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Polícia suíça começa a se abrir aos estrangeiros

Policiais patrulhando as ruas com um cachorro no centro da Basileia-cidade. Keystone

O debate sobre a admissão de policiais estrangeiros voltou às mídias. Enquanto muitos consideram impossível imaginar um policial alemão ou francês aplicando multas a suíços, Basileia-cidade já aceita há quase duas décadas pessoas com outros passaportes em suas fileiras. E se possível, as autoridades do cantão fronteiriço iriam contratar ainda mais.

Ele apenas propôs integrar estrangeiros na polícia da maior metrópole do país. Richard Wolff, chefe do Departamento de Polícia de Zurique, não esperava causar tanta polêmica ao fazer o balanço dos cem dias no governo, em meados de setembro. As críticas não demoraram a chegar.

Tanto representantes de sindicatos da classe, como políticos de várias cores, veem como problemática essa inclusão. “O trabalho de polícia é uma função de soberania nacional e deve ser exercida somente por pessoas com a nacionalidade suíça”, declarou Guido Müller, político do Partido do Povo Suíço (SVP).

Dois meses mais tarde, Wollf reconheceu que o tema é polêmico, mas defendeu a proposta. “A polícia deve ser o espelho da sociedade…O objetivo seria também ter agentes de pele escura fazendo controle. Possivelmente eles teriam mais compreensão com as pessoas que também têm outra aparência”, declarou em entrevista dada a um jornal dominical. O chefe de polícia, que também é político da Lista Alternativa, um partido de esquerda, anunciou ao mesmo tempo o lançamento de uma campanha de recrutamento de policiais intitulada “Diversity Management”. Seu principal objetivo é aumentar o número de mulheres, de policiais originários de Zurique – ou residentes na cidade – e os chamados “secondos”, pessoas de origem estrangeira, mas com a nacionalidade suíça. No cantão a lei ainda exige o passaporte vermelho.

Questionado se um policial alemão poderia dar multas a um suíço, Wollf reconhece que há problemas de sensibilidade. “Isso talvez fosse mais complicado do que um motorista de ônibus anunciando paradas no ‘bom alemão’. Porém acho que é uma questão de costume…Na Inglaterra vivi pela primeira vez o que significa quando a polícia é tão misturada como a população. Todos esses paquistaneses e pessoas do Caribe em uniforme…”, disse.

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“O cidadão não tem tempo de verificar a minha aparência”

Este conteúdo foi publicado em O quartel policial na Rua Clarastrasse 38 é o local de trabalho do jovem português de vinte e cinco anos. O uniforme azul, com o emblema do cantão de Basileia-cidade costurado nos ombros, lhe cai bem. No cinturão estão presas a pistola de serviço, luvas, uma lanterna, o equipamento de rádio e também um cassetete.…

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Ainda raro

Policiais estrangeiros ainda são uma exceção na Suíça. Como a segurança pública é de responsabilidade dos cantões (estados), as leis diferem em cada um deles. Atualmente, apenas Basiléia-cidade, Schwyz, Genebra*, Neuchâtel e Jura e aceitam pessoas com outros passaportes nas suas fileiras. A experiência é considerada muito positiva em todos eles.

Na Basileia-cidade, cantão localizado na fronteira com a Alemanha e França, uma revisão das leis em 1996 permitiu a admissão na polícia de estrangeiros com o chamado visto “C”, de permanência. (ler artigo “O cidadão não tem tempo de verificar a minha aparência”). Aproximadamente 700 agentes (570 homens e 130 mulheres) atuam na polícia local. Destes, 15 e 25 são estrangeiros. Eles são oriundos de países com Alemanha, Finlândia, Itália, Croácia, Holanda, Portugal, Espanha, Turquia e Hungria. Em grande parte são pessoas que cresceram na Suíça. O número varia anualmente, pois muitos deles se naturalizam durante ou após a formação como policial.

Para as autoridades locais, essa realidade só trouxe vantagens. “Vejo como uma grande chance para a nossa polícia cantonal. Em primeiro lugar, pois aumenta o número potencial de pessoas que podem se interessar pela profissão de policial. E também acho que polícia ganha em aceitação e fica mais próxima das pessoas”, declara Baschi Dürr, membro do governo cantonal e diretor do Departamento de Justiça e Segurança.

Polícia sobrecarregada

A admissão de estrangeiros na polícia é a resposta também a uma carência de mão-de-obra. A população aumentou para oito milhões de habitantes e as fronteiras abertas trouxeram novos desafios. Segundo as estatísticas, a criminalidade aumentou em 8,2% em 2012, registrando 750 mil delitos, com um aumento bastante acentuado em termos relativos de casos relacionados aos crimes provocados por estrangeiros. Ao mesmo tempo, a Suíça tem uma das menores densidades de policiais por habitantes na Europa. No total, os efetivos no país são de 17.141 policiais, o que corresponde a um policial para 469 habitantes. Na Alemanha é de um por 370.

