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Nicarágua suspende diálogo por falta de consenso

Representantes da Igreja nicaraguense mediam diálogos nacionais entre o governo de Daniel Ortega e grupos opositores em 21 de maio de 2018 em Manágua afp_tickers

A Conferência Episcopal da Nicarágua (CEN) suspendeu nessa quarta-feira o diálogo nacional entre o governo e os opositores para terminar com a crise política que afeta a nação por falta de acordo para avançar na discussão de uma agenda de democratização do país.

“Já que hoje não há consenso entre as partes, nós da CEN lamentamos nos ver obrigados a suspender o plenário do diálogo nacional”, informou em um comunicado após oito horas de reunião sem sucesso no seminário Nossa Senhora de Fátima, em Manágua.

O governo se negou a discutir uma agenda que entre outros pontos propunha antecipar a eleição presidencial para esse ano para buscar uma saída para a crise política e social que castiga o país desde meados de abril e que deixou 76 mortos até o momento.

Os religiosos, que atuam como mediadores, propuseram criar uma comissão mista de seis pessoas, três de cada parte, para buscar um consenso que permita retomar as discussões.

“Sentimos a urgência em lembrar que dessa decisão e a possibilidade de continuar esse diálogo depende em grande parte a paz e a vida de muitos nicaraguenses”, disse o cardeal Leopoldo Brenes ao ler o comunicado da CEN.

O chanceler Denis Moncada declarou que a agenda proposta para o diálogo, com a antecipação da eleição, tinha “o objetivo de desmontar o Estado Constitucional do governo eleito e (…) é era uma rota camuflada” para um golpe de Estado contra o presidente Daniel Ortega.

Segundo Moncada, os temas da agenda de 40 pontos se propunham a “mudar o governo da Nicarágua à margem da Constituição, do ordenamento jurídico e violando a Constituição e as leis”.

O projeto em discussão previa uma reforma parcial da Constituição e da lei eleitoral “a fim de antecipar as eleições presidenciais, municipais, legislativas e regionais o mais rapidamente possível”.

O presidente Daniel Ortega e sua esposa e vice-presidente, Rosario Murillo, foram eleitos em novembro de 2016 para um mandato de cinco anos, que termina em janeiro de 2022.

Em Wasghinton, o secretário-geral da OEA, Luis Almagro, havia defendido uma solução “eleitoral” para a Nicarágua.

“Qualquer um que pense que a Nicarágua tem uma solução diferente da eleitoral se engana gravemente. Quando a sociedade está polarizada, a decisão deve voltar em forma urgente ao soberano: o povo”, disse Almagro, em mensagem difundida em texto e vídeo pela Organização dos Estados Americanos (OEA), no qual pediu “um processo eleitoral justo, claro, transparente” no país centro-americano.

Na noite desta quarta-feira, ao menos dez pessoas ficaram feridas em um confronto entre manifestantes e a polícia de choque na cidade de León, no noroeste do país, segundo a Cruz Vermelha Nicaraguense (CRN).

“Temos dez feridos atendidos, três em estado grave”, que foram levados para um hospital, disse à AFP a assessora de imprensa da CRN de León, Lizet Guido.

O confronto ocorreu na entrada de León, 75 km a noroeste da capital, quando grupos vinculados ao governo tentaram desalojar manifestantes que bloqueavam uma estrada para protestar contra o governo.

A ação deflagrou uma batalha campal, com o uso de pedras e morteiros de ambos os lados, segundo o canal 100% Noticias.

Centenas de camponeses mantinham as interrupções em diferentes regiões do país, o que impedia a circulação de pessoas e mercadorias.

Os protestos iniciados em 18 de abril contra o governo já deixaram 76 mortos, 868 feridos e 438 detidos, segundo a Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH), que concluiu na segunda uma missão na Nicarágua.

A CIDH encontrou no país centro-americano uma situação “mais grave do que pensávamos”, disse a chilena Antonia Urrejola, relatora para a Nicarágua, em coletiva de imprensa nesta quarta-feira em Washington, da qual participou via Skype do Chile.

O secretário-executivo da CIDH, Paulo Abrao, afirmou na mesma coletiva que se constatou “um padrão de violência e repressão” dos protestos e destacou um “ambiente de intimidação, de ameaças”.

Em seu relatório preliminar, a CIDH revelou “graves violações aos direitos humanos”, caracterizadas por “um uso excessivo” da força pública e de terceiros armados para reprimir os protestos.

Além disso, inclui “vários testemunhos (que) falam do uso de franco-atiradores” em Manágua e Matagalpa (norte), indicando “a possibilidade de que se tenham registrado execuções extrajudiciais”.

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