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“A Suíça quer participar das soluções globais”

O ministro suíço do Interior, Didier Burkhalter. Keystone

O convite feito aos mais importantes representantes da ciência helvética para a viagem ao Brasil também foi uma mensagem: Didier Burkhalter considera o país um ator imprescindível na solução dos problemas mais prementes do planeta.

Em entrevista à swissinfo.ch, o ministro suíço do Interior fala da vontade da Suíça em participar de uma iniciativa global pela saúde e de suas impressões do Brasil.

Durante a viagem de seis dias entre Brasília, Rio de Janeiro e São Paulo, membros da delegação suíça explicam aos interlocutores no Brasil alguns temas sob responsabilidade do Ministério suíço do Interior: saúde, cultura, igualdade, racismo, estatísticas, meteorologia, arquivos, educação, ciência e pesquisa.

Porém, nos diálogos com representantes da ciência brasileira, Didier Burkhalter mostra que estuda profundamente cada uma das suas pastas.

Durante a visita à Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) no Rio de Janeiro, ele se misturou aos cientistas dos dois países para escutar por várias horas os anseios do setor. Mas até o translado para esse famoso centro de pesquisa, cercado de florestas tropicais e algumas favelas, serviu como oportunidade para analisar alguns temas que o inquietam.

swissinfo.ch: Nesses primeiros dias no Brasil quais sãos suas impressões?

Didier Burkhalter: As impressões são como se tivesse vivido um ano, tão intensas elas foram. Mas, falando seriamente, a impressão é de estar frente a um dos gigantes desse mundo, um país enorme, que tem um potencial gigantesco, que emergirá dentre os países ditos emergentes e que, verdadeiramente, terá um papel fundamental nos próximos anos, seja no setor científico ou da saúde. Por consequência, minha impressão é que era muito importante para a Suíça estar presente aqui.

swissinfo.ch: O senhor propôs ao ministro brasileiro da Ciência e Tecnologia, Sérgio Machado Rezende, a criação de um “swissnex” no Brasil (n.r.: “embaixadas” científicas da Suíça para a promoção da cooperação científica). O que está por detrás dessa iniciativa?

D.B.: Nada se esconde por detrás disso, posso dizê-lo claramente. A Suíça simplesmente estima que deve estar presente nas discussões com os países que irão fazer o mundo, países que irão influenciar fortemente a evolução do mundo. A Suíça depende da evolução desse mundo e, portanto, quer estar presente nessa discussão. No que diz respeito aos meios, o setor da ciência e tecnologia é geralmente um setor-chave para a Suíça. Nós estamos no melhor dos mundos: somos um pequeno país nas primeiras posições em termos de ciência e tecnologia, de pesquisa fundamental e inovação. E, por consequência, podemos discutir com todos e, imediatamente, tendo um grande interesse. O objetivo é inscrever essa dinâmica – ciência e tecnologia – em uma parceria estratégica e, dessa forma, poder também ligar outros temas nos quais estamos possivelmente menos de acordo. É claro, para a Suíça não há nada a esconder. Trata-se da defesa dos nossos interesses, mas interesses que estão conectados às questões globais, nos quais também queremos ter um impacto.

Dessa forma, temos como instrumentos, em nível público, o lançamento desses acordos de cooperação com projetos concretos. Estes funcionaram muito bem. Agora vamos provavelmente renová-los, em breve, com uma nova licitação de projetos. Isso foi o que discutimos nos últimos dias. E pode haver também – isso é somente uma eventualidade – a decisão de implantar um “swissnex”, ou seja, uma casa suíça da ciência e tecnologia neste país, se constatarmos que é um elemento que se impõe. Isso será estudado por nós nos próximos anos. Você deve saber que, há algum tempo, temos swissnex nos Estados Unidos. Recentemente na Índia que será aberto em breve. Temos um na China, um em Cingapura, ou seja, no total são cinco no mundo. Nós podemos imaginar nos próximos anos que em países como o Brasil, se justifica abrir uma instituição semelhante.

