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Educação suíça integra alta tecnologia

foto antiga de uma sala de aula
As salas de aula podem ter mudado nas últimas décadas, mas os especialistas acreditam que ainda existe um grande potencial para a tecnologia educacional RDB

Usar a tecnologia para melhorar a educação não é tão simples como entregar a cada criança um tablet. Uma nova incubadora de startups pretende resolver esses problemas - e pôr o pé da Suíça na porta do chamado mercado edtech.

Dirigindo-se à plateia no lançamento do “EdTech Collider”, da Escola Politécnica Federal de Lausanne (EPFL), Lavinia Jacobs, da Fundação Jacobs para o Desenvolvimento Infantil e Juvenil, não invocou imediatamente a ciência, nem o financiamento de sua organização no novo centro. Em vez disso, pediu ao público que se lembrasse do já clássico filme de ficção científica de 1985 “De Volta Para o Futuro”, e de seu protagonista, o adolescente Marty McFly, que é enviado ao ano de 1955 em uma máquina do tempo.

“Infelizmente, o enredo não enviou Marty para uma sala de aula da escola, mas, se tivesse, ele não teria encontrado nada de diferente em comparação com 30 anos depois – ou agora, no caso, 60 anos”, conta Jacobs.

“Hoje, a educação é provavelmente a área mais resistente à inovação das políticas públicas.”

Superando a inércia

Com apenas 2% dos 5 trilhões de dólares que representam o mercado mundial da educação digitalizada, a tecnologia educacional – também conhecida pelo acrônimo inglês “edtech” – parece representar um grande potencial inexplorado para educadores e investidores, especialmente na Suíça.

“Eu acho que levará cerca de 100 anos ou mais para fazer as reformas fundamentais na educação. Um dos motivos para isso é que a educação é mais difícil, por exemplo, do que a balística, pois você tem dezenas de variáveis – e humanos”, explica Daniel Schneider, professor de tecnologia educacional da Universidade de Genebra.

Pierre Dillenbourg, presidente do EdTech Collider, diz que a maioria dos educadores reproduz o que eles mesmos foram ensinados a fazer, e as novas tecnologias podem ser um pouco complicadas de se integrar a uma sala de aula.

“Se você é um professor com 25 crianças e cada uma recebe um iPad, sua vida se torna muito difícil, porque você tem 25 crianças com algo que é mais interessante que você. É um grande esforço reorganizar uma sala de aula. Eu acho que temos que desenhar melhores ferramentas”, diz.

Apesar dessa inércia, a tecnologia educacional parece estar ganhando impulso. Movimentando cerca de 135 bilhões de dólares em 2016, de acordo com a empresa francesa de capital de risco Serena Capital, espera-se que o mercado mundial edtech cresça 17% ao ano e alcance 252 bilhões de dólares até 2020.

No ano passado, a revista americana TechCrunch denominou o setor como “a próxima fintech (acrônimo inglês para finança e tecnologia) que está prestes a se tornar o maior, e possivelmente mais lucrativo, setor digitalizado do momento”.

Universidade de pesquisa que já abriga um dos programas MOOC mais bem sucedidos da Europa, a EPFL parece ser um ajuste natural para o berço da edtech suíça.

Inaugurado oficialmente em 27 de abril, o EdTech Collider, de 300 metros quadrados, está localizado no Parque de Inovação da EPFL e oferece espaço de colaboração para mais de 30 startups dedicadas ao desenvolvimento de ferramentas digitais relacionadas à educação elementar, secundária, superior e contínua.

“A educação não pode ignorar que o mundo sofreu uma grande reviravolta com a revolução digital”, disse o presidente da EPFL, Martin Vetterli, em seu discurso de inauguração. “Se nossos filhos não estiverem familiarizados com a tecnologia digital, não tenho certeza que possamos abraçar a quarta revolução industrial.”

Um mercado “difícil”

As startups no Collider estão desenvolvendo uma ampla gama de tecnologias: aplicativos para ajudar os alunos a encontrar orientadores, módulos de educação que integram a robótica e a realidade virtual, recursos para o ensino da programação e do pensamento computacional.

