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Suíça comemora o Ano dos Habsburgos

Castelo dos Habsburgo em Brugg, no cantão da Argóvia (centro da Suíça). swissinfo.ch

A Casa de Habsburgo foi a dinastia que moldou a história européia como nenhuma outra. Poucos sabem que essa importante família teve suas origens modestas na Suíça.

Os suíços têm dois motivos para fazer de 2008 o Ano dos Habsburgos: há 900 anos surgiu o primeiro documento mencionando o nome da família, e, há 700 anos, ocorreu o assassinato do segundo rei dos Habsburgos na Suíça.

Para a maior parte dos europeus, os Habsburgos são a família que reinou durante séculos sobre o chamado Sacro Império Romano-Germânico. Este se tornou posteriormente o Império Austro-Húngaro e só terminou com o final da Primeira Guerra Mundial. Há 200 anos eles também sentavam sobre o trono espanhol e dominavam, por conseqüência, vastas faixas do continente americano.

Mas tradicionalmente essa dinastia sempre teve uma imagem negativa na Suíça. Na Idade Média, ela mantinha sob seu controle grande parte do que hoje forma o território suíço, entrando em conflito com comunidades independentes que lutavam para garantir a sua própria liberdade.

Com o passar dos anos, cada vez mais dessas comunidades se uniram e a Suíça gradualmente cresceu como uma confederação solta, no qual se incluíram as cidades-estado de Zurique e Berna, que tinham diferentes interesses para defender e assegurar.

Foi nesse contexto que os suíços entraram repetidamente em conflito com os Habsburgos, ganhando gradualmente controle sobre o que no passado chegou a ser considerado como a “terra-mãe” da dinastia.

A lenda de Guilherme Tell, que se recusou a aceitar os ditames do infame governador Gessler enviado pelos Habsburgos, é parte da identidade helvética. A cada ano se celebra a vitória decisiva contra os exércitos habsburguenses em Morgarten, Sempach e Näfels, ocorrida no século 19.

“A Casa de Habsburgo ajudou a formar a Suíça”, declarou a ministra da Economia, Doris Leuthard, durante uma cerimônia oficial para marcar o ano comemorativo. “Nós crescemos durante a resistência contra os Habsburgos”.

Outra vista

Porém esse é apenas um lado da medalha. Os organizadores do Ano dos Habsburgos esperam colocar em perspectiva as realizações da dinastia.

As celebrações são concentradas ao norte do cantão da Argóvia, onde os Habsburgos tiveram seu primeiro castelo e onde mantiveram a sua última faixa de território até 1797.

A pequena cidade de Brugg, próximo ao castelo original dos Habsburgos, está abrigando uma das várias exposições.

“Nosso objetivo é mostrar um trecho da história da Argóvia com a qual as pessoas estão pouco familiarizadas, pois os Habsburgos tendem a ser retratados como os maus na história suíça”, explica Peter Frey, um dos curadores da exposição. “As pessoas aqui na Argóvia aprendem a mesma versão da história como os outros habitantes do país. Por isso, eles têm um grande interesse em aprendê-la através de outra perspectiva.”

Os antepassados dos Habsburgos provavelmente são originários da Alsácia, mas no início do século 11 um deles, o conde Radbot, se instalou no local que hoje é Brugg e governava de lá. De acordo com a história, Radbot havia perdido seu falcão – “Habicht” em alemão – enquanto estava caçando. Ele encontrou-o em cima de uma colina, que parecia ser um local perfeito para a construção de um castelo. Ele o construiu e batizou-o como “Falcão”.

Mas 80 anos tiveram de passar até que o nome do castelo pudesse ser associado à família: a primeira menção foi em um documento de 1108, quando o conde Otto von Havichsberg juntou-se a uma campanha contra os húngaros.

Eles pertenciam originalmente à pequena nobreza, assim como várias outras famílias. Mas graças a uma combinação de habilidade e sorte, a dinastia conseguiu adquirir cada vez mais terras e poder. Em 1273, Rudolf von Habsburg se tornou o primeiro da família a ser eleito rei alemão, o governante supremo do Império.

Quando morreu em 1291, Rudolf havia conseguido obter grande parte do território do que é hoje a Áustria para a sua família, movendo o centro do seu poder para sempre rumo ao leste.

“Ele era um diplomata habilidoso, lutador experiente, uma personalidade carismática e um pragmático, ou seja, em outras palavras, tinha todas as qualidades necessárias para ser um político bem-sucedido”, diz Frey.

Os Habsburgos e os suíços

As pequenas comunidades na Suíça central, que queriam ter autonomia de governo, eram confrontadas com uma situação paradoxal. Somente o imperador poderia garantir-lhes a liberdade para dar esse passo, porém os Habsburgos, como latifundiários mais importantes na região, tinham interesse em reprimi-los.