Mas isso é apenas um instrumento. Nós teremos de ver qual é o mais adequado. Creio que não é indispensável ter uma rede diplomática da ciência, se os institutos suíços de pesquisa e as universidades conseguem fazer seus contatos e ter seus projetos diretamente. Penso que, no caso do Brasil, que isso é possível, ou seja, o contato direto é muito bom. Sentimos a possibilidade de reforçar esses contatos sem a necessidade de ter mais um intermediário diplomático.

swissinfo.ch: Com relação à Organização Mundial da Saúde (OMS), o governo suíço declara apreciar o apoio do Brasil para entrar no comitê executivo. Até que ponto os governos estão juntos nessa empreitada e têm planos conjuntos? A Suíça precisa da ajuda do Brasil?

D.B.: Não, a Suíça não necessita do Brasil. Não é o Brasil, mas sim a zona Europa que vai votar sobre a candidatura atual da Suíça para entrar no comitê executivo da OMS. Em contrapartida, se ou quando estivermos no comitê executivo da OMS – uma decisão que saberemos rapidamente, pois será tomada no mês que vem – então desejamos agir em prol de uma OMS de governança é mais clara, uma OMS que prioriza suas atividades de uma organização mundial da saúde, que clarifique suas relações com os diferentes parceiros, incluindo também o setor privado, e que seja, enfim, mais eficaz. E, para isso, constatamos que, no fundo, temos as mesmas intenções do Brasil. Não procuramos ter apoio para a candidatura da Suíça, mas sim apoio para de esforços conjuntos de política geral, global e que seja favorável à Suíça, ao Brasil e ao resto do mundo.

swissinfo.ch: Seria o interesse de criar uma iniciativa global pela saúde. A Suíça teria interesse de participar dessa iniciativa?

D.B.: Sim. A Suíça sempre considerou muito importante ver a saúde não como um problema somente nacional, mas global. Sabemos que esses problemas ultrapassam as fronteiras. Muitas questões estão ligadas com o que ocorre internacionalmente em termos de saúde. Por isso, consideramos esse ponto importante. Inclusive, temos ações concretas como cursos oferecidos pelo Instituto de Altos Estudos Internacionais e do Desenvolvimento (IHEID), em Genebra. Nesse sentido, a Suíça marcou sua posição e reforçou uma atividade que já existia anteriormente.

swissinfo.ch: O senhor inovou com essa fórmula de uma grande delegação, que viaja com um conselheiro federal (ministro). Qual é o objetivo?

D.B.: A delegação é grande, de fato, pois acredito que a Suíça pode marcar pontos no exterior, nas suas relações com o resto do mundo, se ela se destaca no que é melhor. Nosso país é bom nas áreas da ciência, da tecnologia, da inovação e na capacidade de encontrar soluções. A isso se acrescenta o fato de que o mundo, e não apenas a Suíça, está sendo confrontado com grandes problemas que englobam o meio ambiente, a energia e a saúde. E nisso não apenas precisamos – como devemos – participar das soluções globais.

swissinfo.ch: E é por isso que o senhor se preocupou em ter em sua comitiva todos os responsáveis da ciência na Suíça?

D.B.: Pensamos ser absolutamente necessário integrá-los. Não é que eles simplesmente me acompanhem, mas espero que vivam plenamente essa viagem. Além disso, penso que são eles que fazem o sucesso da Suíça. Juntos, o setor público, que está conosco também, e o setor privado, fazem o sucesso da Suíça em termos de ciência e tecnologia. Enfim, é como um sistema de retransmissores: se fazemos a primeira transmissão e, depois, se os contatos ocorrem de forma bem-sucedida, então são as pessoas dessa delegação, seja do setor público ou privado, que darão a continuação à corrida e que irão ganhá-la pela Suíça e pelo mundo.

swissinfo.ch: O senhor está no Brasil como ministro da Ciência e Formação. Fala-se que as chances na Suíça de reagrupar a formação em um grande departamento serão melhores em breve, pela sua própria visão do tema…