Enquanto alguns dos produtos em desenvolvimento são para universidades, ou para empresas usarem em treinamento corporativo, outros são destinados ao uso direto por professores, alunos e até mesmo pais. Ainda outros estão focados em aprender sobre a aprendizagem, fornecendo serviços analíticos projetados para interpretar os dados e adaptar os esforços de educação.

O objetivo do espaço é que esses diferentes grupos “colidam”, literalmente que choquem ideias e colaborem, aumentando ao mesmo tempo seus perfis.

“Queremos dar a essas pequenas entidades mais visibilidade, tanto no que diz respeito aos potenciais clientes quanto aos investidores”, disse Dillenbourg na inauguração.

Em outro discurso, Philippe Hayat, da Serena Capital, disse que esse modelo de incubadora é importante para as empresas em fase de criação no setor edtech que precisam de apoio extra para sair do chão.

“Edtech é um mercado muito difícil”, disse Hayat. “Ele usa o aprendizado da máquina e AI [inteligência artificial], realidade virtual e aumentada, ‘gamificação’. E quando a tecnologia é complicada, precisamos ajudar as empresas a crescer o mais rápido possível.”

Glossário

Incubadora: espaço de trabalho compartilhado por vários grupos de pessoas que desejam transformar uma ideia em uma startup. As incubadoras fornecem um lugar para que esses grupos desenvolvam suas ideias, identifiquem um mercado alvo e criem modelos de negócios bem-sucedidos até estarem prontos para formar suas próprias empresas.

Acelerador: um programa estruturado, de prazo limitado, projetado para “acelerar” um negócio existente e ajudá-lo a expandir-se para uma escala maior, muitas vezes por meio de orientação especializada e treinamento e/ou investimento.

Existem também poucos modelos de negócio bem sucedidos em edtech, acrescentou, e os custos de marketing para conquistar clientes são altos porque muitos não estão acostumados a pagar por ferramentas de “e-learning”.

Tais desafios contribuíram para o início tardio da edtech. Atualmente, existem cerca de 2000 empresas no setor, a maioria das quais estão nos Estados Unidos. A presença europeia é pequena e fragmentada, mas cresce – com cerca de 227 milhões de euros investidos em 2016, principalmente na França e na Alemanha.

Ping pong

Schneider observa que, além dos obstáculos ao mercado, pode ser difícil para as startups equilibrar novas ideias com as prioridades dos professores e estudantes.

“As tecnologias educacionais às vezes são impulsionadas pelos interesses das pessoas que estão por trás das startups, que não estão necessariamente interessadas em responder a uma demanda ou preencher uma necessidade importante – elas têm sua própria agenda que leva à inovação bem-sucedida ou ao fracasso”, diz Schneider.

Para ele, a edtech deve ser desenvolvida de forma contextual que seja sensível às necessidades locais, razão pela qual o desenvolvimento do mercado edtech na Suíça é tão importante.

“Atualmente, essa indústria não existe na Suíça, por isso você não tem pessoas bem qualificadas que ofereçam serviços ou organizações que terceirizem empresas americanas. Portanto, seria uma boa coisa ter essa indústria aqui.”

Dillenbourg diz que o EdTech Collider é uma incubadora, e não um laboratório, de modo que a pesquisa sobre as necessidades do educador, bem como outras questões como a privacidade dos dados, dependerá dos grupos Collider individuais. Mas ele diz que apoia o que ele chama de troca “ping pong” de ideias entre educadores e desenvolvedores.

“Se uma startup funciona com sua própria tecnologia e nunca chega até uma escola, eles vão falhar”, diz.

Suíça digital

Em abril de 2016, o governo suíço lançou a “Estratégia para uma Suíça Digital” destinada a uma melhor integração das tecnologias digitais na sociedade e na economia. A lista de itens de ação inclui a aplicação de ferramentas e conhecimentos da tecnologia da informação e comunicação (TIC) para a educação pelo governo e os cantões (estados). De acordo com a estratégia: “A disponibilidade de conhecimento a qualquer momento e em qualquer lugar está levando a um ajuste dos processos de aprendizagem e mudanças nos papéis dos professores e alunos. Essas mudanças devem ser levadas em consideração ao nível do indivíduo, da aula, da escola (ou de outro local de aprendizagem) e da política de educação e pesquisa”.


Adaptação: Fernando Hirschy

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