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‘Bad boys’ de bom coração fazem caridade em uma Argentina empobrecida

Membros dos 'Bearded Villains' argentinos, durante evento de caridade em Buenos Aires, em 29 de maio de 2019 afp_tickers

Fortões, vestindo jaquetas de couro e cobertos de tatuagens. Membros de um clube de barbudos argentinos, o ‘Bearded Villains’, faz caridade nas ruas de Buenos Aires, distribuindo comida e abrigo a pessoas que vivem nas ruas.

Da hora do jantar até depois da meia-noite, esta tribo urbana, de aspecto rude, com correntes, piercings e munhequeiras de couro, perambula como se fossem fantasmas, levando ajuda, mas também companhia, a quem depende da solidariedade para a mínima subsistência.

De uma caminhonete descem fardos, pratos de comida e garrafas de café. Um grupo de indigentes os recebe como se fossem velhos amigos. Sorriem, se abraçam, conversam. A cena se repete às quartas-feiras.

Na Argentina a pobreza atinge 32% da população, dos quais 6,7% são indigentes. Com o desemprego em 9,1% e a inflação anual que chega a 55%, a linha da pobreza aumenta mais e mais.

– “Nos comprometemos” –

“Nós fazemos muitas obras de caridade, para além de reuniões, falar de barbas, tomar uma cerveja e comer um churrasco”, conta à AFP Mauro Ponti, presidente do clube, criado em 2014 na cidade americana de Los Angeles, Califórnia.

Todo candidato a membro deve cumprir um requisito indispensável: ter uma barba de pelo menos quatro centímetros de comprimento e aderir aos valores da lealdade, respeito, família e caridade.

“Nós nos reunimos todas as semanas para sair dar de comer às pessoas em situação de rua, apadrinhamos refeitórios infantis, vamos ao Hospital Infantil distribuir brinquedos”, relata Ponti, que tem um tigre bravo tatuado na cabeça, parcialmente raspada.

Assim como seus colegas do clube, Ponti é forte, com braços grossos e mãos enormes, repletos de anéis de caveira, com uma aparência deliberadamente assustadora.

“Para além da nossa imagem agressiva, somos membros ativos da sociedade, nos comprometemos”, explica Ponti, que se irrita com quem os confundem com um clube de motoqueiros.

O “Bearded Villains Argentina” surgiu como o primeiro clube de barbas da Argentina e busca derrubar o preconceito este grupo amante do rock e jaquetas de couro.

“As pessoas te veem assim e te julgam”, admite Ponti. “O clube foi criado para mudar este paradigma”.

Sem mais apoio econômico que o dinheiro aportado por seus membros, os barbudos argentinos se viram para dar cumprir sua missão solidária.

“Não recebemos ajuda de ninguém, tiramos tudo do nosso bolso ou combinamos nosso trabalho com esta missão”, explica.

Ponti é tatuador. “Às vezes, no meu espaço, faço um ‘flashday’ e troco uma tatuagem por um alimento não perecível, fraldas e leite em pó, assim vamos nos virando”, diz.

– Crianças ao relento –

Integram o clube 70 membros ativos de todas as idades, religiões e ideologias políticas.

Gonzalo Torres tem 40 anos, é vendedor e membro orgulhoso do clube.

“Muitos, quando crianças, tivemos que dormir com o estômago roncando de fome”, explica.

Entre aqueles que esperam toda quarta-feira à noite, “tem meninos de dois ou três anos que dormem ao relento, com chuva ou vento”.

“Ninguém se aproxima deles e se o fazem é para ver se conseguem tirar um voto”, critica para reafirmar que os barbudos “não têm bandeira política”.

“Nós não vamos mudar o mundo, mas com uma comida quente e um cobertor por um instante mudamos o mundo dessas pessoas”, resume.

SWI swissinfo.ch - sucursal da sociedade suíça de radiodifusão SRG SSR

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