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Cientistas suíços “escutam” montanhas nos Alpes

Um dos aparelhos para gravar os "murmúrios" das entranhas da rocha. cortesia

A segurança das zonas de risco no arco alpino, na Itália e na Suíça, passa pelas pesquisas de um grupo de cientistas do Politécnico de Milão, da Universidade Suíça Italiana e da Escola Profissional Universitária Suíça Italiana.

Na primavera e no verão deste ano eles instalaram no monte San Martino, em Lecco, norte da Itália, os aparelhos que gravam os “murmúrios” das entranhas da rocha, os “micro-estalos” da estrutura interna da pedra.


















Agora, durante o inverno, período no qual as fissuras aumentam de tamanho, os pesquisadores esperam estudar e decifrar os sinais da montanha que podem significar que esta ou aquela parede corre o risco de desabamento.

O resultado do trabalho é o monitoramento em tempo real e a criação de uma escala de riscos que acompanha, instante após instante, o surgimento das fissuras, a variação de tamanho das rachaduras já existentes e a avaliação da resistência à lei da gravidade daquele setor da montanha.

“A Suíça é um país de altas montanhas, com encostas inclinadas nas quais encontramos massas rochosas cortadas por vários sistemas de rachaduras que as dividem em blocos grandes, médios e pequenos. Durante a ação da chuva e da neve, os ciclos de gelo e desgelo, as rachaduras se abrem cada vez mais, os blocos de pedras que se tornam instáveis vão se destacar da parede e descerão”, explica o professor Silvio Seno, da Escola Profissional Universitária Suíça Italiana (Supsi, em italiano), à swissinfo.ch.

Os equipamentos foram presos em dois pontos do monte San Martino por alpinistas profissionais, os Ragni di Lecco. Dias e dias de escaladas acabaram por levar à montanha uma tecnologia de ponta. Eles colocaram nas fissuras e nas fendas do monte gravadores que captam os ruídos que chegam à superfície. Estes sons são enviados via cabo para um sistema autônomo no topo da montanha. Dali, os sinais são transmitidos para o laboratório do Politécnico de Lecco, na cidade à beira mar do lago de Como.

O professor Antonio Marullo, integrante da equipe, explica à swissinfo.ch: “É como se ouvíssemos uma orquestra pouco antes de tocar, quando, todos, displicentemente, testam os instrumentos, enquanto o público fala ao mesmo tempo. É um barulho de fundo que não distinguimos muito bem. Nós conseguimos gravar quando um músico, por exemplo, começa a testar seriamente, mais alto, graças aos sensores muito avançados”.

Integração

Normalmente, na Suíça, as áreas expostas aos riscos de queda de rochas são conhecidas porque as leis obrigam a um mapeamento de todos os pontos vulneráveis e os bancos de dados são atualizados constantemente. “Mas se trata de um monitoramento mais direcionado ao controle dos movimentos das grandes massas rochosas que não são dos blocos de pedra isolados”, alerta o professor Silvio Seno, da Supsi.

O novo sistema adquire a informação sobre a “fratura exposta” da montanha de forma automática. “O nosso modelo tenta entender se a rocha está rompendo-se. São micro-terremotos que enviam sinais de ondas acústicas que podemos medir. Estes sinais são capturados, memorizados e transferidos via wireless à distância para elaboração final. Temos então um sistema na parede que adquire as informações de modo tradicional sobre o alargamento de uma fratura ou a inclinação do plano, mas, com os sensores podemos explorar melhor o que está ocorrendo dentro da rocha e não apenas constatar as conseqüências externas”, analisa o professor Cesare Alippi, coordenador da pesquisa na Escola Politécnica de Milão.

O monitoramento atual usa instrumentos de controle já bastante avançados como a coleta de dados em locais estratégicos na terra e a análise de imagens dos satélites. Mas, em todas elas, as informações chegam dentro de intervalos maiores ou menores de tempo. O sistema criado pelos pesquisadores italianos e suíços avalia e detecta a situação em tempo real.

“O objetivo no futuro deve ser a integração sempre mais profunda entre os dados monitorados para o desenvolvimento de instrumentos que sejam econômicos e que possam ser distribuídos em todo o território a ser observado”, diz o professor Silvio Seno.

O projeto dos pesquisadores enfrenta diferentes desafios. No campo tecnológico foi preciso criar um sistema de envio de dados que pudesse suportar as duas mil informações geradas por segundo, 24 horas. Na área geológica o espaço para as descobertas é cada vez maior

 “Não queremos saber apenas se a rocha está caindo ou não, se estabilidade dela está comprometida. Queremos ir mais fundo, literalmente, e descobrir o ponto exato da ruptura dentro da rocha. Como fazem para descobrir o epicentro de um terremoto. Para isso, precisamos de dados que estão chegando, não apenas do alargamento das fendas, mas das micro-rupturas na estrutura cristalina da rocha”, explica o professor Alippi.

Montanha instável

A montanha não é estática como pode parecer à primeira vista. Nada mais equivocado do que afirmar que algo é sólido como uma rocha, se exposta ao tempo. A erosão e a lei da gravidade, fenômenos naturais, tendem a transformar, a corroer, e a esfarelar, ao longo de milhares de anos, os picos mais altos. Os desertos nada mais são de restos de montanhas. No último século, a densidade demográfica aos pés, nos vales, e nas encostas das montanhas aumentou e, com ela, os riscos de uma tragédia, de uma catástrofe também. 

A Suíça está localizada no coração da cadeia alpina. E isto não ajuda. A exposição aos perigos que derivam da presença concentrada de montanhas é muito alta.

“Para o país esta pesquisa é importante, pois apresenta os meios para uma proteção mais eficiente contra os eventos naturais. Desmoronamentos, avalanches, inundações ocorrem. Os volumes de danos provocados crescem continuamente. Isso ocorre não apenas pelo incremento dos eventos naturais, mas também devido ao maior processo de edificação no território por causa das maiores exigências de mobilidade e de comunicação. As infra-estruturas se tornam mais vulneráveis”, explica o professor Silvio Seno.

Em 2006, desmoronamentos de rochas atingiram a rodovia ao norte do San Gottardo e resultaram numa tragédia. Duas pessoas morreram. Além disso, a estrada foi fechada por muitos dias provocando a interrupção de uma importante artéria de comunicação para a Suíça e para a Europa. No começo de 2011, durante o mês de janeiro, a equipe do professor italiano Cesare Alippi vai instalar novos sistemas para monitorar os riscos de deslizamento de encostas.

O trabalho não pára, assim como as montanhas, que se mexem silenciosamente, sem fazer muito barulho. Pois, quando fazem, é tarde demais para correr rumo a um abrigo.

A equipe do Instituto Ciência da Terra da Escola Universitária Profissional Italiana da Universidade Suíça Italiana define os objetivos da pesquisa sob o ponto de vista geológico no território suíço.

Ela também desenvolve modelos matemáticos de previsão do movimento da fissura e da sua área de expansão que utilizem dados enviados pelo sistema de monitoramento.

As instituições que participam da pesquisa fazem parte do projeto MIARIA, ou seja, Monitoramento Hidrológico de Adaptação ao Sustento do Plano de Risco Integrado Alpino.

O projeto é financiado pelo Programa Operacional de Cooperação Transnacional Itália- Suíça (2007-2013).

Ele prevê a construção de sistemas e de tecnologias novas para aquisição dos dados no território e para comunicação entre si nas salas de operação.

As informações devem servir de base para a criação de cenários dinâmicos de riscos integrados em ambientes alpinos.

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