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Suíça: país onde político serve e “desaparece”

Da esq. à dir.: Schneider-Ammann, sua esposa e o "Huissier" aplaudidos pela população de Langenthal. Keystone

Nove dias depois de eleitos, os novos ministros Johann Schneider-Ammann e Simonetta Sommaruga são recebidos com pompas nas suas cidades de domicílio.

Porém, ao contrário de muitos países ocidentais, poder na Suíça é celebrado com austeridade. Até ex-ministros confirmam que nunca deixaram de ser cidadãos comuns.

A pequena praça frente ao prédio governamental do cantão e cidade de Berna já estava tomada no início da tarde de ontem (31/09). Uma fanfarra tocava marchas militares e dois porta-estandartes seguravam as bandeiras das comunas (municípios) de residência de Johann Schneider-Ammann e Simonetta Sommaruga, respectivamente Langenthal e Köniz, as duas localizadas no cantão de Berna. Alguns poucos turistas e cidadãos comuns aguardavam atrás das barreiras de segurança.

Minutos mais tarde chegou a tropa de honra do cantão, vinte homens trajando uniformes militares do século 18, com fuzis e baionetas em mãos, e ficam perfilados em posição de sentido. Dentro do antigo casarão, políticos de vários partidos e outras personalidades aguardavam ansiosamente a chegada dos ministros recém-eleitos. Um deles explicou o motivo da pompa. “A eleição de duas pessoas do mesmo cantão é uma exceção”, afirmou Samuel Schmid.

Esse político bernense, que por oito anos também foi ministro federal, acha que a atual constelação no poder executivo (dois ministros de Berna de um total de sete) não trará desequilíbrios. “O cantão de Berna sempre teve um papel de ponte, de mediador entre a parte alemã e francesa da Suíça”, afirma Samuel Schmid. Ele próprio também é de Berna.

Exemplo democrático

Schneider-Ammann e Sommaruga chegaram a pé, acompanhados pelas respectivos cônjuges. Os poucos agentes de segurança presentes na praça, reconhecidos pelos microfones fixos na orelha, se mantinham à distância. O único símbolo de poder em torno dos dois políticos eram os “Huissier”, ajudantes de ordem simbólicos. Com seus uniformes antigos, eles sempre acompanham membros do governo federal nos programas oficiais. A simplicidade no ambiente era tal que um estrangeiro de passagem poderia pensar estar vivendo uma festa privada.

Com um copo de vinho na mão, o deputado-federal do Partido Social-Democrata, Ricardo Lumengo, conversava com outras pessoas no coquetel. Questionado por swissinfo.ch sobre as diferentes formas de celebrar o poder em países africanos – Lumengo é originário de Angola – onde existe geralmente um apego ao cerimonial – e a Suíça, que geralmente preza pela sobriedade e simplicidade, ele relativizou. “É uma confirmação e demonstração de uma etapa bem avançada da democracia. A pessoa tem poder pelo fato de ter sido eleita. Isso não ocorre pelas suas qualidades, pelas forças ou amizades. Essa pessoa sabe que haverá eleições e também batalhas ideológicas enquanto estiver no poder”, disse.

Poucos metros distantes, Samuel Schmid era saudado pelos que o reconheciam. Eles apertavam sua mão e partiam. Por várias vezes o ex-ministro ficou sozinho no salão, como um cidadão anônimo. Porém seu desapego aos anos do poder fica claro ao tentar explicar como funciona a Suíça. “Aqui o poder é compartilhado e fortemente controlado. Temos vários atores: o governo executivo, o Parlamento e somos um país muito federalista, ou seja, os cantões têm muita soberania. E finalmente, o povo é que decide. É uma rede de poder, controle, influência e decisão muito difícil a explicar. É o fruto de uma longa tradição. É um milagre que funciona.”

Voltar ao poder? Schmid não titubeia. “Essa não é uma tradição suíça. Aqui existe um provérbio que diz: ‘servir e desaparecer’. A partir do momento em que a reputação é mais forte do que o verdadeiro poder político, então começa a ficar perigoso.”

