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Temer visita a Rússia, enquanto no Brasil prossegue ebulição política

O presidente Michel Temer desembarca no Aeroporto Vnukovo, em Moscou, em 20 de junho de 2017 afp_tickers

O presidente Michel Temer fazia visita oficial à Rússia nesta terça-feira, mas mesmo na função de chefe de Estado com estatura global, precisava zelar para controlar as disputas pelo poder que deixou no Brasil.

A retórica adotada pelos protagonistas desta batalha é suficiente para definir o clima de tensão que impera no país: “Guerra”, “Estado policial”, “organização criminosa” são alguns dos termos mais utilizados nos últimos dias.

Três anos de investigações da operação ‘Lava Jato’ revelaram a corrupção endêmica que corrói a elite política e econômica brasileira.

“Estamos, como instituição, em guerra contra um inimigo sem rosto”, afirmou na segunda-feira o Procurador-geral da República, Rodrigo Janot.

A batalha principal é travada em torno das suspeitas investigadas por Janot de que Temer recebeu propina e foi cúmplice da tentativa de comprar o silêncio do deputado cassado Eduardo Cunha (PMDB/RJ), preso em Curitiba.

Temer é “o chefe da organização criminosa mais perigosa do país”, afirmou o empresário Joesley Batista, um dos donos da gigante agroalimentar JBS, que gravou o presidente sem seu conhecimento durante uma conversa em que aparentemente ambos abordaram o tema da propina a Cunha.

Batista entregou a gravação à Justiça, no âmbito de um acordo de delação premiada.

Segundo a imprensa, a Polícia Federal (PF) corroborou em suas investigações preliminares estas alegações. E o país está sobressaltado, aguardando que as perícias sobre a gravação terminem (a PF pediu mais cinco dias) e que Janot apresente uma denúncia formal contra Temer.

Se isto ocorrer, o Supremo Tribunal Federal (STF) precisará da autorização de dois terços da Câmara de Deputados para colocar o presidente no banco dos réus.

Amigos influentes

Mas a descontração demonstrada por Temer ao deixar o país em meio à crise para visitar Rússia e Noruega não é uma ostentação imprudente, visto que por mais impopular que seja, e por mais que a ‘Lava Jato’ se aproxime dele, o presidente continua mantendo amigos poderosos, antigos ou circunstanciais.

Entre eles, vários deputados tão ameaçados quanto ele, inclusive de partidos de esquerda, que provavelmente preferem evitar que seja julgado e voltar seus ataques aos supostos excessos nas investigações que revelaram um enorme esquema de propinas na Petrobras.

A capa da última edição da revista Veja mostra Temer a bordo de uma canoa ao lado do senador suspenso Aécio Neves (PSDB/MG) e seu arqui-inimigo e antecessor, o petista Luiz Inácio Lula da Silva (2003-2010).

Os três, segundo a Veja, estão unidos “em um projeto desesperado de sobrevivência e de luta contra a mais bem sucedida operação de combate à corrupção da história brasileira”.

Um dos principais críticos da ‘Lava Jato’ é o presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) e membro do STF, Gilmar Mendes, que este mês definiu a votação que rejeitou as acusações de que a eleição de 2014 foi financiada com dinheiro da corrupção. Se tivesse sido aceita, a denúncia poderia anular o mandato de Temer.

Ainda assim, Temer teve que comentar em Moscou a situação no Brasil, quando seu projeto de reforma trabalhista, apoiada pelos mercados, sofreu uma derrota imprevista em uma comissão do Senado.

“O que importa é (a votação em) o Plenário” do Senado. “Ali o governo vai ganhar”, afirmou.

“Ditadura” do Judiciário

Na segunda-feira, Gilmar Mendes advertiu para o risco de uma “ditadura” do Judiciário.

“Vamos abominar, sim, as más práticas, mas não se faz política sem política e sem políticos. Deus nos livre de uma ditadura de promotores ou de juízes. Os autoritarismos que vemos por aí já revelam que não teríamos um governo, mas uma ditadura de promotores ou de juízes”, declarou, durante conferência no Recife.

Políticos e juristas também questionam o recurso a prisões preventivas e delações premiadas.

O STF deve decidir na quarta-feira se revê o acordo feito com Joesley Batista, considerado benevolente demais por seus críticos. Se a corte decidir voltar atrás, todo o sistema poderia ser questionado.

SWI swissinfo.ch - sucursal da sociedade suíça de radiodifusão SRG SSR

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