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Minha vida é um videogame: o mundo de fantasia dos internautas chineses

Foto tirada em 23 de julho de 2017 mostra participante fantasiado na Bilibili Macro Link 2017, convenção anual de animação, quadrinho e jogos, em Xangai afp_tickers

Para escapar do “tédio” da sua vida de auxiliar de escritório, Yaorenmao se enfeita e rebola na frente da câmera fantasiada de heroína de videogame, um espetáculo que esta jovem chinesa compartilha na internet com cerca de 1,3 milhão de fãs.

“Yaorenmao” (“o gato que morde”) é o pseudônimo que esta jovem escolheu para animar seu mundo virtual na plataforma de vídeos bilibili.com, site muito popular de uma empresa de Xangai, com 150 milhões de internautas.

Nele se encontra uma mistura eclética de desenhos animados, trechos de séries de televisão e, principalmente, conteúdos gerados por usuários que se filmam, com frequência inspirados no universo dos videogames, dos mangás e filmes japoneses.

Diante da restrita mídia chinesa, cujos programas para a juventude são censurados até se transformarem em algo insípido, bilibili.com oferece uma escapatória.

Em um país viciado em smartphones, as plataformas do tipo Bilibili permitem que qualquer videasta amador coloque suas criações na internet, alcance um grande público e, em alguns casos, conquiste uma fama efêmera.

Yaorenmao, de 20 e poucos anos, divulga desde 2011 vídeos realizados em sua casa em Chengdu (sudoeste), onde rebola ao som de de músicas melosas.

“Depois da faculdade, encontrei um trabalho tradicional, mas esta existência banal era terrivelmente tediosa” afirma à AFP, sem dar seu nome verdadeiro, para manter um muro entre sua vida profissional e sua identidade virtual.

– Presentes e cerejeiras japoneses –

Muitos lhe enviam pela internet “presentes” virtuais, mas também dinheiro, que gasta em roupas e acessórios caros e sofisticados, o que lhe permitiu fazer uma viagem de 1.300 euros ao Japão, onde filmou as cerejeiras florescendo.

Os conteúdos on-line derivados dos ACG (“Anime, Comic and Games”) japoneses se multiplicaram e representam agora na China um setor de bilhões de dólares, segundo estimativas da empresa CIConsulting.

Mas Bilibili.com oferece também aos internautas ferramentas de interação muito populares: amplas seções de reações e a possibilidade de mostrar ao vivo os comentários do público, sobrepostos aos vídeos.

“Todo mundo tem medo da solidão e aspira a um mundo melhor onde possa se expressar sem limitação” afirma Chen Rui, presidente da plataforma, em entrevista à AFP.

Segundo cálculos de especialistas, a China conta com cerca de 300 milhões de fãs das ACG, e cada um gasta por ano 1.700 yuanes (218 euros) em média.

– Escapar das pressões –

Até mesmo a Liga comunista para a juventude abriu uma conta na plataforma, na qual elogia o partido no poder.

Huang Yanhua, analista da iResearch Consulting, considera que o peso econômico do setor é alimentado pelo poder aquisitivo dos jovens “nascidos depois de 1990, que entraram no mercado de trabalho”.

Esta situação interessa os gigantes da rede chinesa: Tencent, grande produtor de videogames eletrônicos, lançou em 2012 sua plataforma de vídeo “Tencent Comics”, e o site Alibaba investiu 50 milhões de dólares, em 2015, na plataforma Acfun, rival direta da Bilibili.

O interesse gerado pelos “mundos virtuais” se estende além da internet: desde 2013, Bilibili organiza em Xangai uma convenção anual, e a última edição, em julho, reuniu 100.000 produtores de conteúdos em vídeo, a maioria recém-saídos da adolescência, vestidos com trajes brilhantes ou inspirados nos personagens de mangas.

Em um país submetido a rápidas mudanças econômicas, tecnológicas e sociais, os universos on-line proporcionam uma “escapatória” das pressões do mundo real, afirma Zeng Hang, diretor de conteúdos na internet com temática militar.

Os jovens “vivem hoje em grandes imóveis em Xangai, sem sequer conhecer os meninos da mesma idade que vivem no apartamento vizinho”, assegura.

Esses jovens se refugiam nos conteúdos com frequência frívolos de Bilibili e “acabam dando mais importância à sua vida no mundo virtual, onde gastam seu dinheiro em tudo do que gostam”.

SWI swissinfo.ch - sucursal da sociedade suíça de radiodifusão SRG SSR

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