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Venezuela oferece vacina candidata cubana em meio a fé, desinformação e críticas

Um profissional de saúde segura um frasco da vacina candidata cubana Abdala, em 30 de junho afp_tickers

“Com fé e em nome de Deus”, diz Elide Maldonado antes de receber a primeira dose da Abdala em Caracas, sem maiores informações sobre a candidata cubana à vacina anticovid, recebida com críticas do sindicato médico venezuelano por não ter sido aprovada pela OMS.

Maldonado afastou as dúvidas que o faziam questionar a picada em um pequeno auditório montado para dias de vacinação no Forte Tiuna, principal complexo militar da capital venezuelana.

“Que a vacina não funciona, não sei o quê. Mas não! Uma coisa que você tem que fazer é pesquisar na internet, descobrir, se informar e ter fé”, disse a professora de pré-escola de 46 anos.

Ela também não teve muita escolha em um país onde o plano de vacinação funciona de forma lenta e aleatória.

O laboratório estatal cubano que desenvolveu a Abdala afirma que ela é 92% eficaz, mas médicos venezuelanos, ONGs e a oposição estão céticos em relação a este produto, que ainda aguarda autorização da Organização Mundial de Saúde (OMS) e até da agência reguladora cubana.

“Por se tratar de um produto experimental, não deve ser aplicado na população em geral, já que não há informações sobre sua eficácia”, alertam as principais academias do país em comunicado conjunto.

– “Cobaias” –

A Venezuela, com quase 30 milhões de habitantes, registra cerca de 270.000 casos de covid-19 com 3.101 mortes, segundo dados oficiais, entre as queixas de um alto sub-registro.

Segundo a Organização Pan-Americana da Saúde (OPAS), 1,2 milhão de pessoas receberam a primeira dose na Venezuela, enquanto apenas 224 mil a segunda.

São fornecidas a vacina russa Sputnik-V e a do laboratório chinês Sinopharm, enquanto o governo negocia a compra de vacinas pelo sistema Covax da OMS, após vetar a AstraZeneca por possíveis efeitos colaterais.

O plano de vacinação começou em fevereiro, mas há apenas um mês começou foi ampliado para dezenas de centros em todo o país.

Agora chega a Abdala, da qual o governo de Nicolás Maduro anunciou ter comprado 12 milhões de doses de Cuba, um de seus principais aliados. Uma doação de 30.000 doses de Havana chegou na semana passada.

Ela será usada por 10.000 pessoas, já que essa vacina candidata requer três aplicações. “Você seria vacinado com isso? Acho que a resposta é óbvia”, atacou o líder da oposição Juan Guaidó na terça-feira.

“Se essa vacina for aprovada pela comunidade científica internacional, bem, bem-vinda. Nós, venezuelanos, não devemos ser cobaias.”

– “Confiável” –

No Forte Tiuna, a equipe médica cubana recebeu oficiais, militares e civis com máscaras, em pequenos grupos.

O auditório que sediou o dia é um dos três pontos habilitados no complexo, primeiro local de vacinação com a Abdala na Venezuela, que iniciou sua aplicação no último sábado.

Mariucy Bravo não a conhecia. “Ouvi dizer que foi agora”, reconhece esta operária do metrô de 21 anos, quando recebeu a ligação no WhatsApp pela manhã.

“Seja russa, chinesa ou cubana, acho que as pessoas devem ser vacinadas”, diz Andrés Febres, comerciante de 25 anos que espera em silêncio as reações adversas à inoculação, sentado em uma arquibancada ao lado de trinta outras pessoas.

Ele afastou rumores de seus conhecidos de que “não o fizeram por medo” e preferiu aceitar a Abdala a continuar esperando sua vez de receber a vacina ser determinada pelo Estado.

Pessoas com mais de 60 anos recebem Sputnik-V, mas não foi possível para Víctor Ilarraza, 78 anos. “ Me chamaram para tomar a vacina russa, mas fui várias vezes: não tinha vacina ou senha, tem que chegar às 3 da manhã (para entrar na fila) ”, narra.

A Abdala, que ele chama de “confiável”, foi então sua alternativa: “Não acho que o governo traria essa vacina por trazer …”.

SWI swissinfo.ch - sucursal da sociedade suíça de radiodifusão SRG SSR

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