao seu país de origem também fica ao encargo desse país.

Assim, durante o primeiro semestre de 2011, a Suíça mandou de volta para um país do espaço Dublin cerca de 1.600 pessoas, mil para a Itália. “As pessoas que obtiveram o estatuto de refugiado ou um estatuto de proteção na Itália não devem mais serem devolvidas a este país”, exige, no entanto, a OSAR.

Esta posição, publicada pela ONG no início da semana, decorre das deficiências preocupantes identificadas por seus representantes que, em colaboração com outros representantes da Noruega, foram à Roma, Milão e Turim no ano passado para observar os procedimentos de asilo e as condições de acolho do país.

A organização pede agora que a Suíça se contenha mais na hora de mandar de volta à Itália “requerentes de asilo vulneráveis, famílias com filhos e mulheres solteiras”. Mas a OSAR não pede um bloqueio total das deportações, de acordo com Adrian Hauser, porta-voz da organização: “não se trata de acolher massas de gente na Suíça, mas um número limitado de pessoas que precisam realmente de ajuda”, disse à swissinfo.ch.

Na sua declaração, a ONG fornece um quadro dramático da situação na Itália, onde os requerentes “vivem nas ruas, mesmo exilados altamente vulneráveis como famílias com crianças, doentes mentais e pessoas traumatizadas”.

“É claro que a Itália está atualmente com grandes problemas devido ao elevado número de requerentes de asilo. Mas as condições de vida deles não são tão ruins para que não possamos mandá-los de volta para aquele país. A Itália respeita as regras do sistema europeu de asilo e os parâmetros internacionais”, garante o responsável de informação da Secretaria Federal de Migração (OFM, na sigla em francês) Joachim Gross.

Luz e sombra

Do seu lado, o diretor do Conselho Italiano para Refugiados (CIR), Christopher Hein, esclarece: “É importante fazer distinções. Na Itália, há certamente grandes lacunas devido à ausência de uma assistência de integração nacional, mas, ao contrário da Grécia e de Malta, os direitos básicos são respeitados”.

Segundo o Sr. Hein, a situação do asilo na Itália comporta “luz e sombra”. Entre os pontos negativos, ele cita o fato de que antes de obter um encontro para preencher o requerimento, as pessoas “não têm acesso a nenhum tipo de ajuda”.

Os maiores problemas dizem respeito “especialmente àqueles que tiveram seu estatuto de proteção internacional reconhecido. A partir desse momento, eles praticamente não têm direito a alojamento. Eles recebem uma autorização de residência que lhes dá o direito de trabalhar. Mas isso não significa que eles encontrão rápido trabalho ou casa”.

Sobre o lado positivo, Christopher Hein argumenta que “a percentagem de pessoas que beneficiam de estatuto de proteção internacional é mais importante na Itália do que em qualquer outro lugar da Europa”. Além disso, “o procedimento de asilo apresenta garantias que não existem em nenhum outro lugar”.

Ato de solidariedade

Apesar de atenuar significativamente a gravidade das avaliações feitas sobre a situação pela OSAR, o diretor do CIR concorda com o apelo da organização para frear as deportações para a Itália. Apelo feito pela OSAR ao governo suíço com o argumento de “solidariedade e compromisso para compartilhar a carga com os Estados-Membros do Acordo de Dublin”.

Christopher Hein lembra que o acordo comporta a chamada “cláusula humanitária”, “cada Estado poderá, sem alterar qualquer lei, aplicá-la com mais elasticidade e flexibilidade”. “Ser flexível significa fazer um gesto de solidariedade conjunta, ainda mais diante do processo revolucionário na Tunísia e no Egito, e com os refugiados africanos na Líbia”.

Adrian Hauser também destaca que “a grande onda de requerentes de asilo tão temida na Suíça por causa das revoltas nos países do norte da África não chegou. Mas alguns usam esta ameaça para fins políticos”. Para o porta-voz da OSAR, no entanto, “é hora da Suíça se lembrar da sua tradição humanitária”.

Enquanto isso, o porta-voz da Secretaria de Migrações garante que “o governo suíço está dialogando com Roma para encontrar soluções para o problema da deportação para a Itália, com base no acordo de Dublin”. Joachim Gross acrescenta que também serão tratadas “as oportunidades para ajudar a Itália, dado o enorme afluxo que ela enfrenta”. Mas não saberemos mais. O porta-voz disse simplesmente que nenhuma decisão concreta foi tomada ainda, embora reconheça que “o sistema de Dublin não funciona bem”.

Na votação federal de 05 de junho de 2005, os eleitores suíços aprovaram a entrada da Suíça ao chamado Espaço Schengen e os acordos de Dublin de cooperação em matéria de justiça, polícia, vistos e asilo.

Atualmente, 27 países participam do espaço Schengen, ou todos os países membros da UE menos Romênia, Bulgária e Chipre, além de três países associados: Suíça, Noruega e Islândia. Estes 30 Estados aplicam o regulamento Dublin II.

Segundo este, cada pedido de asilo é tratado por um só país membro. A intenção é evitar que uma pessoa faça o pedido em vários países do espaço Schengen.

O procedimento é baseado em dois regulamentos da UE, incorporados na legislação suíça em 2008, que estabelecem os critérios de competência para análise de um pedido de asilo. Dublin define a jurisdição de um Estado para execução, mas não a lei interna dos países em matéria de asilo.

No final de 2010, a Itália tinha um total de 9.200 lugares para os refugiados.

Após a crise política no norte da África, este número aumentou consideravelmente, particularmente através de acordos de colaboração com as regiões italianas, atingindo um total de 50.000 lugares.

Das cerca de 48.000 imigrantes do norte da África que chegaram no primeiro semestre de 2011, quase metade são requerentes de asilo, principalmente da África sub-saariana.

Adaptação: Fernando Hirschy

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