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Guaidó caminha no fio da navalha em nova investida contra Maduro

O líder da oposição Juan Guaidó mostra uma bandeira venezuelana durante uma manifestação, em 16 de novembro de 2019 em Caracas afp_tickers

No auge de sua popularidade, o opositor venezuelano Juan Guaidó prometeu tirar Nicolás Maduro do poder este ano. Agora, arriscando sua liderança, parece mudar para uma estratégia de longo prazo para quebrar o crucial apoio militar ao presidente.

“Pelo bem ou pelo mal”, jurou Guaidó, cuja aprovação, segundo a empresa Datanálisis, alcançou 63% em janeiro, depois de se autoproclamar presidente interino e contar com apoio de cinquenta países liderados pelos Estados Unidos.

Mas nem as duras sanções e ameaças de uma ação militar de Washington, nem o isolamento internacional do governo precipitaram a ruptura das Forças Armadas com Maduro, nem impediram que a popularidade de Guaidó caísse para 42% em outubro.

“Tentamos de tudo”, disse o líder parlamentar durante uma mobilização no último sábado, que apresentou como o início de um “protesto permanente”, uma tentativa de capitalizar o entusiasmo de seus seguidores pela queda de Evo Morales na Bolívia.

Mas em termos de participação, a mais recente mobilização em Caracas, que contou com cerca de 5.000 pessoas, ficou muito abaixo dos primeiros protestos comandados pelo opositor. O mesmo ocorreu nas manifestações convocadas para a segunda e esta terça-feira.

“O protesto está desgastado por seu uso e abuso”, observa o analista Benigno Alarcón.

“Não há uma fórmula mágica”, reconhece Guaidó, que no dia 30 de abril liderou uma fracassada tentativa de rebelião militar contra Maduro e depois aceitou iniciar um diálogo com mediação da Noruega que também não avançou.

As Forças Armadas acumularam um vasto poder durante duas décadas de governo chavista.

– Frustração à espreita –

Guaidó busca aumentar gradualmente a pressão contra Maduro em um país onde, segundo a Datanálisis, 82% da população quer “uma mudança política”.

“Parece que ele abandonou a ideia de saída rápida para focar o trabalho como um processo que leva tempo”, disse à AFP Felix Seijas, diretor da empresa de pesquisa Delphos.

Segundo a Delphos, 38% dos oponentes querem que outro líder enfrente Maduro em um contexto em que lideranças independentes praticamente não existem.

A aposta parece arriscada em um país onde grande parte da população está ocupada sobrevivendo a uma crise devastadora, com uma economia reduzida pela metade desde 2013 e inflação que fechará este ano em 200.000%, segundo o FMI.

“A frustração pode chegar”, advertiu Seijas.

Alguns também temem a “repressão”. Maduro, que classifica Guaidó de “marionete” de seu mentor Leopoldo López e de Donald Trump, tem enfrentado protestos que deixaram mais de 200 mortos desde 2014.

“Estou cansado, Guaidó nos enganou. Não conseguimos nada com passeatas “, reclama Bianca Urdaneta, uma dona de casa de 36 anos.

Mas o opositor pede para a população não se acostumar com uma “falsa normalidade”, quando as remessas de quatro milhões de pessoas que emigraram desde 2016 podem ajudar o governo, sujeito a um embargo americano ao petróleo desde abril.

Para o presidente de Datanálisis, Luis Vicente León, para além de uma vaga oferta de anistia, a estratégia de Guaidó carece de garantias para os militares de que poderão “preservar seu poder, integridade e patrimônio”.

– Dias chave –

Guaidó, que acusa Maduro de obter a reeleição de forma fraudulentamente em 2018, tem pela frente dias chave como o 5 de janeiro, quando terminará seu mandato à frente do Parlamento, do qual convocou a presidência interina.

A maior parte dos integrantes da coalizão de oposição apoia sua continuidade no cargo, mas um acordo anterior reserva a presidência rotativa a partidos minoritários, alguns críticos de Guaidó e outros em negociações com o governo.

Pior, em 2020 as eleições legislativas devem ser realizadas, mas Guaidó exige eleições presidenciais sem Maduro, que tem apenas 15% de popularidade, de acordo com Datanálisis.

Correndo o risco de uma nova divisão, a oposição pode boicotar esse pleito, como aconteceu nas eleições presidenciais de 2018, o que permitiria ao chavismo, que a Delphos diz representar 25% do eleitorado, retomar o único poder nas mãos da oposição.

Ambos lados iniciaram um processo legislativo para renovar o poder eleitoral, com diferentes horizontes: Guaidó deseja novas eleições presidenciais e Maduro quer parlamentares.

“Se as pessoas não responderem, Guaidó deve promover um conflito. Ele só tem a opção de surpreender ou morrer tentando”, diz o cientista político Jesús Castillo-Molleda.

SWI swissinfo.ch - sucursal da sociedade suíça de radiodifusão SRG SSR

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