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2022: Suíça buscando a si mesma

Bandeira em cima de uma cúpula
Bandeira da Suíça em cima da cúpula do Palácio Federal, o prédio que abriga o Parlamento e o governo federal do país em Berna. sda-ats

Proteção do clima, dos animais e da juventude: em 2022 a política interna estará no centro das atenções. Já nas relações exteriores, a Suíça precisa encontrar um equilíbrio entre seu papel de mediador e o isolamento na Europa. Análise de um ano que está por começar.

A agenda do eleitorado já está repleta em 2022: a primeira bateria de plebiscitos federais ocorre em 13 de fevereiro. O eleitor decide sobre quatro temas: duas iniciativas populares (n.r.: projetos de lei levados às urnas após o recolhimento de um número mínimo de assinaturas) propõe a proibição da publicidade de tabaco e testes em animais. Já dois referendos pedem a escolha do eleitor: subsídios para a mídia nacional e imposto sobre grandes empresas a nível federal e o fim de um imposto incidindo sobre grandes empresas.

O ano deverá estar marcado pelo debate sobre a proteção do clima. Quatro iniciativas populares ainda devem ser avaliadas pelo Parlamento e, portanto, têm a maior chance de chegar a uma votação: dessas, três estão relacionadas ao meio-ambiente. A quarta, proposta por partidos de esquerda, pede uma redução nos prêmios de seguro saúde para a classe média.

Depois da rejeição do projeto da Lei de CO2 em junho em um plebiscito federal, o próximo plebiscito traz uma iniciativa intitulada “Em prol das Geleiras” exige o fim das emissões de gases de efeito estufa e uso de combustíveis fósseis até 2050.

Porém a questão dos custos pode ser um elemento que irá, mais uma vez, frustrar os esforços dos ambientalistas para acelerar a revolução energética a fim de alcançar os objetivos do Acordo de Paris.

Agricultura extensiva

A agricultura também está na agenda de 2022. Como os dois projetos de lei contra pesticidas rejeitados no ano corrente, a iniciativa contra a agricultura extensiva divide os campos. A maioria dos entrevistados teme que a carne se torne inacessível, pois a lei impõe novos regulamentos ao setor. 

Porém muitos agricultores defendem práticas mais ecológicas, especialmente em termos de proteção aos animais. Eles são apoiados por organizações ambientais que consideram um “absurdo” a importação de milhares de toneladas de ração do Brasil a cada ano, contribuindo para a destruição da floresta tropical.

Outra iniciativa propõe frear as atividades da construção civil para impedir que também as zonas rurais da Suíça se urbanizem excessivamente. Anualmente cerca de duas mil novas construção são erguidas fora das zonas designadas, contribuindo para a expansão urbana há muito denunciada pelas associações de proteção à paisagem. O tema é sensível ao eleitorado, como mostrou a aprovação de uma proposta de lei que reduziu a construção de casas de veraneio no país.

Divisões na esquerda

Os partidos políticos começam também a se preparar para as eleições federais de 2023. É provável que a batalha pela supremacia entre a esquerda chegue ao seu ápice. Como a quinta força política mais forte do país: o Partido Verde (PV), que tem 13,2% do eleitorado segundo uma pesquisa de opinião realizada pela SRG SSR.

Os ecologistas já reclamam um assento no Conselho Federal (n.r.: o corpo de sete ministros que governa a Suíça) em detrimento do Partido Socialdemocrata (SP, 15,8%), Partido Liberal (PL, 13,6%) e o Partido de Centro (PC, 13,3%). Como principais concorrentes, o PV tem os sociais-democratas na mira, tanto que lançaram no mesmo dia uma iniciativa para criar um fundo de proteção ao clima com conteúdos quase idênticos.

O PS tenta agora superar o PV em uma de suas questões favoritas: a previdência social. Portanto anunciam apoio ao referendo lançado pela Federação Suíça de Sindicatos (SGB, na sigla em alemão) contra a última reforma do Seguro de velhice, sobrevivência e invalidez (AHV-AVS/IV-AI, 1.º pilar), que prevê um aumento da idade de aposentadoria para as mulheres de 64 a 65 anos. A votação pode ocorrer em outono de 2022, um ano antes das eleições federais.

O Partido do Povo Suíço (SVP) costuma ter como principal “cavalo de batalha” a redução da imigração para a Suíça. Porém em 2022 continuarão a se opor às medidas de combate a pandemia aplicadas pelo governo para mobilizar o eleitorado. E isso apesar da situação precária nos hospitais do país e duas derrotas em plebiscitos relacionados à Lei do Covid 19 nos últimos meses.

Com 26,6% dos assentos, o maior partido do país atacará mais uma vez o sistema público de rádio e televisão. O projeto de lei que levarão às urnas em 2022 pede uma redução de 50% das taxas de radiodifusão. Há três anos sua proposta de redução integral (a iniciativa “No Billag”) já havia sido rejeitada pelo eleitorado. A nova proposta parece ser muito mais perigosa para Sociedade Suíça de Radiodifusão e Televisão (SRG SSR), da qual a swissinfo.ch faz parte. Muitos partidos já não defendem incondicionalmente o sistema público. 

