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A conquista da montanha “virgem”

Gravura em cobre da Jungfrau, de 1813, vista do lado norte akg images

Há exatamente duzentos anos, os irmãos Meyer eram os primeiros alpinistas a escalar um pico de mais de 4000 metros na Suíça.

Hoje, a “Jungfrau” (virgem, em alemão) é uma montanha bem mais dócil para os alpinistas do que o assustador vizinho “Eiger”.

Johann Rudolf e Hieronymus Meyer, filhos de um rico comerciante de tecidos, estavam ansiosos para subir a joia dos alpes, um pico que podia ser visto de longe até no norte da Suíça, onde moravam.

Foi uma ousadia, se não uma ideia louca para a época. Os rapazes já escalavam montanhas desde pequenos, mas a chamada idade de ouro do alpinismo, quando passou a ser considerado um esporte, só começaria meio século depois.

Os Meyers achavam que a melhor maneira de abordar a Jungfrau era pelo lado sul. Eles partem, assim, em uma aventura, atravessando montes e vales antes de chegar a um pobre vilarejo alpino chamado Fiesch, na parte alta do Vale do Ródano.

É provável que eles nem perceberam que ninguém no vilarejo nunca tinha visto o pico que eles estavam procurando, já que a vista para o monte era cortada pelas encostas íngremes das montanhas e guardada pela maior geleira da Europa, o Aletsch.

“Os guias Joseph Bortis e Alois Volker nunca tinham visto a Jungfrau antes e, por isso, deve ter sido um grande desafio. Eles deviam estar mesmo precisando de dinheiro para terem aceitado escalar a montanha, mesmo não tendo nenhuma experiência”, conta Kilian Volken à swissinfo.ch.

Dinastia de guias

O guia de montanha Volken viveu toda sua vida em Fiesch e é um descendente direto de Volker. Seu antepassado se tornou o primeiro de uma longa linhagem de guias, que não parou com Volken. Um de seus sobrinhos mantém a tradição.

Se Volker e Bortis estavam atrás de dinheiro, os irmãos Meyer provavelmente haviam herdado do pai a paixão pela geografia da Suíça. Após ter feito fortuna com uma fábrica de sedas, Johann Rudolf sênior financiou a primeira série de mapas – conhecida como Atlas Meyer-Weiss – que cobria toda a Suíça, baseada em uma pesquisa científica.

Os irmãos devem ter usado o atlas não apenas para encontrar o caminho para Fiesch, mas também para traçar a rota para o cume, apesar dos mapas não terem nenhum detalhe sobre os glaciares da região alpina alta.

“Avançamos sobre as massas de gelo e neve, pendurados na Jungfrau…” narram os irmãos em seu diário sobre os acontecimentos de 3 de agosto de 1811.

“O que nós pensávamos ser um bloco de neve ininterrupto provou ser uma ilusão de ótica; de repente sob nossas botas vimos um precipício de cerca de 40 a 50 pés, que só conseguimos dominar com muita dificuldade… o caminho até o pé do cume da Jungfrau era uma geleira espinhosa muito estreita.”

“O ponto mais alto”

Liderados por Volker e Bortis, e com a ajuda de alguns carregadores, os irmãos Meyer finalmente superaram os obstáculos e chegaram ao pico:

“Uma vez que o passo mais difícil foi dado, o caminho para a encosta de neve se abriu e após mais alguns passos, chegamos no ponto mais alto do maciço do Jungfrau. Foi logo depois das duas horas da tarde.”

Mas, assim que voltaram para casa, tiveram dificuldade em convencer alguém do que haviam realizado.

“Um ano mais tarde, em 1812, um dos irmãos subiu novamente para provar que havia estado no topo. A mesma coisa se passou com a primeira ascensão do Finsteraarhorn. Um dos irmãos Meyer havia participado. Demorou cerca de 30 anos para as pessoas acreditarem que tinham estado lá em cima”, comenta Peter Brunner, autor de um livro comemorativo para os 200 anos da conquista da Jungfrau.

O livro contém passagens originais do diário de Meyer e um registro das subidas mais notáveis da Jungfrau ao longo dos últimos dois séculos.

Hoje ficou fácil

Hoje, a Jungfrau é um dos picos de 4000 metros mais acessíveis nos Alpes, graças à ferrovia Jungfrau que atravessa túneis, chegando a apenas algumas centenas de metros abaixo do cume.

Volken diz ter guiado pessoalmente pelo menos 300 pessoas até o topo da fabulosa montanha em seus 35 anos de guia. Ele estima que, em média por ano, o mesmo número de pessoas deve escalar a montanha.

“Em geral não é muito difícil, mas não deve ser a sua primeira montanha de 4.000 metros”, acrescenta Richard Bortis, guia de montanha em Fiesch e descendente de Joseph Bortis, o outro guia que entrou para o livro dos recordes. “Você precisa de um pouco de experiência para subir com crampons nas rochas. Não é uma subida muito difícil.”

No entanto, uma coisa não mudou, de acordo com Brunner. “Em alemão dizemos que a Jungfrau é a montanha por excelência, porque é a única de todas que é brilhante.”

Os hotéis ao redor da Jungfrau usam seu nome para promover o turismo na região. A montanha também emprestou seu nome à empresa ferroviária regional, que administra o trem turístico para a subida até logo abaixo do cume – o Jungfraujoch – e a maioria dos teleféricos para esquiar na região.

A viagem de trem turístico para o “Top of Europe”, como é chamada, foi inaugurada há quase 100 anos, em 1912. No ano passado, 672 mil pessoas pagaram para o prazer de fazer a viagem ao cume a 3454 metros acima do nível do mar.

A Jungfrau se tornou mais conhecida em 2001, quando a Unesco incluiu a região alpina da Jungfrau-Aletsch-Bietschhorn no Patrimônio Mundial Natural da Humanidade.

O Jungfrau é uma montanha popular para muitas pessoas que desejam escalar um pico de 4.000 metros, devido à facilidade de acesso.

Centenas de pessoas fazem a subida a cada ano. A maioria toma o trem Jungfraujoch, passando a noite em uma cabana de montanha próxima, antes de partir para o cume de 4158 metros de altura nas primeiras horas da manhã seguinte.

No entanto, a subida não é sem perigo. É normal cair neve nesta altitude, mesmo no verão, aumentando o risco de avalanches em seus flancos íngremes.

Em um incidente muito divulgado em julho de 2007 seis recrutas do exército despencaram de 1.000 metros de altura, levados por uma avalanche. Seis soldados e dois guias conseguiram escapar ilesos.

Adaptação: Fernando Hirschy

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