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Professor quer lei islâmica na Suíça

Proposta do professor Christan Giordano causa polêmica. Wikipedia

Christian Giordano, professor de Antropologia Social da Universidade de Friburgo, defende a adoção parcial da xária (lei islâmica) por tribunais da Suíça.

A proposta publicada na revista “Tangram”, da Comissão Federal contra o Racismo (CFR), gera polêmica e fornece munição aos adversários da construção de minaretes no país.

Giordano é defensor de um “pluralismo jurídico”. Em sua opinião, especialmente no Direito Civil, Familiar e Financeiro deveriam ser considerados “aspectos culturais” dos réus. Para tanto, deveria valer um direito especial, incluindo a lei islâmica, desde que ela não contradissesse a Constituição suíça.

Em entrevista ao jornal NZZ am Sonntag, o professor disse que tribunais da xária poderiam ser usados para julgar crimes de lesão corporal. Ele admitiu, no entanto, não estar seguro de que o direito islâmico também deva ser aplicado para o julgamento de casos de poligamia.

Giordano disse estar convicto de sua “provocação”, mas sustenta que o aumento da imigração no país exige esse debate. “Engana-se quem pensa que é possível integrar completamente essas pessoas no sistema jurídico suíço. A distância cultural é grande demais. Por mais que os migrantes se assimilem, sempre permanece uma diferença. Também no nosso sistema jurídico”, argumentou na revista Tangram.

Diretor critica própria revista

A proposta causou irritações entre especialistas. O encarregado da integração dos estrangeiros de Basiléia, Thomas Kessler, adverte sobre uma “perigosa relativização do estado de direito. É exatamente nosso confiável sistema jurídico que fomenta a integração”.

Ele rebate o argumento da “distância cultural” usado por Giordano. “Já existe uma diferenciação. Até certo ponto, os tribunais levam em consideração a cultura do acusado”, afirma Kessler no jornal Tagesanzeiger.

O presidente da CFR, Georg Kreis, critica a própria revista por ter publicado na edição 12/2008 o artigo “Pluralismo Jurídico: um instrumento para o multiculturalismo?”, do professor de Friburgo. Tangram deveria ter publicado pelo menos uma opinião contrária, diz Kreis.

A União Democrática de Centro (UDC, direita nacionalista) aproveita o escorregão para criticar a CFR. “A publicação do texto de Giordano mostra quão parcial é a comissão anti-racismo”, afirma Walter Wobmann, deputado federal do partido.

A UDC quer pedir o fim da CFR. Como co-presidente da “Iniciativa contra minaretes”, Wobmann diz que a proposta de Giordano “mostra o que o Islã já é capaz de pedir”. A polêmica “Iniciativa contra minaretes” deverá ser submetida ao voto popular em setembro de 2009.

Debate ultrapassado

Na opinião de Reinhard Schulze, especialista em Islã da Universidade de Berna, Giordano tenta provocar um debate ultrapassado no resto do mundo ocidental. Esse assunto foi muito discutido, por exemplo, no Canadá, nos anos de 1990, mas a adoção de tribunais da xária foi descartada, lembra.

Há um ano, o arcebispo de Canterbury (Inglaterra) fez uma proposta semelhante e pediu a instituição de tribunais da xária para muçulmanos. O líder da Igreja Anglicana recebeu aplausos dos muçulmanos e ouviu protestos irados da maioria da população.

O presidente da Coordenação das Organizações Islâmicas na Suíça, Farhad Afshar, diz que no mundo islâmico é comum muçulmanos, cristãos e judeus estarem sujeitos a sistemas jurídicos diferentes. “Nem por isso a ordem estatal sucumbe à existência paralela de diferentes sistemas jurídicos”, diz.

Hisham Maizar, da Federação das Associações Islâmicas na Suíça, vê poucas chances para a proposta. “Mesmo que, em princípio, houvesse um acordo sobre a introdução da lei islâmica, demoraria anos ou até décadas até se chegar a um consenso sobre o que é a xária”, declarou ao Tagesanzeiger.

Christian Giordano conseguiu o que queria: criar polêmica. O diário NZZ, por exemplo, comenta: “O que o antropólogo social pede é nada menos do que uma ruptura com a ordem jurídica nos modernos Estados ocidentais. Nem todos devem ser iguais perante a lei: dependendo da origem, etnia ou religião, deve valer outro direito e haver julgamentos por outros tribunais.”

swissinfo, Geraldo Hoffmann (com agências e imprensa)

Na Suíça vivem aproximadamente 340 mil muçulmanos, segundo dados do censo de 2000.

Deste total, 56% vêm da ex-Iugoslávia (albaneses do Kosovo e bósnios), 20% da Turquia, 4% dos países do Maghreb, 3% do Líbano, 15% da África e da Ásia. Quase 12% deles têm passaporte suíço.

O número de muçulmanos no país aumentou fortemente durante os últimos anos. Eles representavam 4,3% da população em 2000, contra 2,2% em 1990. A alta explica-se, sobretudo, pelo afluxo de refugiados durante a guerra nos Bálcãs.

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