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Presidente interina quer convocar eleições na Bolívia nas próximas horas

O ex-presidente Evo Morales, durante homenagem recebida pela prefeita da Cidade do México, Claudia Sheinbaum, em 13 de novembro de 2019 afp_tickers

A presidente interina da Bolívia, Jeanine Áñez, anunciou que convocará, nas próximas horas nesta quarta-feira (20), eleições gerais, uma demanda de vários setores da sociedade após as anuladas eleições de 20 de outubro.

“Se Deus permitir, hoje pela manhã, vamos lançar a convocação para as eleições, como todo país está pedindo”, disse Áñez à imprensa, acrescentando que ainda não se definiu qual será o mecanismo legal – se por uma lei aprovada no Congresso, ou se por decreto supremo presidencial, em caso de ausência de consenso político.

Áñez afirmou que a convocação será observada por organismos internacionais e por outras instituições, como a Igreja católica, as quais vêm tentado mediar um diálogo interpartidário para agilizar uma nova disputa eleitoral e definir o cronograma do processo.

“Vamos estar o mais agarrado possível à Constituição”, disse ela.

O Senado foi convocado para esta tarde, mas tudo faz antecipar que haverá complicações nos trabalhos.

O oficialismo não quer que os parlamentares tratem da renúncia de Morales, alegando que é um aspecto superado. Já os congressistas leais ao líder indígena pretendem rejeitar sua saída, com o argumento de que foi pressionado pelos militares.

A convocação para eleições é um mandato assumido por Áñez, ao ocupar a presidência do país há uma semana, assim como a formação de um novo Tribunal Supremo Eleitoral (TSE), depois que todas as autoridades deste órgão foram detidas.

A prisão e a investigação das autoridades do TSE se deram após uma auditoria da Organização dos Estados Americanos (OEA) apontar irregularidades na eleição que teve o agora ex-presidente Evo Morales como vencedor, frente ao candidato Carlos Mesa.

– Resolução da OEA

Nesta quarta-feira, a maioria dos 35 países que compõem a OEA aprovou uma resolução para pedir que a Bolívia convoque novas eleições “urgentemente”. O texto foi aprovado com 26 votos a favor; México, Nicarágua e São Vicente e Granadinas, contra; quatro abstenções; e uma ausência.

A representante da Bolívia, Ivanna Bracamonte, votou a favor da resolução.

Proposto por Colômbia e Brasil, o texto orienta a secretaria-geral da OEA a dar à Bolívia todo apoio técnico “para que se dê início imediato ao processo eleitoral, em conformidade com os princípios de transparência, independência, credibilidade e confiança”.

A resolução pede ainda a todos os atores políticos e à população em geral “o imediato fim da violência” e pede às autoridades que garantam, “de maneira plena e irrestrita”, o respeito e a proteção dos direitos humanos.

A OEA é composta por 35 membros, mas, na prática, são 34, já que Cuba não participa.

– Evo denuncia ‘genocídio’

O ex-presidente Evo Morales insistiu, nesta quarta-feira (20), em que a repressão dos protestos é um “genocídio” na Bolívia.

“Na Bolívia, depois do golpe de Estado, temos cerca de 30 mortos. Este massacre é parte de um genocídio que ocorre em nossa querida Bolívia”, disse Morales, em entrevista coletiva na Cidade do México, para onde embarcou após renunciar e se encontra na condição de asilado político.

“Estão matando meus irmãos e irmãs”, completou.

“Faço um apelo à Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) e à ONU para que denunciem e freiem este massacre de irmãos indígenas que pedem paz, democracia e respeito à vida nas ruas”, escreveu Morales, em sua conta no Twitter.

Do exílio, Morales lembrou que, após a interrupção da ordem constitucional, o Congresso boliviano não cumpriu o requisito de avaliar se aceitava, ou não, sua renúncia.

“Não permitem que volte para a Bolívia. Se a Assembleia (Congresso) não avaliou minha renúncia, eu sou presidente, e ainda, presidente eleito no primeiro turno”, reivindicou Morales na mesma coletiva de imprensa.

A Procuradoria Geral da Bolívia confirmou nesta quarta-feira que oito pessoas morreram na terça-feira, em uma operação policial-militar em uma fábrica de combustíveis na cidade de El Alto, vizinha a La Paz, depois de um primeiro balanço que havia apontado três mortes.

O Instituto Médico Legal da Procuradoria Geral informou em comunicado que “se evidencia objetivamente oito corpos”, fazendo o total do número de mortos subir para 32.

– Suposta conversa de Evo com ‘cocalero’

O ministro interino de Governo da Bolívia, Arturo Murillo, apresentou nesta quarta uma gravação de áudio, a qual ele atribui ao ex-presidente Evo Morales. Nela, um homem instrui um líder “cocalero” a sitiar as cidades e cortar o abastecimento de alimentos.

“Que não entre comida nas cidades. Vamos bloquear, cerco de verdade”, afirma a voz, em uma comunicação com o dirigente “cocalero” Faustino Yucra Yarmi, que “tem sentença executada por tráfico de drogas”, relatou o ministro.

Ainda de acordo com Murillo, em uma entrevista coletiva, Morales “ordena que não entre comida nas cidades. Isso é um crime de lesa-humanidade. Nas próximas horas, apresentaremos a demanda internacional sobre isso”.

Na mesma entrevista, ele também divulgou um texto que seria a transcrição deste suposto telefonema.

Segundo Murillo, o ex-presidente “está fazendo terrorismo”.

“Não é possível que Evo continue colocando bolivianos em confronto com bolivianos, que ordene que não entre comida. É um crime de lesa-humanidade”, insistiu.

No áudio, a mesma voz afirma: “Quando me expulsaram do Congresso em 2002, bloquearam e, agora, me expulsam da Bolívia, e há bloqueio. Vamos ganhar”.

Na gravação, o homem suspeito de ser Evo Morales diz a Yucra que, se o Congresso rejeitar sua renúncia, vai “tentar entrar” no país, mesmo correndo o risco de ser preso.

SWI swissinfo.ch - sucursal da sociedade suíça de radiodifusão SRG SSR

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