D.B.: Todo o Conselho Federal (n.r.: grêmio de sete ministros que governa a Suíça) já exprimiu seu desejo em relação a isso, já que o Parlamento regularmente o lembra. Pessoalmente eu sempre disse, mesmo antes da minha eleição ao Conselho Federal, que era necessário se colocar a próxima questão: quais são as prioridades para a Suíça e, portanto, para seu governo, nos próximos 20 a 30 anos. E para mim é claro que o futuro da Suíça depende da sua forma de continuar no mais alto nível em termos de ciência, educação, pesquisa e inovação. Se colocarmos tudo em um só departamento (ministério), sinalizaremos claramente que isso se tornou uma prioridade.

swissinfo.ch: Com relação ao problema dos custos crescentes do sistema de saúde na Suíça, será que países como o Brasil poderiam servir de exemplo? Afinal, países em desenvolvimento, com recursos limitados de orçamento, conseguem às vezes proezas como uma bem-sucedida campanha de vacinação contra a gripe suína. Na Suíça, ela não ocorreu tão bem assim…

D.B.: Não creio verdadeiramente. É obvio que no contexto da campanha pela vacinação no Brasil existia uma espécie de abertura a essa vacinação, o que não ocorreu na Suíça. Se procurarmos mais essa abertura, talvez exista algo a aprender. Porém, não estou seguro de que poderemos aplicar os métodos brasileiros no nosso país.

Em contrapartida, precisamos ter a realidade em mente quando discutimos sobre a saúde. Vivemos em um país onde o sistema de saúde é caro, mas também excelente. Aqui no Brasil acabamos de passar por favelas, distantes apenas alguns quilômetros desse centro de pesquisa (n.r.: a Fundação Oswaldo Cruz, no Rio de Janeiro). Basta viajar um pouco pelo Brasil para ver até que ponto as desigualdades ainda são grandes na área de saúde, educação e formação. É um país grande, emergente e que está crescendo, mas com muitos problemas ainda. Eu não gostaria de trocar a situação da Suíça pela do Brasil no domínio da saúde. A isso se acrescentam doenças que pouco conhecemos, doenças extremamente graves e que atingem zonas e populações do Brasil particularmente pobres. Nesse sentido, ainda há muito trabalho.

Mas os custos (do sistema de saúde) irão aumentar ainda mais na Suíça. O que precisamos é ter os custos sob controle, sabendo que queremos sempre ter mais qualidade e o melhor tratamento. Como queremos ter a melhor situação no mundo, nós sempre teremos uma pressão pela alta dos custos. O que é inaaceitável é que esse aumento não revele sempre a melhor qualidade. É nisso que estamos trabalhando: aumentar a eficácia, permitir um melhor tratamento sem, necessariamente, mais custos, mais medicamentos quando não é necessário e encontrando a melhor solução. Isso passa particularmente por uma melhor coordenação do tratamento, o que explica a existência do projeto das redes de tratamento integrado que tentamos apoiar no Parlamento, para que este o compreenda melhor.

Alexander Thoele, Rio de Janeiro, swissinfo.ch

O ministro suíço do Interior também cuida das pastas de cultura, ciência e tecnologia e saúde.

Ele nasceu em 17 de abril de 1960 no cantão de Neuchâtel (oeste da Suíça).

O político do Partido Liberal-Radical (PLR, na sigla em francês) era senador até sua eleição, em 16 de setembro de 2009, para o Conselho Federal, o órgão executivo do país, composto de sete ministros.

Burkalter é formado em economia pela Universidade de Neuchâtel.

Segundo seu currículo oficial, o ministro também é oficial de reserva do exército, no setor de imprensa e rádio.

Como hobbies, ele declara gostar de esportes, sobretudo futebol, esqui e caminhadas.

Também lançou, na primavera de 2007, um livro intitulado “La Maladière – um sentimento de eternidade”, sobre a reconstrução do principal estádio de futebol da cidade de Neuchâtel.

De 1988 a 1990, Burkhalter foi vereador na comuna de Hauterive (cantão de Neuchâtel)

De 1991 a 2005, foi membro do governo executivo da cidade de Neuchâtel.

De 1990 a 2001, foi deputado estadual (Neuchâtel)

De dezembro de 2003 a dezembro de 2007 foi deputado federal.

De 2007 a 2009 foi senador.

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