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Cantões suíços recrutam colonos

Compromisso assinado pelo colono Henri-Joseph Boéchat de 1.4.1819 Berna, Arquivos do Estado

Em 23 de outubro de 1818. o Governo de Friburgo orgulha-se dos resultados das negociações no Rio de Janeiro, felicita Sébastien-Nicolas Gachet, ratifica o tratado de colonização e decide participar da emigração suíça para o Brasil.

Em seguida, combina com Jean-Baptiste-Jérôme de Brémond, novo cônsul de Portugal e do Brasil na Suíça, para que a participação friburguense seja de 700 pessoas.

Contente em combater o excesso de população no cantão, o Governo enaltece o Brasil como terra prometida. Divulga em francês e alemão, o tratado de colonização, uma descrição de Morro-queimado e as possibilidades agrícolas da região.

O território destinado à futura colonização helvética evoca a Suíça, a ponto de poder superar as dificuldades iniciais. Na nova terra, os suíços viverão em vales de extraordinária fertilidade e constante primavera. Alguns exemplos fascinam tanto quanto impressionam os friburguenses: terras férteis e duas colheitas de batatas por ano.

São frases que comovem e convencem. No Brasil não existem calamidades terríveis como a miséria e a fome. Em casa, nos albergues e nas portas das igrejas discutem-se as vantagens e desvantagens da terra prometida. O oceano amedronta e por falta de maiores informações, temem-se os ataques de „índios selvagens”. Entre os temores, haveria, ainda, o perigo de escravidão. Os friburguenses analisam o acordo assinado pelo compatriota Gachet. Artigos sobre a posse de grandes extensões de terra, com isenção de impostos e promessa de subsídios, dissipam o medo e levam os suíços à adesão. Promessas de Dom João VI transformam o Brasil longínquo em terra da felicidade.

Nos meses de janeiro e fevereiro de 1818, pais de família e pessoas solteiras enfrentam até a neve para se inscreverem nas prefeituras, como candidatos ao Brasil.

A demanda supera amplamente a oferta. O Governo solicita aumento da participação friburguense, decide financiar a viagem de pessoas menos abastadas e não hesita em se livrar dos “Heimatlosen”, os estrangeiros.

O cônsul Brémond oferece também a oportunidade do Brasil aos cantões de Berna, Valais, Argóvia, Solothurn, Lucerna e Schwyz. Em todas as partes, a propaganda produz os mesmos efeitos. A afluência de candidatos é extraordinária. Brémond e Gachet não encontram dificuldades para atingir o número de candidatos que haviam fixado, secretamente, ou seja, duas mil pessoas. E como os cantões participam financeiramente da operação, sentem-se no direito de eliminar os indesejáveis.

Política praticada de maneira espetacular no cantão de Argóvia. O governo local divulga uma lista de estrangeiros. Em conseqüência, a polícia inicia uma perseguição, prende e interroga os indesejáveis, na fortaleza de Aarburg. Ali, de dezembro a julho, mais de 84 pessoas foram alimentadas, abrigadas e vestidas à custa do Estado, antes de serem “expulsas” para o Brasil.

Em busca do Eldorado

A cidade de Nova Friburgo tem sorte. Sua fundação não deriva de um mito como Roma, de um desejo de uma deusa como Atenas ou de milagre de Santa
(Genoveva), como Paris.

Ela vem da vontade de um homem. Dom João VI deseja construir uma cidade de homens livres e não de escravos. E cabe à Suíça realizar esse projeto inovador para a consciência humana e, principalmente, para a história do Brasil.

Mas quem são esses candidatos encarregados dessa maravilhosa missão? Trata-se de criminosos ou de gente honesta? Uma maldosa lenda, porém, denigre a criação de Nova Friburgo: a cidade teria sido fundada por vagabundos, criminosos e prostitutas. Não procede o fato de que os suíços teriam se aproveitado da ocasião para expulsar estrangeiros (16%). Na realidade, o estrangeiro é um ser humano como outro qualquer, com capacidade para empreendimentos.

As autoridades suíças, é verdade, exilaram criminosos. Mas os exemplos são raros. Contam-se nos dedos da mão e entre eles nenhum assassino, mas, por exemplo, um homem de bem que, durante a fome, havia roubado um pão para alimentar a família. As autoridades suíças enviaram ao Brasil jovens órfãos e filhos “ilegítimos”. Trata-se, porém de casos raros.

A maioria dos fundadores de Nova Friburgo é formada por homens e mulheres geralmente pobres, honestos e corajosos. Deixaram a Suíça para que seus filhos saíssem da miséria e não passassem fome. Muitos vêm ao Brasil em busca de um destino melhor. Sonham com fortuna, aventura e pátria definitiva. Esposas seguem os maridos espontaneamente e apenas algumas, de má vontade. Outras fogem de um inferno conjugal e acompanham um namorado ou querem recuperar uma dignidade espezinhada pela covardia dos machos.

