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Oposição venezuelana exige nas ruas revogatório sob ameaça do chavismo

Membros da oposição participam de protesto para exigir ao poder eleitoral a ativação do referendo revogatório contra o presidente Nicolás Maduro, em Carcas, no dia 27 de julho de 2016 afp_tickers

A oposição venezuelana saiu nesta quarta-feira (27) às ruas para exigir ao poder eleitoral que ative o referendo revogatório contra o presidente Nicolás Maduro, cujo governo busca anulá-lo como ator político para evitar o avanço do processo.

“Revogatório já”, gritavam seguidores da oposição que se reuniram em duas áreas do leste de Caracas, sem poder marchar até a sede do Conselho Nacional Eleitoral (CNE), onde dirigentes da Mesa da Unidade Democrática (MUD) pretendiam entregar uma carta com sua petição.

Algumas barricadas e 200 policiais civis e militares bloquearam algumas vias e impediram o avanço da manifestação, onde cerca de um milhão de pessoas participaram, sem o registro de incidentes.

A MUD convocou a manifestação para reclamar ao CNE, acusada de servir ao governo, que fixe a data de recolhimento das quatro milhões de assinaturas, necessárias para convocar o referendo.

Mas o CNE nem sequer anunciou se poderá passar para essa segunda etapa ao longo do processo. Na terça-feira (26), a oposição ficou esperando que o órgão confirmasse que reuniu as 200.000 assinaturas, o requisito inicial para ativar o referendo, e dar por terminada a primeira fase.

O Conselho anunciou que na próxima segunda-feira (1) analisará a validade das assinaturas, sem esclarecer se fará um pronunciamento nesse dia sobre a ativação da consulta. Advertiu, também, que não permitirá “pressões”.

“As pessoas não querem violência, mas se não houver solução pode acontecer qualquer coisa. A paciência do povo está se esgotando”, declarou o líder opositor Henrique Capriles na manifestação.

O tempo vale ouro

A tensão aumentou na terça-feira quando o chavismo pediu ao CNE que anulasse a inscrição da MUD como partido político, alegando que cometeu uma “fraude gigantesca” no recolhimentos das 200.000 assinaturas.

“Como o governo está desesperado, temendo a consulta popular, ele utilizará todos os truques. Nós não estranhamos nada que eles fazem”, afirmou o chefe do Parlamento – de maioria opositora – Henry Ramos Allup.

Para alguns analistas, a petição do chavismo é improcedente, mas eles reconhecem que poderia atrasar o processo, já que o tempo está muito apertado para que o referendo ocorra este ano.

A MUD busca que a consulta aconteça antes do dia 10 de janeiro de 2017, pois se Maduro perder agora, haverá eleições. Mas se ocorrer depois dessa data, e for revogado, os dois anos de mandato que ainda restam seriam terminados por seu vice-presidente.

“O argumento para ilegitimar a MUD não tem base prática, mas a estratégia de atrasar o processo pode servir ao chavismo, e os espaços começam a se fechar de forma perigosa”, comentou com a AFP Eugenio Martínez, especialista em assuntos eleitorais.

Em sua corrida contra o relógio, a MUD deve conseguir que o CNE fixe o mais rápido possível a data para recolher – em três dias – as quatro milhões de assinaturas, pois depois disso o poder eleitoral levará 15 dias úteis para contabilizá-las e mais três meses para organizar a consulta.

Para o constitucionalista José Ignacio Hernández, a petição do governo de ilegitimar a MUD “juridicamente não tem muito sentido”. “Será nula ou um golpe mais duro ao referendo”, afirmou.

O analista Luis Vicente León disse à AFP que a solicitação do chavismo é “totalmente desequilibrada e insólita”, e que aparece “como uma distração e uma mensagem mais para os próprios quadros internos”.

Uma panela de pressão

Para revogar Maduro será necessário mais que os 7,5 milhões de votos com os quais foi eleito em 2013. Segundo a empresa Venebarómetro, 73,4% dos venezuelanos reprova sua gestão e 64% dos eleitores votaria para tirá-lo do poder.

“Estou disposta a revogar este presidente. Não temos comida e passamos muitas necessidades”, disse Tania Pérez, uma dona de casa que assistiu à concentração opositora.

Quase todos os dias tem ocorrido protestos por falta de comida nos últimos meses. A escassez de alimentos e remédios é de 80% e a inflação foi de 180,9% em 2015, projetada pelo FMI em 720% para 2016.

“A Venezuela é uma panela de pressão, um vulcão, e o governo não faz nada. Dependemos do direito ao voto para acabar com este caos”, manifestou o deputado opositor Julio Borges.

Neste forte hostilidade pelo referendo e a fúria da população, os analistas consideram que a saída está na pressão e na negociação.

“Que o revogatório aconteça antes de dezembro é um assunto totalmente da vontade política do governo, e isso vai passar sem dúvida alguma pela pressão nacional e internacional”, opinou Martínez.

Uma comissão de ex-presidentes estrangeiros estimula as conversas entre o governo e a oposição, mas o referendo continua sendo um problema para seguir adiante.

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