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Novo ministro começa a mudar a política estrangeira

O novo ministro das Relações Exteriores na abertura da sessão da Comissão dos Direitos Humanos, em Genebra. Keystone

A crise na Síria permitiu ao novo ministro das Relações Exteriores, Didier Burkhalter, de virar a página aberta por sua predecessora Micheline Calmy-Rey.

A Suíça volta a uma concepção mais tradicional e estrita da neutralidade e reafirma sua disponibilidade para eventuais mediações.

Didier Burkhalter esteve pela primeira vez esta semana no Conselho dos Direitos Humanos da ONU, em Genebra.

Em seu discurso de abertura da 19ª sessão, marcada por um debate urgente sobre a Síria, o novo chefe da diplomacia suíça condenou “todas as violações dos direitos humanos cometidas na Síria”. E isso quando países ocidentais como os Estados Unidos e a França condenaram claramente o regime de

Bachar el-Assad.

Depois de lançar um apelo “às autoridades sírias a cessarem imediatamente o uso da violência e da repressão contra a população civil”, Didier Burkhalter sublinhou “que é importante que a crise humanitária na Síria não desvie a atenção da busca de uma solução política e que essa solução passa, inevitavelmente, por um verdadeiro diálogo inclusivo.”

O mesmo apelo também foi lançado pelo ministro chinês das Relações Exteriores, Yang Jiechi, que fala de um “diálogo político aberto” pelo seu homólogo argelino, Mourad Medelci : “A Argélia pede que cessem as violências, venham de onde venham, para permitir a abertura de um diálogo inclusivo sem ingerência estrangeira.”

Mensagem às grandes potências

 

Segundo o pesquisador Hasni Abidi, as formulações utilizadas pelo ministro suíço visam um objetivo preciso. “Os primeiros destinatários de Didier Burkhalter são as grandes potências. Seu discurso retoma termos ocidentais, mas também dos russos, chineses e argelinos, pois a Argélia também apoia Moscou e Pequim”, analisa o diretor do Centro de Estudos e Pesquisa do Mundo Árabe e Mediterrâneo (Cermam).

Dessa maneira, o chefe da diplomacia suíça aborda um dossiê complicado. “Ele entra em um terreno difícil com a Síria e a mediação política. Será que a Suíça tem meios para isso? Só o tempo dirá.”

Questionado por swissinfo.ch, Didier Burkhalter precisa: “É uma declaração geral. Ela quer sublinhar que uma solução política deve incluir o maior número possível de atores. É preciso condenar os atos passados e apoiar a ação humanitária presente. Mas já é preciso pensar em reconstruir, o que passa por uma iniciativa política inclusiva.”

Portanto, um papel imediato da Suíça na crise síria parece descartado. Até porque a Suíça fechou sua embaixada em Damasco. “Não temos atualmente um canal aberto com o governo sírio. Se for solicitada pela comunidade internacional, a Suíça está à disposição para desempenhar o papel de mensageira de diálogo”, explicou o ministro das Relações Exteriores.

  

Retorno à Guerra Fria

 

Didier Burkhalter tentaria então a inserir a Suíça nas relações de força das grandes potências no Oriente Médio.

Pelo menos é a opinião de Hasni Abidi: “Com o veto chinês e russo no Conselho de Segurança para a questão síria, as relações tensas entre a Rússia e os ocidentais no caso do nuclear iraniano, o mundo dá a impressão de voltar à Guerra Fria (1945-1989). Foi um época em que os bons ofícios da diplomacia suíça e sua neutralidade estiveram em seu apogeu.”

A Suíça procura hoje posicionar-se nessa “nova configuração do cenário internacional marcada por um novo vigor da Rússia e um certo declínio das grandes potências ocidentais, sem esquecer as mudanças geoestratégicas consecutivas da Primavera Árabe”, analisa Hasni Abidi.

Reposicionar a diplomacia

 

O especialista do Oriente Médio Yves Besson também fala em reposicionamento da diplomacia suíça, com a volta de uma concepção mais tradicional e estrita da neutralidade. “Desde que assumiu o cargo, Didier Burkhalter pronunciou a cada uma de suas raras intervenções públicas a palavra neutralidade para as situações não europeias.”

Aliás, o ministro suíço lembrou diante dos jornalistas em Genebra que sua prioridade é estreitar as relações da Suíça com seus vizinhos imediatos.

Pode-se então falar de ruptura, da parte do muito moderado Didier Burkhalter, com a linha seguida pela sua predecessora Micheline Calmy-Rey, cuja “diplomacia pública” procurava chamar a atenção tanto da população suíça como das chancelarias estrangeiras? Yves Besson e Hasni Abidi acham que sim.

“Todo novo ministro deve marcar seu território e, portanto, romper com a política do antecessor. Mesmo se ainda é embrionária, há ruptura linha, de concepção e de visão do novo ministro das Relações Exteriores”, argumenta Hasni Abidi. 

Em Genebra, o Conselho dos Direitos Humanos da ONU adotou uma resolução condenando os ataques das autoridades de Damasco contra civis.

O texto foi aprovado por 37 votos. A Rússia, a China e Cuba votaram contra. Três se abstiveram.

A resolução proposta pelo Catar, Turquia, Arábia Saudita e Coveite e apoiado por 52 países, entre eles a Suíça, pede que o governo sírio autorize o “livre acesso e sem entraves da ONU e das agências humanitárias para fazer uma avaliação completa das necessidades em Homs e outras regiões.”

O documento “deplora as ações brutais do regime sírio nos últimos 11 meses, notadamente o uso da artilharia pesada e de tanques contra bairros residenciais, causando “milhares de mortos” civis  e levando dezenas de milhares de pessoas a fugirem.

Ele condena as perseguições e os assassinatos  de opositores, de defensores dos direitos humanos e de jornalistas.

Exprime também a preocupação da ONU com a falta de acesso à comida, aos cuidados médicos básicos e ao combustível e também com as ameaças e atos de violência contra o pessoal médico, pacientes e instalações de saúde.

A Rússia pediu o voto denunciando um texto “desequilibrado” e refletindo uma “visão política unilateral” de certos países acerca da situação da Síria.

Fonte: ATS (agência suíça de notícias) 

Adaptação: Claudinê Gonçalves

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