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Colômbia, refúgio incomum para deslocados pela violência na Venezuela

Soldados colombianos nas próximidades do rio Arauca, no município de Arauquita, na Colômbia, em 25 de março de 2021 afp_tickers

Foi a primeira vez que Calixto Velasco viu bombardeiros. De repente, ele estava no meio de uma luta entre os militares venezuelanos e um grupo colombiano na Venezuela.

Assustado, ele buscou refúgio na Colômbia, país que durante décadas viu seus cidadãos partirem devido à violência.

“Muitas pessoas que estão lá há anos dizem que nunca viram isso”, disse o ferreiro de 37 anos à AFP.

Ele fugiu do município venezuelano de Paez, Apure (leste), onde eclodiram confrontos no fim de semana. Sua esposa e filhos de 6 e 12 anos o acompanham.

Soldados venezuelanos, ele garante, “levaram muitos trabalhadores” no meio de uma ofensiva contra supostos rebeldes colombianos.

Quase 4 mil pessoas chegaram ao município fronteiriço de Arauquita (nordeste), a maioria venezuelanos, entre domingo e quinta-feira, segundo autoridades.

Eles dormem aglomerados em tendas improvisadas em meio ao agravamento da pandemia.

Velasco pede garantias para voltar à Venezuela por temer saques em sua casa. Outros buscam informações sobre parentes detidos na ofensiva.

“Levaram o meu pai. O nome dele é José Rico, é um inocente, um camponês da comunidade que não tem nada a ver com a guerra (…) Queremos que ajudem a tirá-lo de onde quer que esteja”, reclama sua filha Diana Rico em desespero.

– Dissidentes –

Do outro lado da fronteira, os combates continuam e os moradores fogem, segundo fontes oficiais colombianas consultadas pela AFP nesta sexta-feira(26).

Segundo o presidente Nicolás Maduro, os confrontos correspondem a uma ofensiva de suas tropas contra um “grupo ilegal” colombiano.

Até domingo, último saldo disponível, os confrontos deixaram pelo menos três mortos, 14 feridos e 32 detidos.

Para o representante do líder da oposição venezuelana Juan Guaidó na Colômbia, Tomás Guanipa, a violência é consequência de um ataque ordenado por Maduro contra uma ala de guerrilheiros que se afastou do acordo de paz assinado com as FARC em 2016 e que é inimigo de outra facção, supostamente apoiada pelo Chavismo.

O ministro da Defesa da Colômbia, Diego Molano, concorda com essa versão, segundo um áudio enviado à AFP.

“O fundamental é que o regime venezuelano tome a decisão de combater todas as organizações como o ELN (Exército de Libertação Nacional), os dissidentes das FARC (…) que estão presentes nessas áreas e realizam atividades de narcotráfico”, afirmou.

Bogotá acusa Maduro de proteger esses grupos armados em seu território.

Caracas nega as acusações e culpa a Colômbia pela violência na fronteira.

– Migração inversa –

A Colômbia desarmou a maior parte da guerrilha mais antiga das Américas com a assinatura de um acordo de paz histórico em 2016. Alguns guerrilheiros rejeitaram o pacto e se reorganizaram em diferentes grupos conhecidos como dissidentes das FARC.

Sem comando unificado e hoje em aparente conflito entre si, os dissidentes somam cerca de 2.500 militantes e se financiam principalmente do tráfico de drogas e da exploração ilegal de ouro e outros minerais, segundo a inteligência militar.

A chancelaria venezuelana denunciou que os grupos armados estavam usando a população como “escudo humano” e prometeu uma “reação contundente” contra a entrada de qualquer organização “regular ou irregular”.

Para “apoiar a operação humanitária” nos campos de fronteira, Bogotá enviou cerca de 1.200 soldados para a área de fronteira.

Desde 1970, a pobreza e o conflito armado levaram centenas de milhares de colombianos a emigrar para a Venezuela, então um dos territórios mais prósperos da América do Sul.

Hoje, a Colômbia abriga mais de 1,7 milhão de migrantes que fugiram da crise econômica e política no antigo país do petróleo.

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