Questão europeia

O ano próximo também será importante para a política externa. Além de pleitear um assento no Conselho de Segurança da ONU, o país alpino também quer continuar a oferecer seus bons ofícios para reduzir as tensões geopolíticas entre Rússia, China e EUA. Porém um dos seus mais importantes dossiês está bloqueado: as relações com a União Europeia.

Chega 2022 e a questão ainda está aberta. Em maio, o Conselho Federal interrompeu as negociações de sete anos para firmar um acordo-quadro com a UE. Agora o país quer voltar à mesa de negociações.

Mas não está sendo fácil. Um encontro entre o ministro suíço das Relações Exteriores, Ignazio Cassis, e o vice-presidente da Comissão Europeia, Maroš Šefčovič, terminou com desacordos. A UE esperava que a Suíça apresentasse um roteiro para as negociações na próxima reunião do Fórum Econômico Mundial (WEF), em janeiro, o que não ocorreu. O importante congresso nas montanhas de Davos foi adiado devido à pandemia, o que não facilita a encontrar uma solução ao impasse.

O tempo, no entanto, se esgota e a pressão da União Europeia aumenta. O bloco pretende tratar a Suíça como um país terceiro no programa de pesquisa “Horizon Europe”, o que prejudica a ciência helvética.

Em novembro, a comissão de Relações Exteriores do Conselho Nacional (Câmara dos Deputados) propôs em novembro resolver o impasse através da proposta de repassar bilhões aos fundos de coesão da UE. Foi um ato de desespero e que não encontrou uma maioria entre os parlamentares, mas que documenta a impotência do lado suíço. O ministro da Economia, Ueli Maurer, considerou a proposta fadada ao fracasso.

O Conselho Federal colocou agora na mesa de negociações o ex-secretário de Estado para as Migrações, Mario Gattiker. Sua missão é analisar as diferenças legais que envolvem a livre-circulação de mão-de-obra e de apurar como as leis suíças devem se adaptar ao aparato legal da UE, com apoio do eleitorado. A estratégia provável é de tentar negociar o acordo por partes, o que não deve encontrar aceitação em Bruxelas.

Momento da diplomacia

Também em 2022, a Suíça quer atuar no cenário internacional. Dentre outros, irá organizar negociações para a Ucrânia na cidade de Lugano, onde Ignazio Cassis – também originário do cantão italófono – receberá o chefe de estado ucraniano Volodymyr Selensky. Uma boa oportunidade para o ministro suíço das Relações Exteriores de melhorar a sua imagem um ano antes das eleições federais, arranhada segundo as últimas pesquisas de opinião.

Entretanto analistas já questionam a possibilidade de sucesso para a reunião às margens do lago, cujo principal objetivo é ajudar a Ucrânia a manter sua independência e apoiar seus esforços de reforma. O posicionamento de tropas russas na sua fronteira no final do ano coloca em risco nas negociações.

Nova estratégia mundial

A pandemia de Covid-19 continuará a dominar a agenda das organizações internacionais em Genebra em 2022, especialmente da Organização Mundial da Saúde (OMS), que coordena a estratégia internacional de combate ao vírus. 

Frente à pressão por mudanças, a OMS terá em maio um congresso para os estados-membros com o objetivo de firmar um novo plano. 

A Organização Mundial do Comércio (OMC) também tem um papel na luta contra a pandemia: um dos pontos mais polêmicos é a questão da renúncia de patentes sobre vacinas e tratamentos para permitir que os países mais pobres também possam combater o vírus.

Direitos humanos continuam sendo um tema central em Genebra. Na agenda de 2022, o Conselho de Direitos Humanos da ONU deve discutir a situação alarmante no Afeganistão, Mianmar e Síria.

China:  Michelle Bachelet, Alta Comissária para os Direitos Humanos da ONU, ainda espera que Pequim autorize sua visita à província de Xinjiang – enquanto o governo chinês continua a negar a existência de campos de reeducação e trabalho forçado.

Finalmente, o Comitê Internacional da Cruz Vermelha (CICV), a mais famosa organização humanitária da Suíça, nomeou pela primeira vez uma presidente: Mirjana Spoljaric Egger, que toma posse em setembro de 2022.

Analistas consideram como certas as chances de a Suíça conquistar um assento no Conselho de Segurança. Em junho, a Assembleia Geral da ONU em Nova York elegerá cinco dos dez membros não permanentes para os anos 2023 e 2024. Há apenas um outro candidato, Malta, para os dois assentos que se tornam disponíveis para países ocidentais. O projeto já eliminou os obstáculos políticos internos; apenas o SVP ainda se opõe à candidatura, que foi iniciada há dez anos. O partido da direita conservadora considera que a participação da Suíça no Conselho viola a posição de neutralidade do país.

A questão das competências ainda está aberta. De fato, a tradição política da Suíça impede que o governo decida sozinho por sanções ou intervenção militar. Porém a posição oficial é que isto seriam “casos excepcionais”, porque na maioria dos casos o país apoia posições estabelecidas. E caso contrário, a abstenção é sempre possível.

O Conselho Federal quer testar os processos decisórios no outono. Se tiver que acontecer rapidamente, quer ao menos informar os chefes das comissões de política externa do Senado e da Câmara dos Deputados. Esta constelação também não é isenta de ironia: para o presidente da comissão durante o período em questão será provavelmente Franz Grütter, político do SVP e um dos mais acirrados críticos da participação do país no Conselho de Segurança.

Adaptação: Alexander Thoele

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