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Alpinistas lembram uma escalada “impossível”

Max Eiselin mostras as botas que usou para escalar o Dhaulagiri em 1960 swissinfo.ch

Há exatamente 50 anos um jovem alpinista suíço conseguiu realizar um feito considerado quase "impossível" para a sua época: escalar o Dhaulagiri, a sétima montanha mais alta do mundo, no Nepal.

Esse jovem, Max Eiselin, vinha de Lucerna e tinha apenas 28 anos. Ele já havia tentado uma vez conquistar o pico, que é um dos quatorze no mundo com mais de oito mil metros de altura.

Eiselin revelou à swissinfo.ch que, graças à ideia de uma melhor rota e um pouco de criatividade, sua liderança ajudou seis membros da expedição a atingir o pico em 13 de maio de 1960.

Evitando depender do apoio financeiro de empresas, Eiselin e sua equipe descobriram uma forma única de angariar fundos de cidadãos comuns. E sua expedição foi também a primeira no montanhismo a utilizar aviões para deslocar pessoas e suprimentos de vales nepaleses até o alto das montanhas.

“Ele era considerado impossível, difícil para diabo”, comenta Eiselin, ao se referir ao Dhaulagiri. “Naturalmente isso atiçava os alpinistas mais jovens. Eles queriam provar que eram bons o suficiente para escalar algo considerado como impossível.”

Voltando aos anos 1950, muitos alpinistas disputavam entre si para ver quem seria o primeiro a chegar ao topo dos picos no Himalaia, alguns dos poucos lugares ainda intocados do Planeta. E, com eles, o orgulho das nações.

Foi orgulho francês – e dinheiro do governo – por trás da expedição que se tornou a primeira, em 1950, a chegar ao cume de uma montanha com mais de oito mil metros de altura.

Se a equipe francesa comemorava o sucesso de ter alcançado o topo do Annapurna, seu objetivo inicial era o Dhaulagiri. Os alpinistas haviam mudado o percurso após examinar o pico, qualificando-o de “impossível”.

Uma febre

Os suíços, especialmente Eiselin, também estavam contaminados pela febre de conquista.

Sentado entre as botas resistentes e cordas de alpinismo na filial de Lucerna da sua cadeia de lojas esportivas – a Eiselin Sport – Eiselin, hoje com 78 anos, continua magro e em forma. Ele revela que começou a matutar sobre uma possível escalada do Dhaulagiri em 1953, quando assistia a uma palestra sobre as possíveis rotas.

Em 1958, ele foi selecionado para participar de uma expedição suíça à montanha. O governo do Nepal permitia apenas que um grupo por ano tentasse conquistar esse objetivo. E, desde a primeira delas, todos iam pelo mesmo percurso ao cume.

“Lá percebi que todas as expedições prévias haviam tomado o caminho errado”, diz com um sorriso no rosto.

Ele fez lobby para receber uma autorização e, com ajuda de suíços que viviam no subcontinente indiano, conseguiu organizar uma expedição para 1960.

Eiselin tinha um ano para preparar tudo. Tudo que tinha de fazer era montar a equipe, juntar o dinheiro necessário para custear a empreitada e evitar as mesmas armadilhas das tentativas anteriores.

Genialidade logística

Ele selecionou cinco alpinistas suíços, assim como outros europeus para completar o grupo. O primeiro desafio foi coletar arrecadar o dinheiro. Ao invés patrocinadores empresariais, a equipe simplesmente abriu uma conta bancária. Depois os jornais helvéticos publicaram os planos e o número da conta, assim como a história da promessa: que um cartão postal seria enviado do Nepal para todos aqueles que contribuíssem com a aventura.

“Pensava que valia pelo menos fazer a tentativa”, conta Eiselin. “Eu estava cético em relação a isso.”

Quantias tão pequenas como cinco francos chegavam de todas as partes da Suíça, assim como doações de cidadãos em outros países europeus. “Sem esses cartões postais, a expedição não teria sido possível”, diz.

Depois Eiselin atracou-se ao problema de arrumar os suprimentos necessários para a aventura ao Dhaulagiri.

A caminhada do vale até a montanha levava normalmente cinco dias. Era necessário levar vários acampamentos de forma progressiva quanto mais se subisse a encosta. Os alpinistas precisavam se aclimatar. Essa missão exigia normalmente um pequeno exército para levar os víveres.

Para economizar tempo e dinheiro, Eiselin queria tentar utilizar um avião. Assim ele contratou dois pilotos suíços – Ernst Saxer e Emil Wick, os dois originários de St. Gallen (nordeste da Suíça) – para pilotar um avião apelidado “Yeti”. Os pilotos tinham muitas horas de experiência em sobrevôo de montanhas, incluindo também aterrissagem sobre geleiras.

