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Na China, o reconhecimento facial não é mais coisa de ficção científica

Policial chinês explica a uma jovem como funciona o aparelho de reconhecimento facial instalado em uma rua de Shangai, no dia 9 de agosto de 2017 afp_tickers

A China está na vanguarda no uso da tecnologia do reconhecimento facial, presente tanto em restaurantes de fast food como em universidades, na luta contra o crime e, inclusive, no dispenser de papel higiênico em banheiros públicos.

Seus defensores alegam que esta tecnologia torna a vida mais fácil e segura, mas seus detratores veem nela mais uma forma do governo monitorar de perto os 1,4 bilhão de chineses.

Em Xangai e em outras grandes cidades, o reconhecimento facial é visto inclusive nas ruas, com o objetivo de deter os que infringem as normas de circulação.

Assim, os pedestres que atravessam a rua por lugares onde não é permitido são sistematicamente fotografados e sua foto aparece em um telão instalado no cruzamento mais próximo. Se não querem ser vistos nesta “tela da vergonha”, têm que pagar uma multa de 20 yuanes (3 euros).

A população chinesa, governada pelo Partido Comunista, é uma das mais vigiadas do mundo, em um país com cerca de 176 milhões de câmeras de segurança operacionais. As pessoas perguntadas sobre isso em uma rua de Xangai não parecem especialmente incomodadas com a novidade.

“Posso aceitar. (…) É uma forma de fazer com que a lei seja respeitada”, diz uma funcionária de hospital de 42 anos, que se apresenta apenas com seu sobrenome, Wu.

“Mas acho que algumas pessoas poderiam dizer que estão violando sua vida privada, e se preocupar com a forma como esta informação poderia ser armazenada”, acrescenta.

A polícia utiliza esta tecnologia para encontrar suspeitos. Foi empregada recentemente na pequena cidade de Qingdao, produtora da cerveja Tsingtao, onde câmeras situadas na entrada de um festival de cerveja permitiram deter 25 suspeitos.

Todos os chineses com mais de 16 anos devem ter uma carteira de identidade com foto e endereço, o que significa que as autoridades dispõem de um enorme banco de dados.

A China, consideram os especialistas, está muito à frente do Ocidente nesta questão, principalmente porque suas leis sobre a vida privada são muito menos estritas e porque seus cidadão estão acostumados a ser fotografados, a tirar suas impressões digitais e a dar todo tipo de informações pessoais para as autoridades.

– Sorria para pagar –

Mas esta tecnologia se imiscui também em todo tipo de transações. Isso vai do sistema “sorria para pagar” empregado na rede de restaurantes KFC até outros usos menos tradicionais.

Nos banheiros do Templo do Céu, em Pequim, os dispensers de papel higiênico estão equipados para evitar roubos. Se alguém tenta utilizá-los várias vezes, a máquina o reconhece e para de lhe dar papel, lembrando educadamente que ele já se serviu.

Uma das universidades de Pequim instalou esta tecnologia na entrada dos dormitórios para se assegurar de que só seus alunos entrem neles, “o que nos permite verificar melhor onde os estudantes se encontram”, explicou um responsável do centro à agência Xinhua.

Os bancos também começaram a equipar seus caixas automáticos com esta técnica, para substituir os cartões de crédito, e os profissionais do setor turístico também veem vantagens no reconhecimento facial: a China Southern Airlines começou a eliminar os cartões de embarque.

Em Xangai, um sistema oficial permite detectar pessoas perdidas nas ruas, principalmente pessoas idosas ou com deficiência cognitiva, e levá-las para suas famílias.

– ‘Número um em inteligência artificial’ –

Este novo avanço se enquadra em uma estratégia mais ampla de desenvolvimento da alta tecnologia.

O governo chinês anunciou em julho que pretende tornar seu país o número um em inteligência artificial até 2030, com um mercado local de 150 bilhões de dólares.

Esta tendência, segundo Yue Lin, professor de Direito na Universidade de Xangai, é impulsionada principalmente pelas companhias chinesas de tecnologia, como Alibaba ou Baidu.

Mas ainda é cedo para avaliar as consequências que esta técnica pode ter na vida privada, considera Yue. “A autoridade da polícia não mudou, mas, indiscutivelmente, ganhou mais poder”, opina.

“Isto não acontece só na China, ocorre a mesma coisa no mundo todo. Mas, talvez, para os chineses seja algo bom e para os americanos, algo terrível”.

SWI swissinfo.ch - sucursal da sociedade suíça de radiodifusão SRG SSR

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