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Entrevista AFP: Já ‘não precisamos’ das armas, diz líder das Farc na Colômbia

Mauricio Jaramillo, na Colômbia, no dia 14 de junho de 2017 afp_tickers

Há quase 40 anos na guerrilha Farc e como um de seus dirigentes máximos, Mauricio Jaramillo está convencido da paz na Colômbia e de que as armas já não são necessárias e tampouco “um fetiche” para os rebeldes.

Seu nome de batismo é Jaime Parra, mas na guerra o mudou em homenagem a um professor que teve nas Juventudes Comunistas. Por sua profissão também lhe chamam de “El médico” e é membro do Secretariado das Farc responsável pelos guerrilheiros presos e por sua libertação durante os acordos de paz.

Participou no início dos diálogos em Cuba, que fizeram com que saíssem “mais fios brancos” em sua cabeça do que já tem. Após quatro anos de negociações, assinaram a paz em novembro de 2016 com o governo de Juan Manuel Santos para acabar com mais de meio século de conflito.

Aos 62 anos, está na localidade de Colinas, departamento de Guaviare, à frente de uma das 26 zonas onde estão concentrados cerca de 7.000 guerrilheiros para cumprir o processo de deposição das armas – supervisionado pela ONU e que deve terminar na próxima semana – e voltar para a vida civil.

“As armas em si mesmas são um ferro […] agora tomamos uma decisão de caráter político e não precisamos delas”, disse em entrevista à AFP este comandante das Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (Farc).

Em Colina, um dos maiores e mais complicados pontos de concentração do país, em parte pela presença de dissidentes das Farc, insiste que a anista aos guerrilheiros está atrasada e disse que a cúpula das Farc vai “aceitar” e “assumir” as sentenças da justiça de transição.

– O que significa para vocês o processo de deposição das armas?

Quando tomamos essa decisão, foi fundamentalmente política. Nós sabemos para onde vamos, o que estamos fazendo, as armas em si são um ferro, nós não as vemos como um fetiche. Cumpriram uma função determinada em um tempo determinado, agora tomamos uma decisão de caráter político e não precisamos delas.

– Denunciaram que o processo de anistia a guerrilheiros está atrasado. Quantos receberam a anistia e quantos faltam?

Nesse momento, sobre a anistia, creio que tenham sido uns 1.000 companheiros. Falta muita gente, acredito que faltem mais de 2.000. Está muito atrasado.

– Onde estão os 1.000 que receberam a anistia?

Há alguns companheiros que ainda têm que se apresentar à Jurisdição Especial para a Paz (JEP, criada no acordo), eles estão em Mesetas (um dos pontos de concentração), os outros já saíram livres (aproximadamente 300).

Inclusive há alguns que estão aqui, que saíram livres e vieram para cá dizendo “queremos trabalhar com vocês, podemos?”. E claro, todos podem vir se quiserem.

– Esta zona, entretanto, é complicada e não era o seu destino original. Veio para Guaviare pela presença de dissidências?

Começamos a definir que aqui tinha problemas […] Cheguei à área e o primeiro com quem me encontrei foi Gentil (Duarte), um guerrilheiro de mais de 30 anos.

Esse dia ele foi, me surpreendeu. É uma decisão que ele toma e cada um toma as suas decisões e as enfrenta.

Da Frente Primeira se foram uns 70. Depois se vão outros. No total, uns 100 se foram daqui.

– Qual acham que será o destino dos membros do Secretariado em relação à justiça de transição?

Nesta questão do judiciário contra nós há todo um tema que é fundamentalmente midiático: nós somos o pior deste mundo, temos penas de todo tipo […]. Acho que tenho algumas acusações inverossímeis, mas as temos e todos as têm. Todos os dias aparecem para Timo (Timochenko ou Rodrigo Londoño, chefe das Farc) acusações e condenações.

– Veem a possibilidade de algum de vocês ser condenado a penas de privação de liberdade alternativas à prisão?

Isso a JEP dirá. É possível que haja uma situação dessas e se for assim, nós vamos assumir porque esse é um acordo de paz entre duas forças e uma das conclusões foi essa: a JEP […] age de uma forma e a nós cabe, bom, vamos aceitar.

Queremos que fundamentalmente apareça a verdade, é a única forma de chegarmos à paz.

– Como vê as Farc nas eleições de 2018? Já com candidato presidencial?

Ainda temos que ver por meio do Congresso do partido (previsto para agosto). Lá esclareceremos muitas coisas, haverá uma definição concreta de nossas estratégias, nossos objetivos e como vamos enfrentar.

Uma das bandeiras está claramente definida: que nós vamos contra a corrupção, isso está certo. Que nós vamos lutar fundamentalmente para que neste país também acabe a violência.

SWI swissinfo.ch - sucursal da sociedade suíça de radiodifusão SRG SSR

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