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Rumo ao segundo turno

Sede do IMD em Lausanne (oeste) Keystone

Para executivos brasileiros e acadêmicos, que se encontraram no início de outubro em Lausanne para discutir os desafios e oportunidades do Brasil, quem quer que vença as eleições terá que mexer na economia.

Líderes de empresas brasileiras, instituições financeiras e professores se reuniram no início deste mês em Lausanne para discutir o futuro do Brasil.  E se há uma concordância entre a maioria dos participantes do evento organizado pelo instituto The Evian GroupLink externo, da escola de negócios IMD, é que qualquer que seja o resultado do segundo turno das eleições (26 de outubro) no Brasil, quem assumir a presidência em 2015 vai ter que fazer ajustes na economia do país.

“Nossos problemas atuais vêm principalmente de aspectos internos, do mercado doméstico”, afirmou Murilo Portugal, presidente da FebrabanLink externo, Federação Brasileira de Bancos. “É muito importante reconquistarmos a confiança dos investidores. Mesmo a Dilma (Rousseff) já indicou que se ganhar, algumas mudanças serão feitas.”

Os dados econômicos do país têm causado preocupação. O Brasil registrou crescimento (PIB, Produto Interno Bruto) de 2,3% em 2013, depois de uma expansão de 1% em 2012 e de 2,7% em 2011, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Para 2014, a expectativa, que vem sendo revisada pelos analistas para baixo, está em 0,29%.

A previsão de inflação (IPCA) para 2014 é de 6,3%. O acumulado em 12 meses (até setembro) chegou a 6,7% , bem distante da meta central de 4,5%. A taxa de juros deve ficar em 11% ao ano. A meta de superávit primário (resultado das contas públicas sem juros) prevista para 2014 era de 80,774 bilhões de reais, mas tal resultado parece quase impossível de ser atingido, já que de janeiro a agosto deste ano o superávit primário acumulado está em 4,675 bilhões de reais.

“Seja quem for eleito, terá que enfrentar essa situação. É fato que os caminhos escolhidos deverão ser diferentes”,  afirmou Elizabeth Farina, CEO da UNICALink externo (União da Indústria da Cana-de-Açúcar). “Dilma Rousseff tem uma visão mais intervencionista, de uma política pública sendo uma espécie de motor da indústria e economia. Já o Aécio Neves e seu partido PSDB têm uma abordagem mais orientada ao mercado, com uma estratégia que inclui medidas mais horizontais, com menos ações setoriais”, avalia Farina.

De qualquer forma, a CEO da UNICA lembra que o resultado do primeiro turno foi surpreendente, não só pelo fato de o candidato do PSDB Aécio Neves ter ido para o segundo turno, como também pela quantidade de votos que recebeu (33,55%).  “A Marina Silva (PSB) também cumpriu um papel muito importante neste processo, que foi o de trazer o tema sustentabilidade para o centro do debate”, diz Farina.  

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País polarizado

Para o professor do IMDLink externo e ex-diretor do Banco Mundial, Carlos Braga, a grande questão do momento é a óbvia polarização do país. “É a volta dos embates entre PSDB e PT, que tem sido o tom brasileiro nos últimos anos”, afirma professor. “Se olharmos para o mapa do Brasil, teremos basicamente o Sul a favor do Aécio e o Norte e Nordeste a favor da Dilma. E quando se entra nesse tipo de polarização, é possível que hajam mais confrontos entre as campanhas, conforme evoluírem.”

Segundo Braga, o modelo de crescimento dos últimos 12 anos se esgotou. “Ou seja, o modelo baseado na redistribuição de renda, na expansão do crédito, numa política industrial intervencionista chegou ao limite. Por um lado,

há o pleno emprego, o que é ótimo, uma redistribuição de renda que é significativa, o que também é muito bom. Mas por outro lado, a economia está sendo sustentada pelo crescimento do consumo e expansão de crédito. E chegamos num momento em que o nível de endividamento das famílias  atingiu um certo patamar e as pessoas não vão continuar consumindo”, explica Braga. 

Braga acrescenta ainda: “Por criar um ambiente não muito favorável aos investimentos, seja pela política mais intervencionista, seja pela excesso de regulações e burocracia,  o resultado é o crescimento medíocre que estávamos vendo.”

Na análise do professor, se Dilma for reeleita, não ocorrerão grandes mudanças neste modelo. “Mas mesmo ela vai ter que confrontar essa situação de crescimento anêmico. Mesmo porque isso vai gerar uma série de consequências no nível de emprego, no bem estar da sociedade. Acredito que teremos ajustes, mas nada dramático”, diz Braga. 

O processo das eleições

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Thomas Dislich, CEO da VicunhaLink externo Europa, residente a Genebra, também participou do evento sobre o Brasil no IMD. Para ele, que prefere dar declarações sobre o assunto como um cidadão brasileiro e não como um representante da empresa em que atua, o fato relevante é que o processo de eleição está sendo impecável. “E isso é uma grande força do Brasil”, afirma o executivo, que trabalhou como mesário no primeiro turno em Genebra.

“Todos sabemos que a doutrina do governo atual não é muito business friendly, mas isso faz parte da democracia. Os resultados mostram que o eleitor é consciente.  Cada um tem a sua preferência, mas o mais importante é continuar o processo. Esse é o caminho que vai levar o Brasil para frente no longo prazo”, afirma Dislich.

OS PROBLEMAS DE SEMPRE

Entra ano, sai ano e os executivos brasileiros continuam a apontar as mesmas dificuldades para fazer negócios no Brasil. A burocracia continua em pauta. Segundo o estudo “Doing Business 2014”, publicado pelo Banco Mundial, o Brasil ocupa a 123ª posição num total de 189 economias quando o assunto é abrir uma empresa. São necessário 107,5 dias para abrir um negócio no país, de acordo com o estudo. Na Suíça são necessários 18 dias.

No mesmo estudo, o Brasil ocupa a 159ª posição quando o tema é pagamento de impostos. No país, se gasta 2600 horas por ano para calcular e conseguir quitar 9 impostos. Na China, por exemplo, são necessárias 318 horas por ano para 7 impostos. Na Suíça, mesmo com 19 impostos a serem pagos, o tempo gasto para processar e quitar é de 63 horas por ano.

Mesmo com toda criatividade e flexibilidade conhecidas do profissional brasileiro, o nível de inovação no país ainda deixa a desejar. Segundo declaração dada pela diretora do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), Fernanda de Negri, os empresários investem no Brasil apenas 0,5% do PIB em inovação. Nos países desenvolvidos esse número gira em torno de 2,0% a 2,5%.

A lentidão dos processos de exames de patentes e marcas no país é conhecida.  Em entrevista à Agência Estado no início do ano, a gerente de Desenvolvimento e Inovação da Federação das Indústrias do Estado do Rio de Janeiro (Firjan), Ana Carolina Arroio, afirmou que para seu setor não há vantagem da proteção de marcas e patentes, já que o processo é lento. “Quando elas entram com o pedido, demora cinco a oito anos para conseguir o registro. Quando elas (as empresas) conseguem a patente, a tecnologia, praticamente, já expirou”, disse.

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