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“Eles querem comer”

Kim Jong-un, o "grande sucessor", quando era aluno de uma escola de Berna. Keystone

Após a morte do líder norte-coreano Kim Jong-il, um especialista em segurança da Suíça diz à swissinfo.ch porque todos os olhos estão voltados para a ditadura totalitária.

Albert Stahel, professor de estudos estratégicos do Instituto de Ciência Política da Universidade de Zurique, diz que muita coisa depende agora da aceitação pelos generais do país do herdeiro do ditador, o jovem Kim Jong-un, que teria estudado na Suíça.

Os governos ao redor do mundo acompanham a morte de Kim Jong-il, que controlou de forma autoritária a Coreia do Norte durante 17 anos, com um certo otimismo cauteloso: um momento possivelmente desestabilizador para a região, com a mudança de poder para seu filho, mas também uma oportunidade para um novo começo diplomático.

Até agora, o comportamento da Coreia do Norte tem sido notoriamente turbulento, o que torna difícil prever o curso a ser tomado daqui para frente. A Coreia do Sul, preocupada com a incerteza em relação ao desconhecido Kim Jong-un, colocou seus militares em alerta máximo contra as forças armadas do Norte.

swissinfo.ch: A primeira reação de muitas pessoas foi considerar como boa notícia o fato de termos um ditador a menos no mundo, mas depois perceberam que Kim Jong-un pode sentir a necessidade de provar a si mesmo, ameaçando a estabilidade da região. O que o senhor acha?

Albert Stahel: Estão substituindo um ditador por outro – olhe a situação do Egito com a família Mubarak, os Gaddafis [na Líbia] ou os Assads na Síria. Não há estabilidade nenhuma. É possível que a situação tome um rumo ruim.

swissinfo.ch: Como isso pode ser comparado às mudanças no mundo árabe?

AS: Não é a mesma coisa. Aconteceu algo como uma revolução na Tunísia, algo como uma insurreição na Líbia – que recebeu a ajuda principalmente dos franceses e dos ingleses – e no Egito ainda tem generais e a Irmandade islâmica querendo o poder. Na Síria, tem a influência de diferentes países como Irã, Turquia e Arábia Saudita.

swissinfo.ch: O senhor não acha que os norte-coreanos vão ver isso como uma oportunidade e um impulso para a liberdade?

AS: Eles querem comer. Essa é a principal prioridade deles. É tão simples como isso.

swissinfo.ch: Se a Coreia do Norte se abre, exite uma burocracia que poderia ajudar a manter o país funcionando?

AS: Tudo depende realmente de como vai se passar a sucessão. Se houver dúvidas no seio do exército – porque o filho não fez carreira militar – então haverá a possibilidade de uma disputa entre os generais.

swissinfo.ch: A China é um importante aliado da Coreia do Norte e Pequim disse que iria continuar oferecendo seu apoio e suas “contribuições ativas para a paz e a estabilidade” na região. A China está preocupada com a rápida mudança?

AS: Os chineses estão preparados para a deterioração da situação na Coreia do Norte. O exército chinês se move para o norte da Coreia do Norte porque há um grande número de refugiados indo para a China. 30% da província chinesa na fronteira com a Coreia do Norte são de fato coreanos.

Assim, os chineses assumiriam o controle de provavelmente metade da Coreia do Norte e também das armas nucleares – porque essa é uma situação muito perigosa. A China também gostaria de agir antes dos russos, que também estão interessados na situação da Coreia do Norte.

swissinfo.ch: A respeito de armas nucleares, a morte de Kim ocorre num momento complicado para Barack Obama, que está pesando na possibilidade de voltar a discutir a questão com Pyongyang. Ele deveria?

AS: Bem, isso é a longo prazo. Se houver uma estabilização na Coreia do Norte, então é claro que se poderia voltar às discussões sobre as armas nucleares. Mas no momento, a situação da Coréia do Norte é mais importante.

Se a situação se deteriora e a China invade o país, o problema também passa a ser então da Coreia do Sul e, claro, dos Estados Unidos, porque haverá refugiados na Coreia do Sul. De modo que também poderíamos nos perguntar como é que a Coréia do Sul vai reagir e se os Estados Unidos vão concordar com uma invasão do exército sul-coreano na Coreia do Norte.

swissinfo.ch: Como é que vai ficar a relação entre as Coreias?

AS: No momento ela não vai mudar muito. O sistema continua muito fechado, com uma verdadeira nomenclatura herdada do sistema soviético cujo único objetivo é sobreviver, manter seus privilégios e todas as coisas boas que possuem, dinheiro, etc. Isso não vai mudar.

swissinfo.ch: Em 2008, a Suíça havia decidido suspender a ajuda ao desenvolvimento no final de 2011. Essa decisão deve agora ser reexaminada?

AS: Na minha opinião, o governo suíço deve esperar e ver como a situação da Coreia do Norte evolui, antes de tocar qualquer programa de cooperação.

swissinfo.ch: O senhor está otimista com o futuro da Coreia do Norte?

AS: Eu tenho mais tendência a ser pessimista. Este rapaz tem agora que se mover [no poder] com a proteção dos generais. Poderia ser OK, mas poderia haver um monte de problemas.

A Suíça, juntamente com a Suécia, é membro da comissão de fiscalização que garante a aplicação do armistício entre as duas Coreias.

No rastro da fome dos anos 1990, a Suíça foi um dos primeiros a oferecer ajuda humanitária.

E quase sozinha entre os doadores, que posteriormente transformou seu compromisso humanitário em um programa de desenvolvimento a longo prazo. O programa é executado pela Agência Suíça para o Desenvolvimento e Cooperação.

Grande parte do programa era especificamente orientado para melhorar a produção agrícola, mas também se destinava a integrar a Coreia do Norte na comunidade internacional.

A ajuda ao desenvolvimento suíço foi fortemente criticado no parlamento e deve acabar depois de 2011.

Adaptação: Fernando Hirschy

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