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Betty Bossi: a mais antiga “influencer” da Suíça

Ilustração de mulher
"O que devo cozinhar hoje?" Betty Bossi perguntava e depois já oferecia a solução na forma de uma criativa receita. zvg

Para quem não conhece, Betty Bossi é uma personagem ficcional criada pelo grupo Unilever em uma campanha publicitária nos anos 1950. Hoje, a marca e o grupo editorial responsável por seus influentes livros de cozinha pertencem ao grupo suíço de supermercados Coop. Durante a quarentena, a cozinheira virtual da Suíça mostrou que está em plena forma.

Betty Bossi deve ter se sentido como se fosse a personificação feminina da Suíça, ou seja, a própria figura da Helvécia. Na pandemia do vírus corona, ela quis estar presente junto ao povo deste país. Quando os suíços não mais puderam ir a restaurantes, e foram forçados a voltar para seus próprios fogões, chegou a hora e a vez de Betty Bossi.

Ela desbloqueou receitas digitais de 120 de seus livros de receitas e de panificação. Estas receitas estavam disponíveis somente mediante uma taxa, e com a liberação, ela mostrou aos cidadãos como fritar hambúrgueres e assar pão de banana. Com a garantia de sucesso de sempre, o golpe de marketing deu certo e os suíços fizeram mais de dez milhões visitas a seu website em um único mês.

Vitrina da culinária suíça

Betty Bossi e Helvécia têm algo em comum: elas não existem realmente. E, no entanto, elas são duas luminares suíças que todos pensam conhecer. A figura da Helvécia, armada com uma lança e cercada de estrelas, pode ser vista nas moedas de um e dois francos. E Betty Bossi, que se ocupa do fogão e vem ajudando as pessoas a responder a uma das perguntas mais difíceis há anos: O que eu devo cozinhar hoje?

Cerca de 2.500 receitas são criadas a cada ano nas cozinhas de Betty Bossi em Basiléia e Zurique. O jornal é publicado dez vezes por ano e tem uma tiragem de 540 mil exemplares. Isto faz dele o maior jornal pago da Suíça. O site é visitado quase 3 milhões de vezes por mês, muito mais frequentemente desde o início da pandemia do vírus corona. As receitas também são distribuídas através de redes sociais, onde 520.000 pessoas recebem o boletim informativo diário.

A Betty Bossi tem sido uma instituição consagrada no país há quase 65 anos. Portanto, é hora de perguntar o que seu incansável trabalho alcançou. Teriam seus livros de cozinha realmente tido uma “influência duradoura” sobre os lares suíços, como afirma o Dicionário Histórico da Suíça? Ou ainda estaríamos até hoje cobrindo legumes em molhos brancos de farinha se Betty Bossi não tivesse entrado em nossas vidas?

“O que eu devo cozinhar hoje?” Primeiro Betty Bossi faz a pergunta de abertura, depois ela fornece milhares de receitas de cozinha e panificação.

Em 1956, apareceu a primeira publicação de Betty Bossi, um folheto de informações em dupla face que foi colocado nas lojas gratuitamente. “O que eu devo cozinhar hoje?” Esse foi o título do primeiro artigo. O texto dava a impressão de ter sido escrito pela própria Betty Bossi, era ilustrado com a foto de uma mulher atraente e, no final do artigo, apresentava sua assinatura.

Encorajamento de uma amiga

Naquele folheto promocional quase tudo que ainda hoje caracteriza Betty Bossi já estava presente. Ela se apresentava aos leitores como uma amiga que não só queria dar aos leitores as receitas bem mastigadas, mas também dar-lhes poder. Ela os encorajou a criar um plano de menu para que a comida fosse boa e variada, não houvesse sobras, e que ainda sobrasse algum dinheiro no final da semana.

E ela apresentava meia dúzia de receitas, incluindo esta para um suflê   de pão com maçãs: 300 gramas de sobras de pão, meio litro de leite, 3 ovos, 60 gramas de margarina “Astra-10”, 300 gramas de maçãs, 80 gramas de açúcar, 2 colheres de sultanas (uvas passa brancas), casca de limão ralada.

Figura de ficção a serviço da Unilever

A margarina “Astra-10” era o ponto central. Betty Bossi não queria apenas ser amiga das donas de casa, ela também queria que elas usassem as gorduras, óleos e margarinas produzidas pela empresa Astra, que operava sua fábrica em Steffisburg perto de Thun e pertencia ao grupo Unilever. Em outras palavras, Betty Bossi foi desde o início uma figura artificial projetada para interagir com o público, ou seja, ser uma influenciadora.

