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A pobreza na Suíça

Por Paul Ammann, Natal, Brasil

A Suíça é um país pobre em termos de matéria-prima. Praticamente não existem jazidas minerais rentáveis. Na há bacias petrolíferas. A terra agricultável é reduzida a um terço do território. Além disso, devido ao clima frio ela não pode ser cultivada o ano todo.

Mais de um quarto da superfície suíça é formado por relevos, contra – a título de comparação – apenas 0,5% do território brasileiro. Devido aos relevos e às geadas a produção agrícola de subsistência é caríssima. Esse fato causou frequentemente situações de pobreza em geral e endemias de fome em particular nos séculos anteriores à industrialização.

Em conseqüência, os governos empenharam enormes esforços para garantir a alimentação da população e para reduzir a pobreza. Como o país não dispõe de recursos minerais significativos, os governos investiram nos recursos humanos, elevando as taxas de escolarização na educação fundamental a 100%, as de educação profissional de nível médio a 65% e as de ensino superior a 23%.

A população assim formada aprendeu a tratar os escassos recursos naturais com parcimônia e a produzir bens e serviços de elevada qualidade e de alto valor agregado, tais como os equipamentos de precisão e os produtos farmacêuticos, exportados ao mundo inteiro, mas cujas matérias-primas são importadas.

O povo conseguiu, assim, sair da pobreza e construir, gradativamente, um país com alta qualidade de vida. Contudo, persiste sempre uma camada de pessoas pobres. Em seguida vamos definir e dimensionar a referida pobreza.

Definição da pobreza

Conforme a Constituição Federal da Suíça, “quem se encontra numa situação precária, não tendo mais condições de se manter, tem o direito à assistência e de receber os meios necessários para uma vida dentro da dignidade humana” (art. 12). Todos os residentes na Suíça, inclusive os estrangeiros, têm esse direito.

A Conferência Suíça das Instituições de Assistência Social (CSIAS), criada em 1905, define os critérios que constituem a “vida dentro da dignidade humana”, ou seja, moradia, alimentação, educação, cultura, saúde, lazer, vestuário, higiene, transporte e previdência social.

As Constituições de vários países, inclusive a do Brasil, por exemplo, adotam critérios semelhantes para definir a abrangência do salário mínimo e para determinar seu valor. De fato, o salário mínimo constitucional brasileiro (art. 7), atualizado cada mês pelo DIEESE, corresponde aproximadamente ao valor da renda mínima suíça (corrigido pelo coeficiente do poder de compra).

Entretanto, o valor do salário mínimo efetivamente pago e em vigor no Brasil é cinco vezes inferior ao salário mínimo que a Constituição do referido país preceitua. Por isso há tantos pobres.

O patamar da linha de pobreza

O custo de vida na Suíça é elevadíssimo, especialmente o referente à cesta básica (alimentação) e à moradia. Conforme os cálculos da CSIAS acima referida, uma família com dois adultos e duas crianças precisa de 4.500 francos por mês para poder viver conforme os critérios da dignidade humana mencionada.

O patamar da linha de pobreza gira, portanto, ao redor de uma receita familiar total de 4.500 francos ou 2.500 francos por domicilio constituído por uma pessoa (adulta). Sendo o patamar bastante alto, muitas famílias e numerosos adultos individuais não o alcançam. Estes têm o direito de procurar a Assistência Social Municipal que verifica a situação social, econômica e financeira de cada requerente. Quando a receita da família não alcança o patamar da vida digna, a Assistência Social Municipal lhe desembolsa a diferença.

A dimensão da pobreza

Há vários métodos para calcular o número de pobres. Estima-se que meio milhão de residentes na Suíça – suíços e estrangeiros – dependem da assistência social financeira, em torno de 6% a 8% da população total residente.

A incidência da pobreza varia conforme a idade das pessoas e a composição das famílias. Famílias monoparentais geralmente não alcançam um patamar de renda suficiente para manter toda a família. A proporção de crianças e adolescentes pobres (morando em famílias de baixa renda, via de regra com numerosos filhos) é mais elevada do que aquela das pessoas na idade economicamente ativa.

Jovens que não têm educação profissional e não conseguiram um emprego, bem como adultos que perderam o emprego e que não recebem mais o seguro desemprego, correm mais frequentemente o risco de depender da assistência social financeira.

A proporção dos estrangeiros que recebe essa assistência é três vezes superior à dos suíços, devido, sobretudo, à falta de profissionalização e de integração.

Assistência financeira articulada à orientação educacional e econômica

A assistência financeira pública tem dois objetivos: elevar a renda familiar mensal das pessoas de baixa renda para o patamar que permita conduzir uma vida digna. Simultaneamente os assistentes sociais orientam os jovens e adultos para melhorar seu nível de educação, adquirir uma profissionalização e participar da educação continuada ou de cursos de atualização.

Muito importante é a ajuda oferecida para conseguir um trabalho remunerado. Além disso, no caso dos estrangeiros, os assistentes sociais promovem cursos de línguas – para dominar um dos idiomas oficiais da Suíça – e de integração cultural e social.

Graças a essas medidas integrantes, a grande maioria dos assistidos, que antes era pobre, aprende geralmente em menos de dois anos a manter-se pelas próprias forças e a sair da dependência financeira do governo. Além disso, vários ex-assistidos conseguem devolver aos órgãos oficiais os subsídios que receberam na hora das dificuldades econômico-financeiras.

Sobre o poder de compra do franco suíço veja: Ammann Safira e Paul. Cidadania, exclusão, integração: Brasileiros na Suíça. Brasília, Liber Livro, 2006, capítulo “Ausência de matéria-prima e suas implicações”.
Sobre a relação entre pobreza e falta de profissionalização veja Ammann Paul. Pobreza, emprego e formação. In: Vie économique. Berne, 1/1993 (em francês e alemão).

Paul Ammann nasceu em Davos, naturalizado brasileiro, é economista e sociólogo, trabalhou nos Ministérios do Trabalho do Brasil e da Suíça, nas Secretarias de Saúde Pública de Berna e do Rio Grande do Norte, no CNPq e SENAI em Brasília, publicou livros no Brasil e artigos na Suíça e no Brasil.

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