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Todos o chamam de Antônio

Um dos muitos desenhos de Anhorn. Pedro Gabriel

O autor que conquistou as redes sociais e assina um dos livros mais vendidos no Brasil atualmente também atende por Pedro ou Gabriel. Filho do suíço Roland Anhorn e da brasileira, Carmem Gabriel, Pedro Antônio Gabriel Anhorn nasceu na África há 29 anos, foi morar no Brasil (Rio de Janeiro) e está prestes a passar uma temporada na Suíça (Cóira, leste), local que tem como importante fonte de inspiração para suas criações.

Educado em francês, aprendeu a falar português, conhece a história das línguas africanas e entende um pouco o suíço-alemão da sua família paterna. A mistura transformou para ele a linguagem em um fascínio. Mais do que isso, o inspirou a criar uma combinação de poesia ilustrada por meio de desenhos rabiscados em guardanapos de papel que se espalhou pelas redes sociais.

Com o uso de metáforas e trocadilhos para criar pequenos textos, ele fala de emoções, lembranças, sentimentos e do cotidiano. Porém, o que pode parecer simples, ou talvez até por isso, arrebatou milhares de fãs ao ser ilustrado por um talento particular de Pedro Antônio que acredita que a sua formação em publicidade também o possa ter ajudado a ter um olhar mais aguçado para as imagens, a redação e a tipografia.

Hoje já são mais de 600 mil fãs na sua página do Facebook ( além de 220 mil seguidores no Instagram e quase 6 mil seguidores no Twitter), até agora. E com um detalhe, sem ações de venda de anúncio na rede.

Tanto interesse do público chamou atenção do mercado de livros, fazendo com que a editora Intrínseca apostasse no seu talento. A partir daí, a poesia que ilustrava os guardanapos da mesa de bar e que foram parar na internet chegou às prateleiras com o lançamento do livro “Eu me chamo Antônio” no final de 2013. A previsão é que, em breve, ele esteja também em um canal no YouTube em uma versão stop motion, como o próprio Antônio conta a seguir:

swissinfo.ch: Você diria ter alguma influência suíça no seu trabalho de transformar letras e desenhos em arte e poesia?

Pedro Antônio: A influência do meu pai e da minha avó sempre foram muito importantes na minha formação e na minha vida. Lembro muito do humor e do jeito do meu pai e isso se reflete no que escrevo e desenho. Quando uso palavras como saudade e distância, sem dúvida, até inconscientemente

swissinfo.ch: Você nunca morou na Suíça?

P.A.: Não. A Suíça para mim é sinônimo de férias e lazer, onde sempre ia uma vez por ano, após o período escolar. No segundo semestre deste ano, no entanto, vou passar algum tempo morando com o meu pai.

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swissinfo.ch: De que maneira o caldeirão cultural da sua formação influencia a sua criatividade?

P.A.: Nasci na África, na capital do Chade, N’Djamena, por conta do trabalho do meu pai voltado para as causas humanitárias. Aos 5 ano fui morar em Cabo Verde, ainda na África, e aos 12 no Brasil, no Rio de Janeiro, com a minha mãe, depois que eles se separaram. A língua do meu pai é o suíço-alemão, a da minha mãe português, mas eles se falavam em francês, desde que se conheceram na faculdade, na Suíça. Eu fui educado em francês e até os 12 anos não formulava uma palavra de português, o que me fez prestar muita atenção nas grafias e na sonoridade da língua.

swissinfo.ch: E como começou a rabiscar os desenhos e a criar as frases que deram origem ao livro “Eu me chamo Antônio”?

P.A.: Em outubro de 2012, voltava para casa depois do trabalho, mas como estava muito trânsito, parei em um bar tradicional do Rio, o Café Lamas, e pedi um chope. Enquanto esperava, fiquei rabiscando em um guardanapo sem nenhuma pretensão de transformar aquilo em alguma coisa.

swissinfo.ch: O que escreveu?

P.A.: “Primeiro o encanto depois o desencanto, por fim cada um pro seu canto”. Um resumo das relações amorosas, que não entrou no livro, mas guardei, colocando em um quadro.

Pedro Gabriel

swissinfo.ch: Era dedicado a alguém especial?

P.A.: Não estava pensando em uma pessoa especificamente, mas de maneira inconsciente, certamente, foi uma referência a algum relacionamento.

swissinfo.ch: E a partir daí nasceu a “fan page”?

P.A.: Como gostei do resultado, e até pela fragilidade do papel, achei melhor tirar uma foto com o celular para guardar de alguma forma aquele desenho. Passei a fotografar todos que fazia. No mês seguinte, em novembro, quando percebi tinha muitas imagens salvas e muitos guardanapos na gaveta, decidi então armazenar tudo aquilo em uma página no Facebook, e aí surgiu “Eu me chamo Antônio”.

swissinfo.ch: E por que usar Antônio e não Pedro, o seu primeiro nome?

P.A.: Pedro era o nome do avô da minha mãe e Anton do meu avô suíço. Gabriel é meu sobrenome por parte de mãe e Anhorn por parte de pai. Ninguém me conhecia antes como Antônio. Então foi uma forma de lembrar de um nome que estava esquecido na minha identidade. Acho que é através dele que eu consigo falar de um personagem criado para dar vida a ele mesmo, uma forma de eu me distanciar e continuar próximo.

swissinfo.ch: Você estudou caligrafia ou outra coisa para aperfeiçoar sua estética?

