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“Não nos contam tudo”

Capa do livro de Didier Bonvin. SP

“Teoria do complô”: o conceito já está banalizado, incluindo desde os delírios da imaginação até questionamentos legítimos.

Uma leitura do livro que acaba de ser publicado de autoria do jornalista francês Didier Bonvin “As teorias do complô invadem a web”.

Em nossa época, o grande dazibao, o grande mural onde pode-se colocar suas opiniões, seus humores, suas decepções, é a internet. Ninguém se priva e tem até concorrência.

Encontra-se de tudo: coisas boas, generosas, emocionantes, transparência e até, de vez em quando, inteligentes. Mas, frequentemente, bobagens, o horrível, demente, ou, pior ainda, a intoxicação. Esses são os documentos colocados à disposição de qualquer usuário de computador, ou seja, quase todo mundo.

Milhões de heréticos

É por essa razão que quando, sobre minha mesa, o livro de Didier Bonvin, publicado recentemente pelas Edições Favre, em Lausanne, “As teorias do complô invadem a web”, não resisti. Tenho que confessar que, se uso a internet como todo mundo, continuo muito desconfiado do conteúdo que se pode descobrir. Desconfiado, mas curioso apesar de tudo.

O que Didier Bonvin escreve em sua “introdução 2.0” me parece certo e salutar: “Estranha época em que o discurso oficial é palavra de Evangelho. Os que duvidam, os que ousam questionar são heréticos. Classificados instantaneamente no campo dos conspiradores ou doentes mentais. Eles merecem ser queimados na fogueira midiática”. Depois de tais apóstrofos, é difícil não se questionar.

Doravante, frente às derivas da imprensa e de outras mídias que não se preocupam mais em investigar e informar, há uma verdade única: a oficial. As demais são qualificadas de complô. Daí era de se esperar essa explosão de teorias loucas, as menos confiáveis, as mais malucas.  

Lendo o livro de Didier Bonvin, você saberá tudo acerca das enganações da informação oficial. Por exemplo, que os extraterrestres estão entre nós há muito tempo e que eles passaram, sem que soubéssemos, um acordo com certos governos; que conspiram para nos matar de fome e que o aquecimento climático é uma grande mentira de conjurados cientistas. A lista é maluca e, sobretudo, muito longa.  

Em quem acreditar?

O autor acrescenta ainda: “Estranha época em que o direito de questionar não existe mais (…) A mídia, em grande maioria, abandonou a investigação e a reflexão. Transformaram-se em mudos e dóceis porta-vozes de marcas, de grandes instituições financeiras e de governos. O lugar de resistência e de liberdade de expressão se deslocou para a internet. O direito de dúvida também”. Portanto, de acordo com Didier Bonvin, só restaria ao honesto cidadão afiar seu senso crítico e não considerar verdade tudo o que encontra na web.

Finalmente, isso não é uma excelente notícia? Comportemo-nos como adultos responsáveis, com discernimento.

A partir dessa constatação, cabe perguntar em quem se pode confiar. Também é difícil levar em conta todas as teorias que falam de complôs que surgiram desde a criação da internet ou, em todo caso, desde que um amplo público teve acesso a essa extraordinária rede eletrônica mundial.

Você disse “complô”?

Para muitos entre nós, o termo “teoria do complô” é vago. Então é preciso explicar do que se trata. Na verdade, é simples. Basta duvidar de uma verdade, que ela seja oficial ou formulada por um grupo de pessoas e, a partir dessa dúvida, de lançar publicamente um rumor para que surja o que se chama uma teoria do complô.

Atualmente e graças à internet, existem milhões dessas teorias e a respeito d tudo. Mesmo se através da História, o questionamento da palavra oficial não é novo, atualmente a incredulidade atingiu níveis jamais registrados no passado.

Claro que as invenções não datam de ontem, bem como a mentira de estado ou a intoxicação pela propaganda política. Todas as sociedades humanas conheceram esse tipo de mentira e de manipulação. Nada de muito novo em nossas existências.

O que é interessante, e concordo com Didier Bonvin, é que desde o 11 de setembro de 2001 e a destruição das duas torres em Nova York, o fenômeno tomou proporções extraordinárias. Aumentou ainda mais com a criação de WikiLeaks, o revelador de segredos (muito mal) protegidos.  

Efeitos de um sistema

Pode-se perguntar o porquê de uma tal denegação a respeito da informação e das ideias. Nossos dirigentes políticos, nossos empresários, nossos criadores, teriam uma linha invisível, uma espécie de fronteira, entre o que é aceitável e o que não é mais? É perfeitamente possível.

Devido ao fato que a imagem de si mesmo e a dos outros conta muito mais do que o pensamento e a reflexão, à força de transformar tudo em espetáculo, teríamos ultrapassado o limite, o ponto de equilíbrio que tornava as sociedades cegas e crédulas.

Será que o materialismo exagerado não teria levado à arrogância de alguns que, de repente, teria tornado insuportável a muitos outros? De real, essa fratura social, cara a muitos discursos demagógicos, tornou-se virtual invadindo a internet.

Em uma época conturbada, como a que todos vivemos, a legibilidade do mundo tornou-se mais difícil. Saímos de um universo formado e compreensível para entrar em uma nova era que nos parece desconhecida, talvez angustiante.

O que está em jogo nessas grandes reviravoltas é a busca de uma nova verdade, de uma pureza por vir, de uma honestidade a reconquistar. Isso explica, estou convencido, essa dúvida global e geral.

Como diria Anne Roumanoff  no palco: “Não nos contam tudo!”

“As Teorias do complô invadem a web”, com o subtítulo “Do 11 de setembro a Wikileaks: a era da duvida”, por Didier Bonvin, Editora Favre, 160 páginas.

 

Apresentação do editor: desde a criada da web, verdadeira caixa de ressonância mundial do rumor, as teorias conspiratórias se multiplicam, fascinam e semeiam a dúvida. Pode-se realmente acreditar nas informações oficiais? Os atentados de 11 de setembro não são uma mascarada gigantesca? Quem tira proveito de pandemias do tipo gripe H1N1? Por que querem destruir o fundador deWikiLeaks? O que está por trás do secreto projeto HAARP? Entre informação e intoxicação, uma enquete que incomoda.

Didier Bonvin, jornalista, cronista de rádio e TV, colaborou com vários jornais na França e na Suíça.

É organizador do Conspiracy Film Festival, o primeiro festival do gênero divulgando filmes da web ligados ao tema da conspiração. Trabalha atualmente para televisão.

Adptação: Cludinê Gonçalves

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