Ao fundarem Nova Friburgo, esses homens e mulheres trouxeram sua cultura, seus conhecimentos, sua linguagem, sua vontade de empreendedores e, principalmente ofereceram ao Novo Mundo um presente generoso: a juventude de seus filhos.

Esse quadro merece explicações

A maioria dos fundadores de Nova Friburgo é de origem suíço-francesa, mas 418 pessoas procedem da Suíça alemã. Conferindo os vilarejos dos emigrantes, verifica-se que 90% dos futuros habitantes de Nova Friburgo são de origem católica. Os protestantes constituem pequena minoria. E uma detalhada estatística revela que camponeses e artesãos alfabetizados, capazes de assinar o nome, formam a primeira população de Nova Friburgo.

A pesquisa revela também que a política de descarte não deu os resultados previstos pelos governos: os “Heimatlosen” representam apenas 16% do total, porém, 86% são famílias com crianças, o que se constitui numa notável característica dessa emigração.


Os emigrados dos Cantões Suíços:

Friburgo: 830
Berna: 500
Valais: 160
Vaud: 90
Neuchâtel: 5
Genebra: 3
Argóvia: 143
Solothurn: 118
Lucerna: 140
Schwyz: 17
total – 2006

A febre da viagem sem regresso

Para evitar as catástrofes migratórias dos anos anteriores, a Suíça deseja proporcionar a essa nova emigração uma perspectiva de grande esperança de êxito. Ela mesma organiza o transporte dos novos emigrantes até a Holanda. Discute preços do trajeto e exige bancos, toldos de proteção e conforto para os seus passageiros. Os cantões nomeiam comissários, encarregados da contabilidade, do policiamento e do bom andamento das operações. Escolhe Sébastien-Nicolas Gachet como primeiro cônsul da Suíça no Rio de Janeiro, para defender os interesses dos colonos na nova pátria.

Friburgo fornece quadros para a futura colônia. O cura se chama Jacques Joye, pároco de Villaz-St-Pierre. Jean Aeby, o vigário, será ordenado padre, antes da viagem, na capela particular do bispo. Friburgo fornece também dois médicos: Pierre-Louis de Porcelet, de Estavayer-le-Lac e Jacques Moosbrugger, de Friburgo, que termina os estudos em Estrasburgo e se une ao grupo em Kehl (Alemanha).

Aconselhado pelo cônsul Gachet, Padre Girard, um dos maiores pedagogos suíços da época, introduz no Novo Mundo, seu método ensino mútuo. Os dois professores, que desejam fazer a experiência são Bonaventure Bardy, de Estavayer-le-Lac, e Simon Mettraux, de Friburgo. Mas Gachet procura quadros de profissionais, também em outros países da Europa. E encontra na França o veterinário Hyppolite Thomas e um médico, Jean Bazet. O primeiro farmacêutico de Nova Friburgo, Leopold Bõhle, vem da Alemanha.

Um clima febril envolve cidades e vilarejos. “Os brasileiros” preparam a viagem sem regresso. Vendem o gado, a casa e as terras. Apenas alguns alugam as propriedades. Procuram atestados de batismo. Fazem as malas. Seguem os conselhos de seus respectivos governos e levam utensílios e ferramentas para desmatar (sapatos resistentes, machados, picaretas e pás). Levam também fuzis para, no início, se alimentarem da caça. E escrevem as suas iniciais e números nas malas com a tinta da esperança. Mas sofrem algumas humilhações. Para satisfazer os direitos dos credores, a lista dos imigrantes é colada nos muros ou publicada no jornal…

As bagagens dos burgueses conquistadores

Os arquivos do Estado de Friburgo conservam inventário das bagagens levadas pelos friburguenses. Os emigrantes dos cantões levam muita roupa e abundantes acessórios de cama. Levam também utensílios para o exercício da profissão: tamanqueiro, carpinteiro ou tecelão. E não esquecem provas de sua fé: caldeirinhas, candelabros, crucifixos e livros de orações

Merece destaque a bagagem de um pequeno grupo (22%), com abundância de roupas e variedade de tecidos como lã e seda. Outros objetos revelam também preocupação com o conforto: pêndulos, relógios, escrivaninhas e máquinas de café. Os livros demonstram nível de cultura e a vontade de prosperar: há obras sobre agricultura e comércio. Nas malas encontra-se o símbolo dos burgueses conquistadores: garrafas e sacos cheios de sementes.

23 de outubro de 1818: o Governo de Friburgo ratifica a convenção e lança campanha de recrutamento.

10 de novembro de 1818: o Cônsul Brémond convida os cantões de Berna, Valais, Argõvia, Lucerna, Solothurn e Schwyz a participarem da colonização.

Abril de 1819: Jean-Baptiste Brémond. de comum acordo com os Governos de Friburgo e de Berna. organiza a navegação fluvial da Suíça para o porto da Holanda.

3 de maio de 1819: Gachet é nomeado cônsul suíço no Brasil.

14 de junho de 1819 : Friburgo distribui as últimas instruções aos colonos.

Junho de 1819 : a Suíça se nega a discutir tratado de capitulação militar.

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