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Entendendo o preço da carne na Suíça

Vacas de diferentes raças pastando.
Vacas de diferentes raças são exibidas no Museu Rural de Ballenberg, em 28 de agosto de 2009. Keystone/Sigi Tischler

Por que a carne suíça está entre as mais caras do mundo? Pecuaristas, consumidores e especialistas da indústria respondem a essa pergunta.

Nem todo mundo pode pagar quase 50 dólares por um quilo de coxão mole, ou quase vinte pelo mesmo peso de uma costeleta de porco. Estes são, no entanto, os preços daqueles cortes nos supermercados suíços. De acordo com o índice de preços de carnesLink externo publicado pela firma de catering Caterwings, a Suíça tem os preços de carne mais caros do mundo: 141% acima da média global.

Caterwings estima que um trabalhador médio na Suíça trabalhe apenas 3,1 horas para poder pagar por 1 quilo de carne bovina, enquanto na Índia, um trabalhador deve trabalhar 22,8 horas. Os custos de vida extremamente elevados na Suíça explicam em parte os elevados preços, mas a Suíça ainda fica atrás de muitos países europeus ocidentais nos critérios de custos para o consumidor usados para calcular o índice.

Vários fatores influenciam o preço da carne

Para Franz Hagenbüch, presidente da associação de pecuaristas suíços Swiss Beef, o principal fator são os elevados custos de produção na Suíça, que incluem salários, energia, fertilizantes, faturas de veterinários, custos de construção, seguro e ração alimentar.

Kevin Moat, que administra uma pequena fazenda de gado orgânico próximo ao lago Thun, concorda que os custos no país são particularmente altos.

Consumo de carne

De acordo com a Pro Viande, cada residente na suíça consumiu em média 51 quilos de carne em 2016Link externo. Setenta por cento dos suíços com idades entre 15 e 70 anos comeram carne pelo menos 3 a 4 vezes por semana. O consumo anual per capta de carne suína foi de 22,5 kg, de galinha 12 kg e de carne bovina 11 kg.

O consumo chegou a seu ponto mais alto em 1987, o ano que os suíços comeram em média 71 kg de carne por pessoa. O consumo declinou nos anos 1990 e estagnou na última década.

A associação Pro Viande afirma que o preço médio de compra no varejo para todos os tipos de carnes incluindo salsichas, frios e carne enlatada, foi de CHF 20,56 por quilo.

“Do ponto de vista financeiro, pode ser difícil”, diz ele. “O custo do seguro é grande para uma pequena fazenda como esta; há o seguro de saúde e os custos dos veículos. Além do mais, eu também tenho que ser segurado, pois se alguma coisa acontecer comigo, vamos ter um problema”.

Todos esses pequenos custos extras na fazenda acabam se somando. Estudos indicam que na Suíça implementos agrícolas podem custar 25%, e pesticidas entre 70 e 75% a mais na Suíça do que na França e na Alemanha.

Mas as explicações para os preços altos também são estruturais e culturais.

A política agrícola suíça é baseada no respeito à ecologia e em métodos de produção sustentáveis que garante o abastecimento nacional de alimentos, e isso também desempenha um papel na formação de preços. A maioria das fazendas alcançam padrões mínimos conhecidos como “serviços ecológicos requeridos” que visam encorajar a biodiversidade, o bom-trato dos animais, a rotação do solo e o uso de fertilizantes naturais. Em compensação, os fazendeiros recebem subsídios anuais num total de CHF 2,8 bilhões de francos.

Com um tamanho médio de 18 hectares e aproximadamente 20 vacas, as fazendas suíças são tipicamente pequenas e apresentam estruturas tradicionais restringidas pela topografia alpina. Por volta de 10% das fazendas tem produção orgânica. Satisfazer todos os requisitos para a comercialização de produtos com a denominação “orgânico” no rótulo significa encargos adicionais para os fazendeiros certificados.

Gado ao ar livre

Garantir os bons cuidados do rebanho é essencial. A organização da indústria pecuária Pro Viande afirma que “a Suíça tem uma das leis de proteção aos animais mais rigorosas do mundo”. Ela cita um estudo de 2010 publicado pela Associação Suíça de Proteção aos Animais comparando 12 países da União Europeia. Nesse estudo, a Suíça tem clara liderança sobre seus vizinhos no campo do tratamento digno dos animais de criação.

Além de padrões mínimos de bons tratos, fazendeiros também recebem incentivos financeiros para a participação em programas federais. Em 2015, mais de três quartos dos animais em fazendas suíças participaram do programa “Tempo ao Ar Livre para Animais de CriaçãoLink externo” (RAUS), e mais da metade participou do programa “Sistemas de Estábulo Particularmente Benéficos para Animais de Criação” (BTS). A Pro Viande diz que cerca de 91% das galinhas suíças satisfazem os critérios do programa BTS que incluem: dormitórios elevados em galinheiros e acesso protegido à áreas ao ar livre durante todo o dia. Pro Viande afirma também que 81,2% do gado teve regularmente tempo ao ar livre em 2015.