E o formato que a redatora de marketing Emmi Creola-Maag havia visto nos EUA, onde havia uma revista feminina chamada “Betty Crocker”, também funcionou brilhantemente na Suíça, e com o “Betty Bossi Post”, as coisas decolaram para Betty Bossi.

O historiador Benedikt Meyer diz que o milagre econômico após a II Guerra Mundial trouxe não só carros, televisores e novos penteados, mas também uma nova cozinha. E isto literalmente, ou seja, fornos elétricos, misturadores, agitadores e amassadeiras abriram novas possibilidades, e as lojas estavam sempre oferecendo novos produtos.

O sucesso foi imenso. O jornal, que mais tarde ficaria disponível por assinatura, ainda hoje é lido com circulação nas centenas de milhares de exemplares. Quando a sobremesa Tiramisu foi introduzida em 1984, o mascarpone foi esgotado em pouco tempo e em todos os cantos da Suíça.

Praticamente em todos os lares

Dos livros de culinária e panificação, o primeiro dos quais apareceu em 1973, 35 milhões foram vendidos. “Bolos, Cakes e Tortas” foi o de maior sucesso entre eles, com 1,35 milhões de cópias. Para ilustrar as dimensões deste sucesso, se você colocar todos os livros de cozinha vendidos lado a lado, você poderia caminhar sobre eles da Suíça até a América.

Hoje os livros da Betty Bossi são preparados por profissionais especializados como fotógrafos, designers, nutricionistas e jornalistas. zvg

Talvez ainda mais ilustrativo do sucesso seja uma olhada na própria casa. Será que um dos livros de cozinha da Betty Bossi, um jornal ou uma receita rasgada não cai sempre em suas mãos em algum lugar quando você está limpando uma gaveta? Ou rolos de massa, cortadores de biscoitos ou, na pior das hipóteses, um ferro de waffle da marca cai em seus pés quando você abre um armário?

Porque Betty Bossi também se destacou por isso pois ela desenvolve e vende os chamados eletrodomésticos ajudantes para a cozinha e para casa. Não há dúvida de que a “santa padroeira de todos os solteiros”, a “arma universal contra o tédio na cozinha”, a “guardiã do grill de última hora”, ou seja lá como for que ela já foi apelidada, está viva e saltitante.

120 funcionários, e receitas em milhões

A empresa Betty Bossi nunca perdeu um ritmo quando se trata de novas tendências como programas de TV, plataformas on-line ou alimentos sem glúten. Ela é de propriedade exclusiva da Coop, uma das duas gigantes do varejo suíço, desde 2012. A Betty Bossi AG emprega 120 pessoas em Basiléia e Zurique e gerou receitas líquidas de 81 milhões de francos em 2019.

Um passeio por qualquer supermercado Coop deixa claro que, com mais de 600 produtos, a marca é onipresente. Além dos itens na seção de panificação, há cada vez mais produtos prontos e semi-prontos, como saladas, sanduíches e menus inteiros.

Mas não parece uma contradição colossal quando Betty Bossi de repente serve produtos prontos para os suíços, a quem ela vem tentando ensinar a cozinhar há décadas? Provavelmente não existe uma alternativa, e é preciso concordar com Viviane Bühr, sua porta-voz de imprensa, que afirma que os tempos são completamente diferentes hoje do que eram 60 anos atrás.

As pessoas estão se movendo menos e não querem mais passar duas horas por dia na cozinha. Ela fala de tendências alimentares e comportamentais globais que influenciam as cozinhas suíças e que, por acaso, também levaram ao desaparecimento dos nutritivos molhos brancos de farinha.

Os Bettys e Bossis, como Viviane Bühr chama os funcionários da empresa, observam estas tendências e reagem a elas criando novas receitas e desenvolvendo produtos alimentícios. Como em todas as empresas, trata-se de mudar com os tempos, diz ela, “para que ainda estejamos por aqui no futuro”. Até agora, isso tem funcionado bem. “Tendo em vista nosso tamanho, estamos indo muito bem”, diz ela.

Ninguém pode culpar Betty Bossi por se adaptar aos novos tempos. Como personagem fictícia, ela tem uma clara vantagem a este respeito graças à sua imortalidade. A única questão é como ela irá lidar com isso e o que fará no futuro.

Como ela reagirá à concorrência que está crescendo cada vez mais ao seu redor? Quando ela mesma entrou no negócio dos influenciadores décadas atrás, não havia blogs de alimentos e a gama de livros de culinária ainda era limitada. Será que ela terá mais uma vez sucesso com receitas como o bolo suculento de limão ou o Partyfilet?

Artigo publicado pela primeira vez na revista Schweizer RevueLink externo e corrigido em 04/03/2021

Adaptação: DvSperling

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