Em uma entrevista dada no começo deste ano, Eiselin lembra-se das reações ao plano. “Entenda que até para meus melhores amigos, essa ideia de usar um avião de geleiras era vista como um absurdo”, lembra-se.

Na montanha

No entanto, o Yeti conseguiu transportar homens e material a 5.700 metros, uma proeza que continua sendo um recorde da aeronáutica.

A expedição também viveu alguns revezes. Um problema mecânico obrigou o avião a ficar no solo, levando Eiselin a descer ao vale para consertá-lo. “Nesse tempo perdi a minha aclimatação”, diz.

Então o Yeti caiu quando estava decolando a 5.700 metros. Os pilotos se salvaram, mas o avião não podia mais ser consertado e acabou ficando na montanha.

A expedição teve de se dividir em pequenas equipes, sendo que uma delas já estava para alcançar o cume.

Foi quando – exatamente há 50 anos – em um dia de céu azul, esse grupo chegou ao seu principal objetivo. Ele era composto pelos alpinistas suíços Peter Diener, Ernst Forrer e Albin Schelber, assim como pelo austríaco Kurt Diemberger e dois sherpas.
“Essa foi a expedição que conseguiu fazer a primeira ascensão internacional de um pico de oito mil metros sob organização suíça”, revela Diemberger à Federação Internacional do Montanhismo e Alpinismo (UIAA, na sigla em inglês), baseada na Suíça.

Mais de uma semana depois, dois outros suíços da expedição, Hugo Weber e Michel Vaucher, também chegaram ao pico.

Eiselin tinha muita esperança de conquistar esse desafio, porém não estava surpreendido pelo fracasso.

“Para mim as chances eram muito reduzidas, já que era responsável pela logística”, lamenta-se.

Relembrando

Fãs do alpinismo e grandes nomes do passado se encontraram em 13 de maio no Nepal para celebrar o jubileu de ouro da primeira escalada do Dhaulagiri, um evento organizado pela Associação Nepalesa de Montanhismo.

“O êxito da escalada do Dhaulagiri em 1960 tem uma grande importância para o desenvolvimento global do turismo de montanhas no Nepal”, afirma Ang Tshering Sherpa, presidente da associação. “Ela incrementou as atividades de montanhismo na região do Dhaulagiri, com a melhoria das condições econômicas da população.”

Eiselin não pode viajar ao Nepal para as celebrações, mas pôde pelo menos se encontrar com Diener para um café e um bate-papo sobre as lembranças do passado.

Dos membros suíços da equipe, apenas Eiselin e Diener continuam vivos. A atratividade do Himalaia não é mais o que costumava ser. “Agora prefiro estar perto casa”, explica Eiselin, referindo-se às suas caminhadas nas montanhas próximas de Lucerna.

Em tempos de telefonia por satélite e roupas “high-tech”, ele continua sentindo orgulho pela conquista da sua equipe. “Foi uma expedição muito aventurosa e perigosa também. Mas em todas as escaladas, nenhum de nós se machucou”, lembra-se.

Heidi Hagemeier, swissinfo.ch
(Adaptação: Alexander Thoele)

Nos anos que seguiram a expedição, o suíço fez palestras e escreveu um livro para contar suas experiências: “A ascensão do Dhaulagiri”.

Na sua loja em Lucerna, Eiselin exibe uma das suas botas utilizadas na escalada, feitas com pele de rena da Noruega e costurada à mão na Itália.

Dhaulagiri é a sétima montanha mais alta do mundo. Está localizada na cordilheira do Himalaia, na parte centro-norte do Nepal. Seu nome significa a montanha branca.

Após a sua descoberta em 1808 pelo mundo ocidental, o Dhaulagiri ficou conhecido como sendo a montanha mais alta no mundo. Isto permaneceu por vários anos, até ser ultrapassada pela estimativa da altitude do cume do Kangchenjunga em 1852.

O Dhaulagiri foi escalado pela primeira vez em 13 de maio de 1960, por Kurt Diemberger, Peter Diener, Ernst Forrer, Albin Schelbert, Nyima Dorji e Nawang Dorji, componentes de uma expedição helvético/austríaca. Esta era também a primeira escalada no Himalaia auxiliada por um avião. O avião, porém, deixou de funcionar durante a aproximação e foi abandonado na montanha. O primeiro português a atingir o seu cume foi João Garcia, em 24 de Setembro de 1994, sem recurso a oxigénio artificial. (Texto: Wikipédia em português)

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