Poder dividido

Adolfo Ogi era mais assediado por jornalistas e amigos. Enquanto observava Schneider-Ammann e Sommaruga serem cercados pelas câmaras de televisão, ex-ministro com trezes anos de experiência no poder executivo avaliava o que significa governar na Suíça. “Aqui o poder está dividido entre sete pessoas. Por isso não pode acontecer nada de mal. Quando você sugere algo, então os outros seis já estão prestando atenção”, respondeu à swissinfo.ch.

Ele também concorda que não é muito fácil compreender como se governa o país dos Alpes.”Muita gente no exterior não entende que a Suíça tenha um sistema, em que um presidente é escolhido a cada ano (n.r.: dentre os sete ministros do governo federal)”. Ele se apressa em justificar: “O povo não quis que alguém no governo ficasse forte demais.”

No salão do prédio governamental em Berna funcionários convidavam os presentes a entrar nos ônibus que irão à Langenthal e Köniz. Nelas, as prefeituras haviam organizado festas para receber “seus” ministros. Sua eleição costuma trazer muito orgulho às populações locais, como revela Ogi. “No meu caso tive de ir três vezes à Kandersteg. Uma vez quando eleito e, duas vezes, quando fui presidente da Confederação Helvética.”

Para alguns políticos como ele, chegar ao posto mais elevado representa também uma conquista aos seus concidadãos. “Foi algo fora do comum no meu vilarejo. A gente sempre pensava lá no alto (n.r.: Kandersteg está a 1.200 metros acima do nível do mal no coração dos Alpes bernenses): somos pobres, daqui vem a água que alimenta as cidades lá embaixo e são eles que se enriquecem; nós nunca temos chance de nos tornar algo.”

Assim a eleição pode ter um caráter educativo, como lembra Ogi. “Talvez a minha eleição tenha dado mais coragem aos jovens de Kandersteg: de que alguém com o nível primário (n.r.: ele não tem curso superior) de Kandersteg possa se tornar conselheiro federal (ministro) – por 13 anos – e mais sete anos como conselheiro especial da Organização das Nações Unidas (ONU). Eu mostrei que nós, montanheses, conseguimos não só subir e descer de montanhas, mas também servir o país em posições elevadas.”

Banquete para o povo

Quando Johann Schneider-Ammann chegou a Langenthal, vilarejo de 15 mil habitantes, sua população já o esperava impaciente. O prefeito Thomas Rufener o convidou a marchar pelas ruas, onde foi aplaudido vivamente por populares, dos quais a maioria o conhecia pessoalmente. Antes de ser eleito, ele era deputado federal e também dono e chefe executivo do Grupo Ammann, o maior empregador da região, empresa com um faturamento líquido de pouco mais de um bilhão de francos suíços.

No coração da cidade, a prefeitura havia armado uma série de barracas e colocado bancos e mesas à disposição do público. A festa prometia não apenas homenagens ao novo ministro, mas também apresentação de vários grupos musicais locais e comida gratuita: salsicha, risoto e bebidas não alcoólicas. Schneider-Ammann e sua família se misturaram ao povo e ficaram até às onze da noite comemorando.

Ao contrário do que um estrangeiro imaginaria, os custos da festa não vieram dos bolsos do empresário, mas sim dos cofres públicos. Porém, com razão política: “Na Suíça, a comuna de domicílio do novo ministro é obrigada por lei a organizar uma festa popular, mas os custos são compartilhados até com o governo federal. São as nossas tradições”, revelou Peter Zumstein, chefe do turismo local.

Os membros do gabinete federal são nomeados pelos seus partidos. Eles são eleitos em uma sessão conjunta dos deputados federais e senadores.

O voto é secreto

Os sete membros do gabinete federal devem ser confirmados em seus cargos a cada quatro anos após as eleições legislativas nacionais. As próximas serão em outubro de 2011.

O governo federal é composto por um gabinete de sete membros (ministros).

Não existe primeiro-ministro.

A posição de presidente da Confederação Helvética é exercida por um ministro em sistema rotativo (muda a cada ano).

O gabinete federal deve refletir a diversidade política, cultural e linguística do país.

Durante 50 anos, os postos de ministros foram repartidos entre os quatro principais partidos (radicais, democratas-cristãos, social-democratas e a União Democrática do Centro) através de um acordo informal.

O sistema era conhecido como a “fórmula mágica” e foi alterado em 2003.

Um princípio fundamental do gabinete multipartidário é a necessidade de chegar a um consenso. As decisões são tomadas de forma coletiva.

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