As rações animais e a forma de transporte também são inspecionadas. O gado come principalmente capim e feno, sendo que a ração para porcos é feira com subprodutos da alimentação humana. Os animais na Suíça não podem ser transportados em estradas por mais de 6 horas, enquanto a União Europeia permite o transporte por até 24 horas.

Esses padrões rigorosos de bem-estar animal têm uma influência direta sobre a saúde dos animais e sobre a qualidade da carne suíça, dizem os especialistas, mas eles também têm seu preço.

“Nós somos mais caros do que nossos países vizinhos devido a nossos salários, mas a qualidade da carne é diferente, e isso tem a ver com a forma de tratamento dos animais”, explica Elias Welti, chefe de comunicação na União Profissional Suíça da Carne, a organização que representa os empregadores de todo o setor de carnes.

Welti diz que as numerosas regulamentações suíças resultam em mais custos com empregados e infraestrutura. Como um exemplo, ele cita diretrizes estabelecendo o espaço que cada animal deve ter para se movimentar, deitar e se alimentar. Ele argumenta que a lei suíça é muito mais generosa com os animais do que em outros países, e que isso também afeta o preço.

“Regras devem ser respeitadas e monitoradas, em contraste com outros países onde as regulamentações só existem no papel”, aduz Hagenbüch.

Culpe o sistema

Barbara Pfenniger é especialista em alimentos na Federação de Consumidores da Suíça Francófona (FRC). Ela concorda com Hagenbüch, mas ressalva que os padrões obrigatórios nas fazendas suíças não diferem muito daqueles aplicados em países vizinhos.

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“Aqui nós temos um sistema de subsídios diretos que encorajam os produtores a irem além dos requerimentos legais mínimos”. Na prática, um fazendeiro é pago mais se ele permite que seu gado permaneça durante um tempo ao ar livre. Pfenniger diz que isso deveria ser visto como um investimento na saúde dos animais de criação, mas que isso também pode resultar em preços maiores, uma vez que os produtores podem cobrar mais pela carne daqueles animais.

Pfenniger diz que os regulamentos e incentivos, bem como a forma como os fazendeiros os interpretam e aplicam não são as únicas razões pelas quais a carne suíça é 149% mais cara do que a média mundial.

Se os maiores supermercados suíços Coop e Migros têm o hábito de culpar os altos padrões de bem-estar animal pelos altos preços, a protetora dos direitos do consumidor contra-argumenta indicando que varejistas frequentemente determinam unilateralmente as margens de lucro como percentual do preço ao consumidor, independentemente do real valor agregado.

Ali Ferjani, um cientista do centro nacional de pesquisa agrícola, Agroscope, diz que outra razão pela qual a carne suíça é mais cara até do que a carne norueguesa é “o regime aduaneiro de proteção”. A Noruega tem um padrão de vida similar ao da Suíça e ficou em segundo lugar na lista elaborada pela Caterwings.

Pouco mais de quatro quintos da carne consumida na Suíça é produzida localmente. O restante é importado e sujeito às altas tarifas suíças, afirma um relatório publicado em maio passado pela Organização Mundial do Comércio (OMC). As tarifas sobre produtos agrícolas foram de 30,8% em média no ano passado, sendo que para alguns vegetais, carne e laticínios, a tarifa chegou a mais de 100%.

Dispostos a pagar mais

No tocante a preços altos, Pfenniger diz que os preços se ajustam à níveis que os consumidores em tese estão dispostos a pagar. De acordo com uma pesquisa de 2016, os suíços estão dispostos a pagar até 27% a mais pela carne bovina, de galinha e de suínos produzida no país em comparação com a carne importada.

Pode ser que isso se deva à confiança que os suíços têm no produto nacional. Em uma pesquisa de opinião encomendada pela associação Pro Viande em 2012, nove entre dez pessoas disseram confiar em carnes de origem suíça. Ao todo, 64% das pessoas acharam que a carne e o presunto suíços têm melhor qualidade do que a carne importada.

“Os consumidores esperam alta qualidade de produtos suíços”, ela acrescenta afirmando que 80% da carne bovina vendida na Suíça foi produzida localmente com padrões mais elevados. Isso, diz ela, é o que fazendeiros querem e os consumidores demandam.

Produção de carne

A produção de carne na suíça subiu em 0,7% em 2016 (348.057 toneladas) em comparação com o ano anterior de acordo com a Pro Viande. As exportações subiram 10% para 8.375 toneladas e as importações caíram em 1,8% para 92 mil toneladas. Acima de 80% da carne é produzida no país.

Em 2016, a produção de carne bovina aumentou em 2,8% para 78.351 toneladas, enquanto a produção de carne suína caiu em 1,1% para 182.540 toneladas. A Suíça produziu 58.100 toneladas de carne de aves, o que representa um aumento de 4,5% em comparação a 2015. De 2000 até 2016, a produção total de carne aumentou em 17,2%.

Em 2016 havia 52 mil fazendas com 153 mil empregados na Suíça. A indústria da carne emprega um contingente adicional de 22 mil pessoas (dados de 2014).

Adaptação: Danilo v.Sperling

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