P.A.: Sempre foi tudo muito intuitivo, mas fiz uma oficina de caligrafia durante um mês, porém não me acostumei com o uso da pena.

swissinfo.ch: Há algum artista suíço que de alguma maneira tenha lhe inspirado?

P.A.: Em uma das minhas férias, em 2005, vi umas paredes na cidade do meu pai, Chur (Cóira. leste), pintadas com figuras humanas, que gostei muito. Sem dar muitos detalhes, meu pai falou que o conhecia. Tempos depois, em 2010, ele me levou para visitar o ateliê dele, quando soube então que se chamava Robert Indermaur, e que eram amigos. Inspirado nele, passei a criar alguns desenhos nos guardanapos, fazendo uma montagem com as imagens dos quadros dele no fundo.

swissinfo.ch: Como faz para manter a periodicidade dos posts?

P.A.: Escrevo por me sentir inspirado. Eu entendo que a internet tem outro ritmo, mas não me forço a escrever.

Pedro Gabriel

swissinfo.ch: Você recebeu influências de três culturas muito diversas: a africana, a suíça e a brasileira. De que maneira, isto contribuiu para sua sensibilidade e olhar estético?

P.A.: A cultura africana representa para mim muito a infância. Minha avó fala que desenho arabescos e muitas vezes palavras difíceis de ler por conta do formato. Nunca fiz pensando exatamente na África, mas vejo similaridades, como com os traços das máscaras africanas. Acho que no meu incosciente os meus desenhos estão ligados a minha vida por lá. O Brasil também aparece na minha letra, que tem a descontração do carioca, as curvas da cidade do Rio. Eu me inspiro na criatividade do povo brasileiro e tenho um carinho grande pela língua portuguesa. Ainda assim, não sei dizer se a influência é mais suíça, brasileira ou africana. Acho que tudo junto. Se eu não tivesse nascido na África, meu pai não fosse suíço e minha mãe não fosse brasileira, o resultado não seria este. Somos aquilo que vivemos, e o livro resume as minhas origens.

swissinfo.ch:. Imagino que goste de todos os desenhos, mas tem algum especial?

P.A.: Tem um desenho que é uma cadeira sem ninguém e a frase “Saudade é te ver sentada onde não te vejo mais”. Fiz para minha avó Carolina Anhorn, minha avó Lina!

swissinfo.ch:. O que virá depois do livro?

P.A.: Quero fazer um stop motion de cada guardanapo para internet. Quero mostrar como nasceu cada um deles. Vai dar trabalho, mas como também nunca imaginei que os guardanapos pudessem virar livro…

swissinfo.ch:. Você escreveu que trafega “pelo mundo com a cabeça grudada nas nuvens e as patas fincadas no chão”, como uma girafa. O que lhe faz sonhar e o que lhe mantém no chão?

P.A.: Eu penso muito, não sou de agir por impulso, sonho com cuidado, embora sonhe alto. Tenho consciência da realidade, o que herdei muito do meu pai. Sou chato com horários e organizações. Mas tenho um lado da minha mãe, mais “open mind”, menos metódico… Enfim, sou muito suíço-brasileiro (risos).

Feliz com o reconhecimento do seu talento, Pedro Antônio Gabriel Anhorn procura, no entanto, evitar que a demanda por mais produção prejudique o seu processo criativo. Para ele, embora a visibilidade nas redes sociais exija uma certa pressão para publicar sempre novos posts, ele tenta preservar a sua inspiração longe da produção em “escala industrial”. Até porque, para ele, é justamente a inspiração genuína de cada frase e de cada desenho, refletindo pensamentos e sentimentos que ele tem ou que observa ao seu redor, que conquistou seus fãs da internet.

Inspiração e referências que ele tira de vários locais e pessoas, como a imagem infantil de uma girafa que tem em mente desde o tempo em que morava na África. O animal escolhido foi uma sugestão dos pais, que estimulavam cada um dos quatro filhos a adotar um bicho africano como “amigo”. Pedro Antônio escolheu a girafa – “poetas gigantes que observam o mundo, manchadas pela tinta de suas canetas”, como definiu em um dos seus guardanapos ilustrados.

Assim como elas, ele diz ainda manter a cabeça nas “nuvens”, mas com os pés bem no chão. Um contraponto que se torna ainda mais evidente pela mistura de perfis típicos e muitas vezes tão diferentes que carrega no sangue. “Como a combinação da descontração e da criatividade brasileiras com a ponderação e o extremo detalhismo suíços que herdei dos meus pais”, afirma Pedro Antônio.

A editora Intrínseca, responsável pela publicação do livro “Eu me chamo Antônio”, já registrou a venda de mais de 70 mil exemplares, do total de 100 mil impressos até agora, desde que foi lançado no final de 2013. É o oitavo livro mais vendido da editora, estando entre os cinco mais vendidos nas principais redes de livrarias brasileiras, como Saraiva, Livraria Cultura e Livraria da Vila. Além de ser vendido também pelo e-commerce dessas redes e outros sites de venda de livros, “Eu me Chamo Antônio” também pode ser encontrado por meio de e-book.

Tanta procura não é para menos. O trabalho de Pedro Antônio tem sido listado nos ranking das melhores páginas de Facebook. Entre eles o da revista Superinteressante, uma publicação da Editora Abril.

Mesmo reconhecimento recebeu da revista cultural Bula, que incluiu a fan page no ranking das 20 melhores páginas do Facebook do ano passado

E se depender da editora Intrínseca nenhum leitor ficará sem atenção. Pedro Antônio já tem uma agenda lotada para uma série de sessões de autógrafos pelo Brasil.

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