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Auxílio humanitário suíço à Coreia do Norte é desvinculado da política

O líder norte-coreano Kim Jong-un sendo recebido por oficiais durante parada militar
As provocações do líder norte-coreano Kim Jong-un deixam o mundo em suspense. Os recentes lançamentos de mísseis e testes atômicos tem causado diversas crises internacionais Keystone

A Suíça é um dos poucos países que ainda prestam ajuda humanitária à Coréia do Norte, apesar dos testes nucleares e de mísseis dessa ditadura asiática. O chefe da agência suíça de desenvolvimento em Pyongyang, Thomas Fisler, explica os motivos. 

Fisler, diretor do Escritório Suíço de Cooperação na Coreia do Norte, falou à rádio pública SRF na segunda-feira. A entrevista, em dialeto suíço-alemão, foi transcrita em partes e traduzida pela swissinfo.ch.

Os líderes da Coreia do Norte chocaram o mundo com uma série de lançamentos de mísseis e testes nucleares nos últimos dois meses, provocando uma áspera reação internacional. A Suíça, por sua vez, não pretende suspender sua ajuda humanitária, e a presidente Doris Leuthard reafirmou na segunda-feira a vontade do país de agir como mediador e ajudar a resolver a crise. 

A Coreia do Norte foi atingida por inundações em meados da década de 1990, prejudicando as safras e a infra-estrutura, e resultando em fome generalizada. 

SRF: Sobre os problemas na Coreia do Norte, comecemos pela pobreza. Há relatos sobre uma situação crítica em várias partes do país, e comparações foram feitas com a África. Isso é justificado? 

Thomas Fisler: É uma questão problemática, na minha opinião. A situação geográfica e o clima são completamente diferentes.

Retrato de Thomas Fisler
Thomas Fisler passou os últimos quatro anos na Coreia do Norte trabalhando para a Agência Suíça de Desenvolvimento e Cooperação (SDC), e agora est’a deixando o cargo para se aposentar SRF-SWI

Mas há fatos inegáveis. É verdade, por exemplo, que uma em cada quatro ou cinco crianças menores de cinco anos sofre de desnutrição. Este é também um dos motivos do engajamento da Suíça. A pobreza é a principal causa das doenças.

SRF: O senhor menciona a fome e uma alta taxa de mortalidade infantil. Como o senhor se sente ao testemunhar tais casos? 

T.F .: Nem sempre é fácil detectar os sintomas imediatamente. Você precisa ser um especialista para saber se uma criança sofreu desnutrição ou falta de comida. Ou que a idade não condiz com o tamanho do corpo. Essa é a diferença com os casos que conhecemos a partir de imagens de crianças na África. (…)

SRF: A Suíça tem prestado auxílio humanitário à Coreia do Norte desde 1995. Não é questionável ajudar um regime tão controverso?

T.F .: a ajuda humanitária da Suíça não depende de uma situação política particular. Nós fornecemos assistência humanitária sempre que for necessário em todo o mundo. Especialmente nos casos em que temos garantia de que nosso auxílio beneficia aqueles que precisam disso. Portanto, temos nossos escritórios em vários outros países e esse é o meu trabalho.

SRF: A assistência suíça para a Coréia do Norte causa controvérsia entre o público suíço. Como o senhor costuma justificar a posição oficial?

T.F .: A ajuda humanitária é regularmente colocada em um contexto político. No entanto, este não é o nosso mandato. Temos de ajudar aqueles que estão em necessidade.

SRF: A maioria das organizações internacionais deixou a Coreia do Norte, algumas por vontade própria, ou por pressão do regime em Pyongyang. Por que a agência de desenvolvimento suíça ainda está presente?

T.F .: É porque ainda temos a oportunidade de fornecer ajuda. Somos aceitos. Esse é um dos motivos. Outras organizações de desenvolvimento tiveram problemas porque seus países atacaram a situação política. Ou porque seus orçamentos foram cortados ou reduzidos por causa da política da Coreia do Norte. No entanto, a assistência da Suíça permaneceu relativamente estável nos últimos cinco a sete anos.

SRF: Isso porque a Suíça é um país neutro?

T.F .: Sim, tenho certeza. Muitas vezes ouvimos que o envolvimento da Suíça é apreciado. Eu ouço do lado coreano que há um acordo entre as partes e que acham útil o que fazemos.

SRF: E quanto a compromissos? O senhor confia na boa vontade das autoridades norte-coreanas?

T.F .: Nós conseguimos alcançar um nível de cooperação que funciona bem. Existe uma certa confiança em todos os níveis que nos permite atingir as nossas metas. (…)

SRF: O programa da Agência Suíça de Desenvolvimento e Cooperação (SDC) prevê um orçamento de 30 milhões de francos (US$ 31,2 milhões) para os próximos quatro anos. Esse dinheiro é gasto para quê?

T.F .: Nós focamos em duas coisas: suprir alimentos e na construção de instalações de água potável. A água limpa é o primeiro passo para melhorar a saúde e a higiene. Muitos bebês sofrem de doenças causadas por água contaminada. Uma grande parte do dinheiro vai para entregas de leite em pó pelo Programa Mundial de Alimentos. O pó é usado para processar um biscoito nutritivo contendo vitaminas. Esses biscoitos, produzidos na Coreia do Norte, são entregues a crianças com até cinco anos em lares e creches. (…) Outro setor é a agro-silvicultura. Tentamos estancar a erosão do solo e ajudar a estabilizar a terra inclinada. (…) Na década de 1990, vastas extensões de terras montanhosas foram desmatadas para plantar milho. Ajudamos a re-florestar as encostas para estabilizá-las e cultivar plantios adequados.


Adaptação: Eduardo Simantob

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