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Bilhões são esquecidos após anos de labor

Keystone

Todo ano, as caixas de pensão perdem o traço de dezenas de milhares de antigos segurados, metade estrangeiros. Vários bilhões de francos suíços ficam assim à espera de um dia serem reclamados por seus proprietários. Por vezes, estes jamais aparecem.

Partiram sem deixar endereço. O que poderia parecer um cenário de filme é uma realidade no setor aposentadoria mínima, conhecida na Suíça como “seguro velhice” (AVS). Muitos dos antigos segurados desparecem na natureza, deixando para trás milhares de francos, fruto de trabalho duro. No total, quase 5 bilhões de francos suíços foram acumulados nas caixas de pensão suíças. Mesmo se existem barreiras de proteção, o fenômeno ocorre geralmente na mudança de emprego. A lei da previdência social (LPP) garante a cada segurado o direito de livre-passagem, ou seja, a transferência do capital da caixa de aposentadoria para a caixa do novo empregador.

Se o segurado não encontra emprego imediatamente, o capital é depositado numa conta bloqueada  na “Fundação Instituição LPP”, criada especialmente pelos parceiros sociais, ou num banco ou seguradora. O capital fica nessa conta até o segurado pedir a transferência para uma nova caixa de pensão ou chegar à idade da aposentadoria (65 anos).

Na Suíça, a previdência é baseada em três pilares:

O seguro velhice e sobreviventes (AVS, de aposentadoria mínima) e o seguro invalidez são destinados a garantir as necessidades vitais dos aposentados, órfãos, viúvas e deficientes. São seguros estatais e obrigatórios para todos, inclusive para quem trabalha por conta própria.

A previdência profissional  para a velhice, sobreviventes e inválidos (caixas de pensão)  garantem, com a AVS, pelo menos 60% do último salário. Quem trabalha por conta própria não é obrigado a cotizar.

O terceiro pilar, facultativo, é a previdência pessoal, que permite cobrir necessidades suplementares depois da aposentadoria.

Contatos perdidos

Por incrível que pareça, grande parte desse dinheiro nunca foi reclamado por seus donos e muitos segurados sequer podem ser encontrados pelas instituições que gerem os ativos de livre passagem: eles mudaram várias vezes de domicílio ou partiram para o estrangeiro sem comunicar o novo endereço.

Somente a Fundação Instituição LPP perdeu o contato com 600.000 titulares de contas, metade deles estrangeiros, por um montante total de 2,5 bilhões de francos suíços. Segundo estimativas, um soma idêntica “dormiria” nos bancos e companhias de seguros.

“Sabemos exatamente quanto cada segurado  com ativos depositados em nossa fundação tem direito. Cada franco pode ser atribuído. O que não sabemos é o endereço atual ou os dados bancários dessas pessoas. Isso nos permitiria depositar o dinheiro”, explica Max Meili, diretor da Fundação Instituição LPP.

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Melhorar a informação

Frequentemente, os contatos foram rompidos ao final de um contrato de trabalho. Nesse momento, a caixa de pensão é obrigada a comunicar ao segurado o montante do capital acumulado e de pedir onde o dinheiro deve ser depositado. Por vezes, os empregadores comunicam muito tarde a saída do empregado, depois que ele já mudou de endereço ou até para o estrangeiro.

Não é raro que os segurados ignorem simplesmente a existência de capital para a aposentadoria. Todo ano, milhares de pessoas sequer respondem às solicitações de sua caixa de pensão e se esquecem de indicar onde elas devem depositar o dinheiro que lhes pertence. 

Em todo caso, o dinheiro não está perdido: o mais tardar dois anos depois da mudança do segurado, as caixas de pensão têm a obrigação de depositar  as somas na Fundação Instituição LPP. No entanto, essa transação é feita geralmente sem o conhecimento do  segurado.

Segundo os sindicatos, tudo isso mostra que os empregadores e as caixas de pensão poderiam melhor informar os segurados de seus direitos. “Muitos problemas seriam evitados com a introdução de um formulário obrigatório que o segurado assinaria no fim de seu contrato de trabalho”, opina Kuert Killer, responsável da política social na federação sindical Travail.Suisse.

Em regra geral, o capital de aposentadoria da previdência profissional pode ser pago ao segurado quando ele chega à idade da aposentadoria (65 anos).

Em três casos, o capital pode ser retirado antecipadamente, se o segurado:

– deixa definitivamente a Suíça para se instalar em um país não membro da União Europeia ou da Associação Europeia de Livre Comércio (AELE). Se ele se instala em um país-membro, os ativos ficam bloqueados na Suíça (junto à Fundação Instituição LPP) até a idade da aposentadoria;

– começa uma atividade lucrativa independente e não é mais submetido à previdência profissional obrigatória;

– precisa de dinheiro líquido para comprar uma residência principal (casa ou apartamento) ou para amortizar uma hipoteca imobiliária.

Acordos com outros países

É provável que somas importantes também foram esquecidas, em particular pelos estrangeiros, no Seguro Velhice e Sobreviventes (AVS, aposentadoria mínima), seguro estatal que permite, junto com o fundo de pensão, de manter o nível de vida depois da aposentadoria. No entanto, a AVS não tem números sobre o assunto. Isso é devido principalmente ao próprio sistema desse seguro em que o segurado não acumula seu próprio capital. As rendas do AVS são financiadas pelos segurados ativos.

“O governo federal assinou acordos com cerca de 40 países europeus, o que nos permite colaborar as diversas instituições estatais de previdência. Somos regularmente contatados por essas instituições quando, por exemplo, um antigo segurado anuncia junto a ela que também trabalhou na Suíça”, explica Rolf Camenzind, responsável da comunicação na Secretaria Federal de Seguridade Social.

Esses acordos, no entanto, não foram assinados com todos os países. É o caso notadamente do Kosovo, de onde provém muitos trabalhadores na Suíça. Aliás, em caso de morte de um ex-segurado, a viúva e os órfãos ignoram geralmente seus direitos às prestações na Suíça. E o AVS não procura ativamente os beneficiários das rendas, mesmo se eles chegaram à idade da aposentadoria.

Nunca é tarde demais

No setor das caixas de pensão, essa tarefa é da Central do 2° Pilar, uma instituição encarregada de retomar o contato entre as instituições de previdência e os segurados que chegaram à idade da aposentadoria. Essa central foi criada pelo governo federal a pedido da Itália, Espanha e Portugal, depois da revelação do problema dos fundos esquecidos pelos trabalhadores desses países.

A Central do 2° Pilar também mantém contato com as instituições de previdência desses países europeus, mas as investigações feitas no estrangeiro raramente dão resultados. “Na Suíça, quase sempre encontramos os beneficiários, mas é muito mais difícil encontrar um estrangeiro que deixou a Suíça. Se ele não volta para seu país de origem, então é quase impossível ou não se comunica, quando volta, com a instituição estatal de previdência de seu país”, explica Daniel Dürr  diretor da Central do 2° Pilar.

Nesse caso, a única esperança é que o beneficiário se anuncie espontaneamente. Nunca é tarde porque os dossiês são conservados pela Central até que o beneficiário chegue aos 100 anos de idade. “Podemos depositar o dinheiro mesmo se o proprietário se anunciar quando já tiver 101 anos”, conclui Max Meili.

Adaptação: Claudinê Gonçalves

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