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Milhares vão às ruas contra cortes na educação, em desafio a Bolsonaro

O presidente Jair Bolsonaro abraça o ministro da Educação, Abraham Weintraub, durante a cerimônia de posse em 9 de abril de 2019 afp_tickers

Centenas de milhares de estudantes e professores protestaram em todo o país nesta quarta-feira (15) contra o bloqueio de recursos para a Educação, anunciado pelo governo de Jair Bolsonaro, que atribuiu a agitação à manipulação de “idiotas úteis” por parte de uma minoria de esquerda.

As greves e atos desta primeira grande contestação ao presidente de extrema direita, que assumiu o cargo em 1º de janeiro, se estenderam por quase 200 cidades dos 27 estados brasileiros, segundo informes oficiais compilados pela imprensa.

Os manifestantes também atacaram a reforma da Previdência – considerada essencial pelo mercado financeiro e pelo governo para acertar as contas públicas – e contra o decreto recente de Bolsonaro de flexibilizar o porte de armas.

O número oficial de participantes é impossível saber porque as autoridades de muitos estados, como o Rio de Janeiro, não publicam estimativas.

Até as primeiras horas da noite, fontes oficiais registraram 15.000 manifestantes em Brasília e 20.000 em Belém do Pará.

Imagens aéreas transmitidas pela TV mostravam multidões impressionantes nas ruas de Rio e São Paulo, onde os organizadores estimaram uma participação de 150.000 pessoas que repetiam palavras de ordem como “Tirem as mãos da educação” e “Livros sim, armas não”.

Também segundo os organizadores, houve 70.000 manifestantes em Salvador, 20.000 em Curitiba e 15.000 em Belo Horizonte.

O dia transcorreu sem incidentes, fora de um confronto entre grupos de jovens e policiais em Porto Alegre e do incêndio de um ônibus no Rio após o fim da manifestação.

Os protestos denunciam os planos do ministro da Educação, Abraham Weintraub, de bloquear recursos, inclusive 30% do orçamento discricionário (não obrigatório) das universidades federais. A medida afeta milhares de bolsas de estudo, assim como o pagamento de contas de luz, água, serviços de limpeza e segurança.

O governo alega que não se tratam de cortes definitivos, mas um contingenciamento de recursos em todas as áreas quando a renda prevista é inferior à contemplada nos orçamentos.

Weintraub, convocado pela Câmara dos Deputados, explicou que o novo governo “não é responsável pelo desastre da educação básica brasileira” e advertiu que a “autonomia universitária não é soberania. As universidades têm que respeitar as leis”.

– ‘Idiotas úteis’ –

Bolsonaro optou por confrontar os manifestantes, afirmando que a maioria dos manifestantes é “militante. Não tem nada na cabeça”.

“Se perguntar 7 x 8 não sabe. Se perguntar a fórmula da água, não sabe. Não sabe nada. São uns idiotas úteis, uns imbecis que estão sendo utilizados como massa de manobra de uma minoria espertalhona que compõe o núcleo de muitas universidades federais do Brasil”, afirmou Bolsonaro, em visita a Dallas (Texas), onde será homenageado na quinta-feira pela Câmara de Comércio Brasil-Estados Unidos.

Estas declarações foram consideradas uma afronta por muitos manifestantes, que insistem na defesa da educação.

“Tenho mestrado e pós-doutorado em energia; se alguém é idiota nessa história não sou eu. Sem ciência não há saúde, nem trabalho. Estamos aqui lutando para que o Brasil continue produzindo conhecimento. Sem dinheiro, não há conhecimento”, afirmou Mariana Moura, de 38 anos, pesquisadora do Instituto de Energia da Universidade de São Paulo.

Desde a chegada de Bolsonaro ao poder, a Educação se tornou um campo de disputa entre os setores mais conservadores do eleitorado do capitão, decididos a extirpar qualquer vestígio do “marxismo cultural” nas salas de aula.

O presidente já tinha causado polêmica em abril, ao anunciar no Twitter que seu governo analisava cortar verbas para cursos como filosofia e sociologia nas universidades públicas, com o objetivo de concentrar esforços em cursos como veterinária, engenharia ou medicina que, segundo ele, geram retorno imediato ao contribuinte.

No Twitter, os três principais temas de discussão nesta tarde eram #TsunamiDaEducação,#Lula Livre e #NaRuaPelaEducação.

A agitação preocupa os mercados, que apostaram em Bolsonaro para avançar em suas reivindicações de cortes fiscais.

A Bolsa de São Paulo, que nos primeiros meses da gestão Bolsonaro chegou a subir quase 15% e superar os 100.000 pontos, fechou nesta quarta-feira a 91.623 pontos (-0,51%), seu menor nível desde 3 de janeiro, sob o impacto da situação política no Brasil e das tensões comerciais internacionais.

O dólar superou pela primeira vez os 4 reais desde 25 de abril, chegando a 4,019, antes de recuar sutilmente para fechar a 3,97.

SWI swissinfo.ch - sucursal da sociedade suíça de radiodifusão SRG SSR

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