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Suíços votaram em meio a grandes controvérsias

As votações desse domingo 14 de junho contaram com uma participação de 43,5% dos cidadãos. Keystone

Os temas levados às urnas nesse domingo geraram grandes debates e um tremendo suspense com relação ao referendo sobre a lei de rádio e tv. Os cidadãos tiveram que opinar em questões sobre eugenismo e federalismo.

A Suíça era um dos últimos países da Europa a proibir a prática do diagnóstico genético pré-implantação, ou seja, a identificação de graves doenças hereditárias no embrião fertilizado em um tubo de ensaio em um estágio ainda precoce. 

Os casais que sabem que são portadores de uma anomalia genética e querem preservar a futura criança tinham que fazer esse exame no exterior, já que lei suíça não permitia essa prática no país. Ou acabar, mais tarde, tendo que fazer um aborto, acrescentando mais um sofrimento em uma situação já dolorosa.

Em tais condições, manter a proibição absoluta do diagnóstico genético pré-implantação (PGD) não se justificava mais nos dias de hoje. A aprovação não resolve definitivamente a questão, ela abrange apenas uma revisão da Constituição, um pré-requisito para a legalização do PGD, mas não fecha a porta a um futuro referendo contra a legislação de execução.

Esta revisão da Constituição vai primeiro possibilitar uma flexibilização bem-vinda das condições em que a fertilização in vitro é praticada atualmente na Suíça, também em desacordo com as normas aplicadas nos outros países europeus. Os médicos só poderão implantar um único embrião, o que limitará o risco de gestações múltiplas.

A iniciativa, aprovada por 61,9% dos cidadãos, levantou a questão da banalização do diagnóstico genético pré-implantação. As questões éticas levantadas são numerosas e afetam a relação com a doença e a normalidade. Com outras práticas relacionadas aos avanços da medicina preditiva, o PGD acaba questionando a vontade de controle do ser humano sobre si mesmo.

Herança 

Com 71% de “não”, o imposto sobre as heranças foi provavelmente a proposta desse domingo que mais parecia condenada desde o início. Ainda assim, a ideia de taxar fortunas e empresas legadas aos herdeiros gerou muita discussão.

A proposta do novo imposto que incidiria sobre uma herança a partir de 2 milhões de francos foi lançada pela esquerda, que pretendia redistribuir a riqueza e garantir o financiamento do sistema de aposentadoria mínima.

Para frear a crescente concentração do patrimônio, a esquerda tem multiplicado iniciativas que tentam reduzir a disparidade salarial ou introduzir uma maior equidade fiscal. Nos últimos dois anos, os suíços já se exprimiram sobre três propostas, todas rejeitadas: a inciativa “1:12 por salários equitativos”; a iniciativa “por um salário mínimo” e outra “contra os privilégios dos milionários”.

De acordo com os opositores à iniciativa, o novo imposto aumentaria a carga fiscal na Suíça,  comprometendo a praça econômica. “A Suíça está entre os poucos países europeus que aplicam ainda o imposto sobre o patrimônio. Se a iniciativa fosse aprovada pelos eleitores, deveríamos suportar uma tripla imposição: imposto de renda, sobre o patrimônio e sobre as sucessões”, declarou Jean-François Rime, deputado federal do Partido do Povo Suíço (SVP, na sigla em alemão).

A iniciativa também foi combatida pelo governo federal, que pretende garantir o financiamento da aposentadoria mínima com uma ampla reforma da previdência através de um aumento do imposto sobre o consumo (IVA). Segundo o governo, o projeto da esquerda aumentaria a carga fiscal de muitos herdeiros, dado que atualmente somente três cantões taxam os descentes diretos e poderia forçar os contribuintes ricos a deixarem a Suíça.

Bolsas de estudos

A iniciativa proposta pelos estudantes de passar o sistema de bolsas de estudos do âmbito estadual para o federal também foi amplamente recusado por 72,5% dos eleitores. 

No federalismo suíço, a educação é uma prerrogativa cantonal (estadual). Isso também se aplica às bolsas de estudos. Os cantões determinam de forma autônoma os critérios e as condições de obtenção, assim como o montante. Consequência: as possibilidades de obter uma bolsa e o montante podem variar muito entre um cantão e outro.

Além disso, nas outras décadas, o número de estudantes em cursos pós-obrigatórios (secundário e superior) aumentou constantemente em toda a Suíça. Entre 1990 e 2013, esse número progrediu em 44%, passando de 441.687 inscritos para 638.135. Durante o mesmo período, o número de beneficiários de bolsas de estudos caiu em 9%.

Para alterar esta situação, a União de Estudantes da Suíça (UNES, na sigla em francês) lançou em 2010 uma iniciativa popular “relacionada às bolsas de estudos”, que previa a transferência de competência legislativa na questão da formação superior dos cantões ao governo federal. O objetivo era padronizar os regulamentos, garantindo um nível de vida mínimo durante toda a duração de uma primeira formação terciária reconhecida.

A questão não gerou um debate público, concentrado mais na questão do imposto sobre as heranças e principalmente na mudança da lei de rádio e televisão, mas teve o mérito de destacar as condições de estudo por vezes difíceis e a injustiça do sistema atual.

Taxa de rádio e tv

Os suíços acabaram aprovando por um fio (50,1% de “sim”) a revisão da lei sobre rádio e televisão. Para seus adversários, essa revisão representa um novo imposto para financiar a SSR, serviço público de rádio e televisão. Para seus defensores, trata-se de uma taxa mais justa e mais adaptada aos novos hábitos de consumo.

Em princípio, qualquer pessoa que assiste televisão ou ouve rádio na Suíça tem de pagar uma taxa. A maior parte do dinheiro recolhido vai para a Sociedade Suíça de Rádio e Televisão (SRG SSR), da qual faz parte swissinfo.ch. Em contrapartida, a SSR tem um mandato de serviço público, o que significa que deve utilizar esse dinheiro também nas regiões linguísticas menos populosas (de língua francesa, italiana e romanche). A revisão não muda nada nesse princípio de base.

Atualmente, as casas que não têm aparelho de televisão nem de rádio podem ser dispensadas da taxa. Billag, a empresa encarregada pelo governo federal de cobrar a taxa, verifica quem deve ou não pagar. Quem não paga recebe uma multa. As empresas também devem pagar, salvo se declararem que não dispõem de aparelhos de rádio nem de televisão.

Para o governo e a maioria do Parlamento, esse regulamentação estava ultrapassada e anacrônica. Na verdade, já faz tempo que programas de rádio e televisão podem ser captados no computador, tablete e smartfone. A passagem a um sistema de taxa independentemente do tipo de aparelho, proposta pela revisão, é portanto lógica, necessária e conforme à época, argumentaram os defensores da nova lei.

O Parlamento aceitou a revisão da lei federal sobre a rádio e a televisão (LRTV) em 26 de setembro de 2014, por 127 votos contra 99 e 7 abstenções. Isso significa que todas as casas e todas as empresas deverão pagar a taxa. Uma isenção é prevista para as empresas com faturamento inferior a 500.000 francos suíços, para os beneficiários de ajuda social e os residentes de asilo. As pessoas que puderem provar que não dispõem de aparelhos de rádio, televisão nem internet poderão ser isentas durante cinco anos.

A União Suíça de Artes e Ofícios (USAM) – organização que representa as PMEs suíças – lançou o referendo, que acabou se tornando um debate por ou contra a SSR. Segundo a USAM, o Estado quer introduzir um “novo imposto midiático” com essa mudança de sistema.

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