Para os policiais suíços, a consequência do desenvolvimento é uma sobrecarga que transparece no número de horas-extras e faltas motivadas por doenças. “O país necessitaria ter pelo menos entre sete a quinze mil policiais adicionais”, defende Jean-Marc Widmer, presidente da Federação Suíça de Funcionários da Polícia.

Já Conferência Cantonal dos Diretores de Justiça e Polícia avalia que seria necessário contratar pelo menos 1.500 policiais. O número varia, mas a carência de mão-de-obra parece é óbvia. “Há uma necessidade clara de dez por cento a mais de policiais”, considera o coronel Gerhard Lips, chefe da Polícia cantonal da Basileia-cidade, justificando. “Além do aumento da população, hoje vivemos em uma sociedade que funciona vinte e quatro horas por dia. E a criminalidade se aproximou dos padrões europeus.”

Keystone

Procura de talentos

Em Basileia-cidade, as autoridades decidiram contratar mais 45 policiais até 2014. Porém o objetivo não é fácil de ser alcançado. “Estamos em competição com outros cantões na procura de talentos em um mercado limitado”, afirma Lips. Em um país com um baixo índice de desemprego, os jovens têm opções mais atraentes do que uma profissão considerada perigosa e cansativa com seus horários irregulares. Além disso, a imagem da profissão de policial sofreu alguns arranhões. “Existe hoje uma falta de respeito muito grande com o policial. É cada vez mais comum ser agredido no exercício das nossas funções”, acrescenta Jean-Marc Widmer, da Federação Suíça de Funcionários da Polícia.

Frente à dificuldade de preencher as vagas, as autoridades apelam até a campanhas no Facebook e outros canais. “Em breve teremos os bondes na cidade cobertos com os nossos anúncios. Eles mostram policiais verdadeiros falando da sua profissão”, conta Baschi Dürr. Uma das vantagens da polícia da Basileia-cidade é exatamente a abertura aos estrangeiros. “Destacamos como vantagem comparativa a possibilidade para os estrangeiros de se tornarem policiais no nosso cantão, o que não existe em grande parte do país”, lembra Lips, que considera a profissão “muito interessante e variada”.

Para o coronel Lips, que só utiliza o uniforme em eventos cerimoniais, um estrangeiro que atue como policial na Basileia não tem nenhum privilégio ou situação diferencial no seu trabalho. “O cotidiano do policial estrangeiro é exatamente o mesmo dos seus colegas suíços. A nacionalidade não é tema. Para os cidadãos é irrelevante saber qual o passaporte do policial. Talvez ele perceba algo através da cor de pele ou do nome de sonoridade estrangeira do agente”, explica.

Já o principal sindicalista policial não vê com bons olhos essa abertura. “Defendemos a admissão de estrangeiros somente nas escolas de formação de policiais. Ao concluir o curso, essas pessoas devem se naturalizar”, critica Jean-Marc Widmer. Em sua opinião, a solução para a dificuldade de arregimentar novos agentes pode ser resolvida através da melhora das condições de trabalho. Mas questionado sobre a oposição à abertura completa da profissão para estrangeiros, sua resposta é clara: “As leis são feitas na Suíça pelos suíços e devem ser aplicadas pelos suíços.”

* no cantão de Genebra a naturalização do estrangeiro deve ocorrer antes da conclusão do curso de formação de policiais.

A polícia da Basileia passou a aceitar estrangeiros a partir da revisão da Lei da polícia em 1996.

Aproximadamente 700 agentes policiais (570 homens e 130 mulheres) atuam na polícia do cantão de Basileia-cidade. Destes, 15 e 25 dos agentes são estrangeiros com o visto “C” de permanência. O número varia, pois muitos deles se naturalizam durante ou após a formação como policial.

Os estrangeiros vêm da Alemanha, Finlândia, Itália, Croácia, Holanda, Portugal, Espanha, Turquia e Hungria. Em grande parte são pessoas que cresceram na Suíça.

Além da Basiléia-cidade, outros cantões na Suíça aceitam estrangeiros nas suas fileiras: Schwyz, Neuchâtel, Genebra e Jura.

A segurança pública é de responsabilidade dos cantões na Suíça. No total, os efetivos policiais no país são de 17.141 agentes.

Não existe uma polícia federal na Suíça. A proposta de criá-la foi refutada nas urnas em um plebiscito ocorrido em 1978.

Porém existem tarefas policiais coordenadas em nível federal através do Departamento Federal de Polícia (Fedpol), um órgão criado em 2000. Ele não dispõe de agentes uniformizados.

Em estreita cooperação com as polícias cantonais, o órgão combate o terrorismo e seu financiamento, a criminalidade econômica, o crime organizado e assegura a proteção do Estado e a cooperação judiciária.

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