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“Somos testemunhas da esquizofrenia”

Já conhecido da imprensa mundiao: José Bové participa do FSM em Bombay, Índia. Keystone Archive

José Bové considera o Fórum Econômico Mundial de Davos como um clube privado que fala em abrir mercados, mas que se esconde atrás de uma ampla proteção militar.

O ativista francês concede entrevista exclusiva à swissinfo durante o Fórum Social Mundial de Bombay, na Índia.

Um dos líderes do movimento antiglobalização, José Bové é um personagem crítico e comunicador. Como dirigente da Federação de Agricultores Franceses e da “Via Campesina”, ele nunca passa despercebido. Como em todos os anos, o ativista francês participa do Fórum Social Mundial, que nesse ano ocorre em Bombay, na Índia.

Como fiel participante dos fóruns anteriores em Porto Alegre, como você vê o encontro do Fórum Social Mundial em Bombay?

Eu vejo o encontro como uma formidável mostra de mobilização popular. Destaco particularmente a riqueza dos movimentos sociais aqui presentes, assim como a sua vitalidade.

Bombay e Porto Alegre não seriam universos diferentes?

A diferença mais notável está, sobretudo, no tipo de debate que ocorria em Porto Alegre, considerado mais “intelectual”. Aqui na Índia os grupos que se apropriaram do Fórum são os movimentos sociais e a gente que vive e que trabalha diretamente no terreno. Ademais, o fato do evento estar se realizando em Bombay nos dá uma imagem bastante aproximativa da Índia, que é um exemplo bastante sintomático e demonstrativo dos efeitos nefastos da globalização.

De Bombay a Davos, da Índia para a Suíça. Qual a sua reflexão sobre o Fórum Econômico Mundial de Davos?

Somos testemunhas novamente dessa espécie de esquizofrenia, desse medo. Vemos um clube privado que fala em abrir o mundo ao mercado, sendo porém obrigado a esconder-se, proteger-se e militarizar-se ao máximo. Com essa forma de funcionamento, eles demonstram muito bem o mundo que eles querem. Quanto mais eles se militarizam, mas razões nós temos para continuar a nossa luta.

Quais são as prioridades do movimento altermundialista?

Queremos consolidar o espaço do Fórum Social Mundial, que é fundamental e que permite abrir o debate e demonstrar a realidade do mundo. Pretendemos também fortalecer nossa capacidade de pressionar os países, a Organização Mundial do Comércio (OMC) e outras instituições multilaterais. Vejo duas estratégias: ação-forum-debate, por um lado, e ação-pressão sobre nossos governos e instituições multilaterais, por outro.

Em apenas três anos, foram celebradas quatro edições do Fórum Social Mundial. Ao mesmo tempo se observou uma crescente participação popular em debates econômicos, sociais e de desenvolvimento. O que significa isso?

Isso significa que a resistência existe, que se manifesta no mundo inteiro. A prova pode ser encontrada aqui, durante o Fórum Social Mundial. O movimento está crescendo e se desenvolvendo. Ao mesmo tempo, as alternativas que propomos concernem tanto assuntos locais como internacionais. Existe uma riqueza, uma quantidade enorme de coisas que ocorrem e que representam uma esperança de diversidade no mundo. Nesse sentido, não creio muito no slogan “Outro mundo é possível”, mas sim num slogan plural: – “Outros mundos são possíveis”. Porque não creio que seria bom um mundo único para substituir aquele onde já vivemos.

O que o movimento altermundialista necessita, na sua opinião, para continuar avançando?

Não sei o que falta. A questão consiste em demonstrar que podemos oferecer alternativas e que existe uma sociedade civil organizada capaz de fazer propostas. Todavia, hoje nós já conseguimos ser incluídos no processo de tomada de decisão internacional, discutindo mesmo nível dos governos internacionais e do poder econômico. Evidentemente, a sociedade civil influi em todas as áreas do processo econômico e político em escala mundial. É importante que encontremos os meios para que o nosso espaço, nosso aporte, seja mais reconhecido em âmbito institucional.

Nesse sentido podemos ter complicações, pois dentro do nosso movimento temos muitas reticências internas. Ao mesmo tempo, acreditamos que teremos mais oposição externa. Com vistas ao futuro, temos uma questão: saber se vamos assumir esta responsabilidade também no terreno institucional, o que inclui também se sentar e comer com o mesmo diabo.

swissinfo, Sergio Ferrari em Bombay
tradução de Alexander Thoele

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