Quando Rudolf morreu, as três comunidades rurais de Schwyz, Unterwalden e Uri fizeram um juramento de defesa mútua para o caso de que seu sucessor tentasse tolher-lhes a liberdade. Esse juramento é tradicionalmente visto como o ato de fundação da Suíça.

A sorte dos suíços é que o império não continuou automaticamente nas mãos dos Habsburgos. Albrecht, filho de Rudolf, se tornou rei da Alemanha em 1298, mas foi assassinado pelo seu sobrinho em uma disputa sobre herança em 1308. Quando os Habsburgos começaram a suceder uns aos outros, os suíços já haviam conseguido mais ou menos a expulsá-los dos seus territórios.

Porém, Frey joga água fria nas narrativas heróicas das vitórias suíças como descritas pelos cronistas do lado vitorioso.

“Ao ler a história da Suíça, você precisa sempre inverter os números. Um exército popular cujos membros podem ser convocados segundo as necessidades é sempre mais forte do que um exército de cavaleiros. Quando escutamos que 400 suíços bateram 1.500 soldados dos Habsburgos, a realidade é que, muito provavelmente, 1.500 suíços venceram 400 habsburgos. Você sempre ganha quando está na maioria.”

Além disso, a perspectiva da Suíça e dos Habsburgos era, de certa forma, diferente. Os Habsburgos foram extremamente bem-sucedidos em ampliar suas terras em direção ao leste. Manter as que eles tinham na parte ocidental se tornou com o tempo menos importante.

Quando, em 1415, os confederados helvéticos conquistaram a maior parte do que é hoje o cantão da Argóvia, incluindo o castelo dos Habsburgos, isso significou uma certa perda de prestígio, mas não mais do que isso.

“Era apenas um pequeno pedaço de terra que eles haviam perdido, de pouca significância”, analisa Frey. Já os habitantes da Argóvia deixavam apenas de ser governados pelos Habsburgos para cair sob o jugo de suíços.

Sobrevivendo

Depois de 1415, os Habsburgos ainda detinham a região suíça do Fricktal, ao longo do rio Reno. Um governante que apareceu muito mais tarde e que continua respeitado por lá: Maria Theresa (Theresia, em alemão), imperadora de 1740 a 1780. “Até bem pouco tempo muitas meninas do Fricktal eram batizadas de Maria Theresia”, conta Frey.

“As reformas que ela introduziu foram muito benéficas para a região. Por exemplo, ela introduziu o seguro obrigatório contra incêndios. Quando o Fricktal se tornou parte do cantão da Argóvia, em 1803, parte do acordo era que o seguro se tornasse também obrigatório em todo o cantão. Por isso, a Argóvia têm até hoje as franquias mais baixas de seguro no país. Afinal, os fundos têm sido investidos há duzentos anos.”

E os laços entre a Suíça e os Habsburgos continuam: os corações dos últimos membros coroados da dinastia, o Imperador Carlos I e sua esposa, Zita, estão enterrados na câmara mortuária da família no Mosteiro de Muri, fundado pelo distante ancestral de Carlos há mais de mil anos.

swissinfo, Julia Slater

Sacro Império Romano-Germânico ou Santo Império Romano da Nação Germânica (em alemão, Heiliges Römisches Reich Deutscher Nation; em latim Sacrum Romanorum Imperium Nationis Germanicæ), nome dado, a partir do século XV, ao império fundado por Oto I, o Grande, em 962 e dissolvido 1806 por Napoleão Bonaparte; é chamado também por vezes de Primeiro Reich. Consistiu na realidade dum conglomerado de estados da Europa ocidental e central, herdeiro de parte do império ocidental dos carolíngios, desaparecido em 924. Formado na alta Idade Média, o Sacro Império Romano-Germânico manteve-se por quase um milênio – até ser atacado e dissolvido durante a guerra com a França de Napoleão I. (Texto: Wikipédia em português)

963 D.C – nascimento de Guntram, o Rico, suposto fundador da dinastia.

1020 – construção do Habichtsburg, o castelo do falcão, sua morada oficial, na Suíça.

1027 – fundação do Mosteiro de Muri, no cantão da Argóvia.

1108 – o nome dos Habsburgos aparece pela primeira vez

1264 – os Habsburgos recebem territórios ao leste da Suíça

1273 – Rudolf I se torna rei alemão; conquista de territórios na Áustria

1291 – Rudolf morre

1308 – Albrecht I, filho de Rudolf, assassinado nas proximidades de Brugg

1309 – Königsfelden criado nas proximidades do local do assassinato: o local passa a ser utilizado pela família para enterro dos seus membros.

Século XIV – a Suíça expulsa gradualmente os Habsburgos.

1415 – a Suíça confisca as terras originais dos Habsburgos.

1483-1806 – Habsburgos comandam o Sacro Império Romano-Germânico

1504-1700 – Espanha (e territórios espanhóis no continente americano) é reinada pelos Habsburgos.

1806-1918 – Império Austríaco, subseqüentemente o Império Austro-Húngaro, governados pelos Habsburgos.

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